domingo, 14 de maio de 2017

ACRES

Segundo esse entendimento, o Acre, enquanto região banhada pelo rio Acre, é diferente do Acre proclamado como República por Luiz Galvez. O território nacional da Repúblicas, além do rio Acre, também abrangia o Purus e Iaco. O Acre, enquanto território estrangeiro, é diferente daquele visto como nacional. Da mesma forma, não há como montar uma genealogia entre o Acre Território e o Acre Estado, a não ser arbitrariamente. Ambos representam entes políticos e jurídicos diferentes.
O Acre do Estado Independente proclamado por Plácido de Castro em 1903 não pode ser o mesmo Acre que conhecemos hoje. Embora homônimos, evocam sentidos diferentes, pois são signos linguísticos singulares. O primeiro foi um país autônomo e o segundo é uma unidade federativa da República do Brasil. O Acre enquanto terras demarcáveis reivindicadas pelas lideranças aborígines não é o mesmo do discurso autonomista defendido por Guiomard Santos em fins dos anos 1950. O Acre amazonense que aparece nos discursos de Rui Barbosa não pode ser o mesmo Acre “ecologizado” dos porta-vozes da Frente Popular. No campo semântico, esses dois fenômenos linguísticos são diferentes.
O Acre Estado não estava potencialmente presente nos primeiros núcleos de colonização das terras que ficavam às margens do rio Acre em fins dos anos 1870. Caso contrário, a história seria uma mera sequência cronológica de fatos teleologicamente marcados. Portanto, não há um lastro de historicidade entre o Acre contemporâneo e o Acre colonizado por João Gabriel de Carvalho em meados de 1877/78. Estamos diante de dois Acre, embora homônimos.
O Acre que aparece no discurso do historiador boliviano José Aguirre Achá (1902) não foi o mesmo daquele dos discursos do senador Jonathan Pedroza (1848-1922), autor do Projeto de Lei que visava a incorporação do Acre Setentrional ao Estado do Amazonas. O Acre da expressão Departamento do Alto Acre, criado pelo governo federal em 1904, nada tem a ver com o da expressão Acre Setentrional[1], inventado com a chegada das tropas brasileiras lideradas pelo general Olímpio da Silveira em Puerto Alonso em 1903.


[1] No dia 3 de abril de 1903, o general Olímpio da Silveira assumiu o governo do Acre Setentrional, na mesma ocasião Plácido de Castro assumiu o governo do Acre Meridional. Um mês e dez dias depois, o general invadiu e o Acre Meridional, formando um único governo.
Antes da chegada do homem branco civilizado de nacionalidade brasileira, o território que hoje pertence ao estado do Acre já havia sido nomeado com os mais diversos topônimos. As Repúblicas do Peru e da Bolívia já o tinham como parte de seus respectivos territórios. Isso sem dizer das diversas nações aborígines que mantinham relações identitárias com a região há centenas de anos. Todas essas representações de pertencimento foram sacrificadas em favor da emergência do topônimo “Acre”, que já surge enodoado de “violência simbólica”.
Talvez os gestores do estado do Amazonas tenham sido os primeiros a inventarem aquele território como brasileiro, mas não como Acre, e sim como parte do município de Floriano Peixoto. 

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