quinta-feira, 26 de setembro de 2013
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sexta-feira, 20 de setembro de 2013
terça-feira, 17 de setembro de 2013
domingo, 15 de setembro de 2013
Relatório de Governo do Prefeito do Departamento do Alto Purus - Território do Acre (1911)
TERRITÓRIO DO
ACRE
DEPARTAMENTO DO ALTO PURUS
Sr.
Ministro da Justiça e Negócio Interiores
RELATÓRIO ADMINISTRAÇÃO
RELATÓRIO
Apresentado
Ao
Exmº
Dr. Rivadavia da Cunha Corrêa
Ministro
de Estado da Justiça e Negócios Interiores
Pelo
Dr.
Godofredo Maciel
Prefeito
do Departamento do Alto Purus
1911
.........................................................................................
Introdução
Conforme a disposição do art. 6 & 1º do
Regulamento baixado com o Decreto nº 6.901 de 26 de março de 1908, é o Prefeito
obrigada apresentar ao Ministro da
Justiça um relatório semestral da sua administração, ou seja dois anualmente.
Mas, não me tendo sido possível cumprir
à riscas, esse preceito regulamentar, porquanto, somente a 18 de Março do ao
passado assumi, de fato, o governo deste Departamento, também, só agora me é
dada o ensino de apresentar a Vexª o relatório atinente à minha administração
durante os meses de março a Dezembro, abrangendo assim os últimos meses do
primeiro e todo o segundo semestre de 1911.
Serei preciso e, sobretudo sincero na
exposição dos fatos que em seguida vão ser resenhados.
Revele-na V.Exª alguma passagem menos
discreta, em que, porventura e meio grado, seja mister a verdade desses fatos
transcrever plenamente, com todas as letras.
Alias, isto de modo nenhum, poderá
importar na mínima quebra da alta consideração e respeito devidos a Vexª.
Surpreendido e, ainda mais, honrado
pelo atual Governo, de que é Vexª. Digno auxiliar, com a escolha do meu obscuro
nome para o ponderoso encargo de Prefeito do Alto Purus, assentei de antemão,
no firme propósito de procurar sempre corresponder à distinta confiança dos
altos poderes da Republica.
Preponderava mais de que tudo nesta
resolução interna o espírito de cumprimento do dever, a um tempo, estimulo e
previdência aqueles que, ainda na mocidade, são chamados à árdua provança do
serviço publico, pela investidura do cargo das mais graves e melindrosas
responsabilidades.
Haja visto o de Prefeito do Departamento
do Alto Purus, quando a 3 de dezembro de 1910, foi lavrado o Decreto da minha
nomeação. A este tempo, senão antes,
(seja-me licito aqui reiterar as palavras do brilhante relatório de V.Exª., em abril
d ano passado, dirigido ao Sr. Presidente da Republica ), era de perfeita
desordem a situação no Território do Acre: nenhum dos Prefeitos nomeados pelo
Governo Federal estava no seu posto; o Tribunal de Apelação não funcionava, os
juizes que o compõem, estando dispersos, longe da sede do Tribunal; raro era o
juiz regular, de Direito, substituto ou preparados, que se achava em efetivo
exercício; o desmantelo administrativo e judiciário era completo. O vento da
anarquia, passando por sobre aquele rico Território desfez a entrosagem
política, administrativa e judiciária, depondo Prefeitos afugentando juizes. E
as notícias que ao conhecimento do
Governo chegavam, eram os mais desencontradas, as mais opostas, não sendo
possível fazer-se uma idéia , sequer aproximada, da situação daquele Território
nem de quais os verdadeiros, culpados
pelo desmantelo que lá reinava”.
Foi então, à vista deste lamentável
estado de crises, desta “perfeita desordem”, tão ao vivo descrita por V.Exª.,
que o Sr. Presidente da Republica, “diante da impossibilidade de pautar uma
ação eficaz e segura, pelas informações oficiais e oficiosas que do Acre
chegavam, prudente e sabiamente, resolveu a substituição de todos os Prefeitos
e Sub-prefeitos, nomeando, para esse cargo, novos funcionários, de imediata e
inteira confiança do Governo”- Só assim a administração central poderia entrar
no exato conhecimento do que se passou e
se passam no longínquo território, e,
sob informações que lhe merecem perfeita fé, adotar medidas as mais
consentâneas com as necessidades e as aspirações dos novos patrícios que
valentemente desenhavam e conquistam para a civilização brasileira aquela
uberrimas, mas inóspita, paragem”.
De fato quando, em cumprimento da ordem
telegráfica de V.Exª., parti do Ceará,
onde me surpreendera a nova da minha nomeação, em busca de Manaus, ali
encontrei entre outras pessoas menos
gradas, do Alto Purus, os Srs. Desembargadores Elysiário Fernandes da Silva
Tavora e Domingos Almeida de carvalho, este procurador geral do Território do
Acre e aquele Presidente do Tribunal de Apelação, com sede em Sena Madureira.
Um
e outro queixaram-se amargamente da situação em que se viam,
impossibilitados de voltarem ao
Departamento passou o livre exercício de
suas respectivas atribuições.
Corriam então os mais alarmante versões
a respeito do quer se estava passando no Alto Purus; e até se me assegurou que
o Capitão Samuel Barreira, já exonerado do lugar de 1º Sub-prefeito,
entrincheirado em Sena Madureira, mantinha-se na resolução de, à força, impedir
a minha posse do cargo de Prefeito.
Ao que se dizia, o Departamento estava
irremessívelmente conflagrado. E sobre tais fundamentos foi que o Presidente do
Tribunal de Apelação do Acre, secundado pelo seu colega Sr. Desembargador
Domingos Américo, comigo instou repetidas vezes no sentido de solicitar a
V.Exª., um vaso de guerra que me assegurasse o livre acesso pro Governo.
A isto sempre me recusei, fazendo ver
aqueles dois magistrados que o governo não me enviava ao Alto Purus em missão
de guerra, senão de paz e concórdia.
A vista dos continuados e repetidos
boatos descrevendo tenebrosa e ameaçadora a situação ali reinante, sempre por
parte dos Desembargadores Távora e Américo, que, cada vez mais, insistiam em me
apregoar vitimas, como outros seus colegas magistrados de Departamento, da mais
descabida animosidade por parte do Capitão Samuel Barreira, a quem atribuíam
toda a sorte da desmanda violência e até
atos de improbidade administrativa, tomei de mim para mim mesmo, o alvitre de
precisar também ouvi as partes contrárias e queixos dos referidos
Desembargadores e seus colegas de magistério, representados aquelas por
diversos proprietários de seringais nos rios Yaco e Purus, havia pouco, de lá
chegados.
Só assim, frisando bem as razões de um e
outro lado, ser-me-ia possível antes de entrar no Governo do Departamento forma
um juízo mais ou menos seguro acerca dos homens e coisas.
Logo também deliberei, como medida
preventiva, seguir para Sena Madureira em companhia apenas de meus auxiliares
de administração.
Já não
foi isso de agrado dos que se achavam em Manaus, à minha espera, no
propósito de só regressarem ao Alto Purus com o novo Prefeito, que à puridade
diziam arrojado pelo Sr. Dr.Belisario Távora, Chefe de Policia da Capital
Federal, para se ir pôr ao lado de seu digno irmão, o Sr. Desembargador
Elyziario...
O meu intuito em partir de Manaus
desacompanhado outro não fora senão me eximir durante a viagem as mesmas
insinuações que já estava farto de ouvir, insinuações em sua maior parte de
vinditas odiosas, sendo que a primeira deveria ser a demissão em massa de todo
o pessoal que na Prefeitura servira com o Capitão Samuel Barreira.
O certo é que dali parti em busca de Sena Madureira trazia
resolvido qual deveria ser o programa de governo a adotar, resolução que ainda
mais se firme quando, a 18 de março, aportei a esta cidade.
Só então e logo ao chegar, pude ver e
pessoalmente testemunhar o tamanho e enormidade das fantasia urdidas, com
engenho e arte, contra a mais ordeira população que ainda conheci, a qual se me
fizera imaginar entrincheirado no
barranco do rio Yaco, em atitude belicosa, pronta impedir o meu desembarque...
Tudo romance!
A população, encontre-a, realmente,
apinhada ao longo da margem do rio, mas, não de armas em punho: trazia para o
novo prefeito e seus auxiliares flores as braçadas, de onde logo fui enferindo
a sua generosidade de sentimentos.
Dentro em pouco, porem, surpreendido,
contristado, através do animo ordeiro dessa população, mas menos
laboriosa, o amargor de um fundo
sentimento, mal disfarçado embora, contra os seus magistrados judiciais,
salvante raras exceções tanto mais honrosas quanto eram assinaladas com justa
veneração.
E
perscrutando melhor o cenário e, com mais segurança, deduzindo as razões
dos fatos ali anteriormente desenrolados, conhecendo, enfim mais de perto os protagonistas em jogo, foi
se me revelando em toda a sua nudez a triste verdade.
De um lado estava a população unânime,
trabalhadora, temente à lei, ciosa da justiça e carecedora da assistência de um
administrador esforçado e honesto, deveras interessado pelo futuro da região e,
de fato em beneficio de seu progresso, aplicando as verbas que lhe são
destinadas pelo Governo.
Do lado oposto, dois advogados, ávidos de
mando e de precunia, aos quais, lastimavelmente, dera mão forte a maioria dos
juizes, constituindo esse concluo nada mais nada menos de que uma verdadeira
ditadura político-judiciária, ferrenha, absorvente, intolerante e, não mais
raro, desonesta...
Era o que bem se pode chamar o regime da
política togada, sem nenhum percalço e com todos os pros inerentes as condições
de vitaliciedade e inamobilidade dos seus fundadores.
E ai do Prefeito, simples funcionário
demissível ad natum, que não preste desde logo cega obediência aos caprichos
desse regime sui generis, filho do sacrílego abuso das garantias
judiciárias!...
Assim, o principal problema que me
cumpria resolver, pesar de embarcações, dependia menos de arqueia do que do
melhor a empregar; e este só seria
eficaz se não fosse arbitrário e, sim oportuno, isto é calcado nas próprias e
especiais condições da situação que uma serie de fatos anteriores havia
suscitado no Departamento.
Urgia preliminarmente adotar a uma
política de paz e congraçamento, cujo bom êxito, alias, não dependia em
exclusivo da atitude neutra e da ação conciliadora do novo Prefeito, senão
também, e principalmente, da boa vontade de certos juizes afugentados, para
usar de uma expressão de v.Exª., no já citado relatório.
Promover essa facilidade, de
congraçamente e de reconciliação com o esquecimento de qualquer animosidade
passadas ter-me-ia sido relativamente fácil, si nessa tarefa me quisesse
coadjuvar aqueles juizes, como se mostrarem por sua parte, em regressando ao
Departamento, resolvidos a um novo regime de procedes mais compatível e digno
da elevação do seus mistérios.
Longe disso, à media que se iam de novo
investindo dos cargos, ao em vez de se revelarem convenientes, tolerantes e
desapaixonado, pelo contrario, sentindo-se garantidos no seus lugares,
denunciaram, para logo, as suas odiosas instruções de vinganças
manifestamente pessoais, por mais e modos
que sempre lhes sobraram.
Estavam assim, reconstituída, com as
mesmas figuras, nos mesmos moldes de ferro, de absorção, de intolerância e de
improbidade, a velha ditadura política – judiciária do Alto Purus.
E o novo Prefeito que escolhesse, de
duas uma: acomodar-se ou passar-se pelas forças caudinas...
Após dois meses de estadia em Manaus,
aguardando não só as ultimas instruções do Governo como também a vinda do comandante,
oficiais e raças destinados à Companhia
Regional de Alto Purus, parte para Sena Madureira no dia 28 de fevereiro
passado...
Já em Manaus e mediante autorização
telegráfica de V.Exª., assumira, a 9 de janeiro, o exercício do cargo de
Prefeito tendo assinado na Delegacia Fiscal do Tesouro Federal, naquela cidade,
o respectivo termo de compromisso.
Ao chegar a sede do Departamento, em 18 de
março ato continuo, foi-me passado o seu governo, que se a chave então a cargo
do 1º Tenente Miguel Seixas de Barros, que por sua vez, do Capitão José
Menescal de Vasconcelos.
Foi meu primeiro cuidado, como era
natural, examinar a organização interna
do serviço da Prefeitura, o numero de seus funcionários e a quanto montava a
remuneração dos menos anualmente.
Qual não foi minha desagradável surpresa
quando, ao cabo desse ligeiro exame, chegarei a conclusão de que o numero de
empregados pagos pela prefeitura fora sobremado do acrescido de novos pelos
três substituídos do Capitão Samuel Barreira, tudo sido, além disso,
aumentados os ordenados de vários dos
artigos empregados; de maneira que toda a verba da Prefeitura (400:000,000) se
consumiria só na remuneração do funcionalismo, ficando ainda um déficit avultado.
Afim de obvias tão grave inconveniente,
fiz baixar a Resolução nº 1, anexa, primeiro ato do meu governo.
Equiparável a essa surpresa só a decepção,
não menos desagradável, por mim experimentada ao verificar que no arquivo da
Secretaria nenhum livro de escritura existia onde se achassem consignadas as
verbas anteriores e suas correspondentes aplicações, tampouco um livro de
credito, escriturado de maneira a se saber de pronto o debito da Prefeitura sua
origem e respectivos credores.
Da gestão administrativa do Sr. Dr. Candido
José Mariano, absolutamente nenhuma escrituração existe na Secretaria da
Prefeitura a respeito de verbas, nunca tendo havido uma seção de contadoria,
nem, ao menos um livro de notas dos dinheiros recebidos e da sua aplicação,
desde 1905, ano de sua nomeação, a 20 de abril de 1909, em que assumiu
interinamente o cargo o 1º sub-prefeito, o Capitão Samuel Barreira.
Relativo a administração deste, de abril
de 1909 a 19 de março de 1910, em que esteve pela primeira vez em exercício,
encontrei um balanço geral, publicado em 18 de setembro, no nº 130 d “O Alto Purus”, órgão oficial do
Departamento.
No segundo período da administração do
Capitão Samuel Barreira, que começou a 19 de julho, terminando com a
comunicação oficial de sua exoneração, aqui chegada a 9 de novembro de 1910,
existe no arquivo da Secretaria um livro caixa, de caráter particular e sem
formalidade legal, onde, entretanto, se acham escrituradas com clareza todas as
transações da Prefeitura durante o seu governo.
Em o meu oficio nº 31, de 28 de abril do
ano passado, anexo, dei a V.Exª minuciosas informações sobre esses fatos e ao
mesmo tempo, da precária situação financeira da Prefeitura, de mais a mais,
sobrecarregada de um déficit superior a dozentos contos de réis.
Tal ordem de coisas não devia permanecer
por mais tempo.
Verdade era que a verba de que dispunha a
Prefeitura, já de si exígua, talvez não mais comportasse a criação de uma
contadoria, constituindo uma seção especial, com o respectivo corpo de
funcionários, isto é contador, amanuense e serventes, percebendo ordenados
correspondentes.
Mas, urgia, de qualquer modo, pôr-se termo
a essa inacreditável e singularidade praxe, em voga na Prefeitura do Alto
Purus, que não usava registrar sua receita, muito menos sua despesa, seus
débitos, procedência dos mesmos e respectivos credores.
Resolvi, então, por ato de 25 de abril,
estabelecer na Secretaria uma seção de contabilidade, contudo de dois livros,
que me pareceram os mais imprescindíveis, devidamente abertos, rubricados e
fechados, servindo um de caixa, em que fossem lançadas, com clareza e
pontualidade, todas as transações da Prefeitura, e o outro de registro de
contas.
O serviço da nova seção ficou aos cuidados
do 1º oficial da Secretaria, que, pela acumulação, passou a perceber, além do
ordenado, uma pequena gratificação.
Mais tarde, verificando que aquele
funcionário não era possível dar conta de todo o serviço a seu cargo, e,
atender a necessidade de trazer sempre em dia a escrituração dos negócios da Prefeitura, sempre em grãs de argumento,
fui obrigado a criar mais um lugar de 2º oficial e, posteriormente, ainda um
outro, de amanuense.
No intuito de dar aos meus atos
administrativos, mormente aqueles que envolvessem aplicação de dinheiro públicos,
a mais ampla publicidade, inaugurei, logo no inicio do meu governo, o sistema
até agora praticado, da publicação no órgão oficial dos balancetes mensais da
Prefeitura, trazendo, assim pontualmente escrito e divulgado todo seu movimento
financeiro e econômico.
Anexos,no lugar
competente, encontrará V.Exª., esse diversos balancetes parciais, além do
balanço geral, relativo não só a verba ordinária (material) como também a
extraordinária ( serviços públicos e
Obras).
Havia na Prefeitura a praxe evidentemente
abusiva de se impor aos pequenos
vendeiros ambulantes, de frutas, comidas feitas e coisas semelhantes, a
contribuição mensal de 15.000. Como tal pratica, proibida em face do art. 1º do
Decreto nº 1.820, de 19 de Dezembro de 1907, reforçado pelo art. 7 do
regulamento a que se refere o Decreto nº
6.901 art. Que diz ser “defeso aos Prefeitos criar ou perceber quaisquer
taxas ou impostos que não forem decretados pelo Congresso Nacional”, baixei a
Resolução sob nº 6, anexa, abolindo de vez a cobrança indébita daquela
contribuição.
Os mesmos motivos e fundamentos
determinaram a Resolução nº 11, também anexo, proibindo a cobrança que
igualmente se fazia de 100,000 de taxa pela tiragem de cada titulo de
aforamento dos lotes de terras concedidos
pela prefeitura.
SECRETARIAS
Acha-se a cargo do Sr. José Pedro Soares
Bulcão, cujo zelo, inteligência e capacidade de trabalho podem ser atestado
pela boa ordem e exatidão com que foram desempenhados os múltiplos serviços
concernentes a mais importante seção administrativa da Prefeitura.
Relativamente grande foi o movimento da
Secretaria durante os noves meses do ano findo, a que se refere o presente
relatório, enquanto diminuto seja o numero de seus empregados cuja boa vontade
e esforço a custo conseguem suprir as necessidades dos serviços que lhes estão
afectos.
No decurso daquele período foram expedido
180 ofícios e recebidos 346; despachados 1.006 petições e lavrados 147
portarias de nomeação de exoneração, de concessão de licença e outros vários
assuntos. Foram, mais lavrados 11 contratos com a Prefeitura, sendo de todos o
mais importante o relativo a instalação do serviço de iluminação elétrica em
Sena Madureira.
Adiante encontrará V.Exª., a cópia
autenticada de cada um desses contratos.
Foram, enfim, assinadas e postas em vigor
2 resoluções que, também, na integra, vão anexadas.
Em um quadro que vai aperso acha-se descriminado, com os
respectivos ordenados, todo o corpo de funcionários públicos da Prefeitura.
Como se vê desse quadro demonstrativo, a verba destinada mensalmente do custeio
da Prefeitura (33:333,333) é, na sua maior parte, consumida com a remuneração
dos funcionários, restando apenas um pequeno saldo(9053,333) para fazer face a
folha de operários e outras necessidades.
ORDEM PÚBLICAS
É provincial a índole
pacifica e ordeira da população de Alto Purus; não fosse a recente tentativa de
sublevação autonomista, em tempo sufocado, graças a presteza e energia da ação
policial, a este capitulo faltaria, de certo, matéria para sua elaboração.
Desde principio de junho do ano traçado,
época de vazantes do rio, impossibilidade quase a navegação começaram a surgir
aqui insistentes boatos de um projetado movimento autonomista a mão armada.
Logo aos primeiros, resolvi, as despeito
de quaisquer dificuldades de transporte, próprios do verão, envia a Manaus o
1º Tenente Genésio Fernandes da Silva,
afim de trazer novo contingente de praças para a desfalcada Companhia Regional
e duas metralhadoras, levando também, nessa ocasião telegramas para o Sr.
Presidente da Republica e para V,Exº
sobre os boatos então correntes.
Dizia-se o movimento combinada para
explodir a 14 de julho, o que, aliás, não se verificou.
Depois da chegada do Sr. Coronel Antônio
Antunes de Alencar ao Departamento do Alto Acre e da Organização ali do partido
autonomista, recrudeceram aqui as idéias chefiadas pelo referido Coronel.
Precisamente a esse tempo foi-me
denunciada a vinda, da cidade da Empresa, no Acre à Sena Madureira, de um
próprio, mandado pelo Sr. Coronel Antônio Antunes de Alencar, trazendo cartas,
entre outras, uma para o SR. Desembargador Elysiário Távora, fervoroso adepto
do autonomismo do Território do Território, como V.Exº., terá oportunidade de
ver provado.
Coincidiu esse fato com se tornarem mais
freqüentes as reuniões de caráter político que era costumes, a noite,
celebrar em sua residência o Sr.
Desembargador Domingos Américo de Carvalho, talvez dentre os magistrados do
Acre, resalvadas sempre as honrosas excepções, o mais franco e ardoroso
paladino da causa autonomista.
Acrescia que o mesmo Desembargador possuía
em sua casa diversas carabinas Winchester e munições respectivos, tendo de lá
saído certo dias dois cunhetes de balas, com destino ignorado.
Em meados de Agosto chegaram de nova as
meu conhecimento reiteradas denuncias evidenciando o preparo metódico de plano
sedicioso contra a ordem legal constituídas, aqui e no Departamento visinho,
onde o Sr. Coronel Antunes de Alencar, pressuroso continuava na propaganda dos
seu ideais de autonomia à outrance.
Em data de 24 de agosto recebi dali
amistosa carta do ilustre Dr. Deocleciano Coelho de Souza, em cujo final
convidam-me a distinto Prefeito do Acre a com ele formar “estreita liga contra
as pronunciamentos dos exaltados políticos, que alteram a ordem publica
A História de Wilson Pinheiro (por Marcos Vinícius)
A
HISTÓRIA DA HISTÓRIA DE WILSON
A
VOZ QUE NÃO SE PODE CALAR
A
história do Acre possui características únicas frente a história de outras
regiões brasileiras ou mesmo em relação a própria história nacional. Apesar de
que muitos de seus eventos foram engendrados a partir do País que lhe deu
origem.
O
Acre se constitui na fronteira mais ocidental do Brasil. Como tal
Passados
20 anos da morte de Wilson Pinheiro, líder pioneiro em sua luta e sua morte,
caminho que seria seguido com todas as suas consequencias por outros homens tão
determinados quanto ele, o que ficou ? O que mudou ? No Acre e no Brasil a
situação de trabalhadores, camponeses, indíos e seringueiros melhorou ? Se tudo
continua na mesma, então o que teria acontecido ? Seriamos nós incapazes de
mudanças ? Estaria nossa sociedade eternamente condenada à exclusão de parcelas
significativas de sua população ?
Resumo
Boris Fausto
A
década de 60 era promissora para o Acre. Depois de décadas de lutas e
contradições, finalmente o Território Federal do Acre havia se transformado no
Estado do Acre. Poderia, a partir de então ser o senhor de seu destino. Seus
habitantes, passaram a possuir em 15 de junho de 1962, autonomia para escolher
seus próprios governantes, sonho acalentado e buscado por muitas gerações de
acreanos.
Porém,
não demorou muito e o golpe militar de 1964 fez todas as esperanças
democráticas acreanas cair por terra. Logo, o primeiro governador eleito
diretamente pela vontade soberana do povo acreano seria deposto. A história do
Acre continuaria a ser dirigida por forças externas à sociedade acreana ainda
por mais duas décadas.
Por
isso, precisamos ainda recorrer às forças nacionais e internacionais para
entender as linhas de desenvolvimento da história acreana do anos que se
seguiram.
O
Golpe militar de 64 tinha alguns objetivos bastante claros quando foi
instituído. O principal era: “reformar o sistema econômico capitalista,
modernizando-o com um fim em si mesmo e como forma de conter a ameaça
comunista. Para atingir esse propósito era necessário enfrentar a caótica
situação econômico-financeira que vinha dos últimos meses do Governo Goulart;
controlar a massa trabalhadora do campo e da cidade; promover uma reforma do
Estado.” (470)
Para
tanto uma serie de medidas foi, desde o início do governo Castelo Branco,
implementada. A começar pelo lançamento do PAEG (Programa de Ação Econômica do
Governo que consistia essencialmente em reduzir o déficit do setor público,
contrair crédito privado e comprimir salários (qualquer semelhança com a atual
política econômica do governo não é mera coincidência).
Em
poucos anos, o resultado da mudança dos eixos da economia brasileira começa a
surtir efeito. Enquanto a sociedade brasileira vive seus piores dias em relação
à restrição de seus direitos políticos e individuais, os indicadores econômicos
registram índices cada vez mais favoráveis. “Em 1968 e 1969, o país cresceu em
ritmo impressionante, registrando a variação respectivamente de 11,2% e 10,0%
do PIB, o que corresponde a *,1% e 6,8% no calculo per capita. Começava assim o período do chamado “milagre
econômico”.” (482)
O
governo Médici, um dos mais repressivos e violentos de toda a história
brasileira, conseguiu um acelerado crescimento da economia brasileira entre
1969 e 1973 graças à conjuntura internacional de créditos baratos e forte
entrada de capitais estrangeiros, especialmente para os setores industriais
(dentre os quais o mais beneficiado foi a industria automobilística). Some-se a
isso, ainda, um forte aparato de propaganda que embalado pela popularização da
televisão e pelas conquistas do futebol em 1970 criou a imagem de que “Esse é
um pais que vai pra frente”.
Porém,
esse período de crescimento econômico não significou maior distribuição de
renda, ou ampliação do direitos e benefícios sociais. Pelo contrário o que
houve foi o aumento significativo da concentração de renda nas classes sociais
mais elevadas. Seria preciso primeiro aumentar o bolo, para só depois
dividi-lo, nas palavras do Ministro da Economia da época, Delfim Neto. Com isso
o Brasil se destacaria no contexto mundial pela posição de destaque em seu
potencial industrial e por seus indicadores muito baixos na saúde, educação,
habitação, etc.
Era
a implantação do “Capitalismo Selvagem” que não contemplava nem a natureza nem
muito menos as populações locais. O melhor exemplo disso foi a construção da
Transamazônica, construída para assegurar o controle da região (segundo a ótica
dos militares) que causou enormes danos ambientais, engordou o caixa de muitas
empreiteiras e não beneficiou em nada a população das regiões atingidas pelo
projeto.
Em
1973, a ocorrência da primeira crise do petróleo, ameaçou o plano do governo
militar. Ainda assim manteve-se a ótica desenvolvimentista através da
implantação do II Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) que buscou consolidar
a política de substituição de importações, agora mais centradas no setor da
energia. Isso custou o aumento significativo do endividamento brasileiro e,
apesar dos indicadores econômicos gerais do período entre 1974 e 1978
apresentarem resultados satisfatórios, a situação econômica brasileira era
potencialmente muito perigosa.
Apesar
de reprimidas as lideranças sindicais populistas, os sindicatos mantiveram e
mesmo aumentaram sua importância, graças principalmente à administração dos
recursos da previdência dos trabalhadores sindicalizados. Com isso a CONTAG
(Confederação Nacional dos Trabalhadores Agricolas), já em 1968, começou a agir
independentemente ao governo e incentivou a organização de federações de
sindicatos rurais em todo o país.
Os
numeros desse crescimento são significativos: os sindicatos rurais eram 625 em
1968, 1.154 em 1972, 1.745 em 1976 e 2.144 em 1980. Os trabalhadores
sindicalizados saltaram de 2,9 milhões em 1973 para 5,1 milhões em 1979.
Essa
condição geral foi ainda mais estimulada pela ação da Igreja através da CPT
(Comissão Pastoral da Terra). Com isso,
os movimentos sociais rurais passaram a enfatizar a luta pela posse da terra e
pela extensão ao campo dos direitos trabalhistas, chamando atenção para as
novas realidades do meio rural. (498)
Mas
não foi só no campo que o movimento sindical cresceu. Surgiram novos sindicatos
de trabalhadores de “colarinhos brancos”, como médicos, sanitaristas e outras
categorias, além dos já tradicionais sindicatos de professores, bancários, etc.
Além
disso o movimento operário ressurgiu em novas bases mais independentes do
estado, principalmente no setor automobilístico que havia crescido enormemente
graças à política de incentivos desse setor adotada pelo governo militar.
Surgiram novas lideranças como Luís Inácio da Silva (Lula) e o novo
sindicalismo foi capaz de articular as grandes greves de 1978 e 1979 que
reuniram milhões de trabalhadores.
Ao
mesmo tempo, a situação econômica do início do Governo Figueiredo, não era mais
tão favorável quanto nos anos anteriores e foi necessário “frear o carro” em
fins de 1980. “A expansão da moeda foi severamente limitada, os investimentos
da empresas estatais foram cortados; as taxas de juros internos subiram e o
investimento privado também declinou.” (502) A recessão de 1981-1983 teve
pesadas consequências. Calcula-se que o declínio da renda foi mais grave do que
o ocorrido nos anos seguintes à crise de 1929.
Segue
resumo da situação política e econômica oficial na Amazônia.
Texto
ideal:
Introdução:
A
conquista da voz trabalhadora – criação dos sindicatos rurais
Os
jornais e a contradição da sociedade
A
academia se apropria e multiplica a voz
O
Acre é a fronteira ocidental do Brasil. É justo considerar que Brasiléia,
nascida Brasília, seja a fronteira do Acre. Uma cidade simples, como são as
cidades amazônicas. A margem do rio Acre, fronteira da Bolívia, marco extremo
de um território tomado a força do vizinho, faz cem anos. Mas, sem remorsos,
questão de justiça.
Cidade
ocidental pacata, tranquila apesar dos percalços de uma vida sustentada por uma
borracha que não dá mais aquilo tudo. Mas como mudar de vida se tudo o que esse
povo mais preza é viver nesse ritmo amazônico de colher da floresta o que ela
tem a oferecer. Castanha, seringa, patoá, açaí, pupunha, caça. Subsistência
garantida. Tempo pra criar os filhos e melhorar a vida.
Tudo
nos seus lugares. Os pequenos caciques locais a achar que mandam, o povo a
fingir que obedece e aqui e ali gritando pra lembrar que são eles que governam.
Os políticos satisfeitos porque agora o Acre era um estado e isso significava
mais vagas legislativas, executivas, etc. Tudo calmo.
Aí
vem o golpe militar. Linha dura de novo, indicações, conchavos políticos outra
vez, tudo como Dantes no quartel de Abrantes. A tudo a elite se adapta.
Mas
logo chegam os novos planos militares para desenvolver a amazônia, para conter
o avanço dos comunistas que ameaçavam vir da América Central e via Andes tomar
de assalto terras brasileiras proclamando, enfim a revolução popular maoista no
Brasil. Desculpas e histórias mil, mas muito dinheiro vindo de fora cheios de
planos perfeitos para aumentar seu já vasto domínio sobre a pobre América
Latina.
Tratemos
de desenvolver a industria, diversifiquemos nossa produção agrícola, realizemos
a expansão da fronteira agropecuária, mas não esqueçamos do arrocho salarial,
do imposto alto, do empréstimo de um dinheiro que nunca será pago mesmo.
Pronto, estava preparado o pacote que resultaria numa bolha de falsa
prosperidade chamada de “milagre
economico”.
Afinal
de contas, Esse é um país que vai pra frente, são Sessenta milhões em ação e o
Brasil é campeão. Tudo ao vivo pela televisão. É isso mesmo, o Brasil é o país
do futuro.
No
Acre, quase isso. A televisão ainda não havia chegado e o rádio era ainda o
grande responsável pelas emoções futebolísticas e nacionais. Mas haviam novas
promessas no ar. O Acre voltaria a ser a terra da promissão. Bastava vender
seringais, cortar sua madeira, transforma-la em pasto e plantar boi. Logo
chegariam os investidores com dinheiro abrindo negócios e desenvolvendo a
região. “Venha para o Acre. O filé mignon da Amazônia”.
O
que ninguém podia esperar é que o efeito fosse tão devastador. No curto espaço
de três anos, a calmaria das cidades acreanas foi transformada num inferno de
conflitos, ameaças, assassinatos. O que havia sido vendido como desenvolvimento
e bem estar foi traduzido em uma invasão de grileiros, especuladores,
misturados a poucos investidores reais e a uma multidão de trabalhadores
expulsos pelo latifúndio que já havia tomado o Centro-Sul do Brasil.
Logo
todas as estruturas da secular sociedade acreana foram transtornadas de uma
forma como nunca havia acontecido antes. Os ciclos de bem estar anteriores
haviam sido criados a partir da exploração da floresta, especialmente da
borracha. Agora não, tratava-se de derrubar a floresta, desalojar famílias que
a gerações ocupavam aquelas colocações, romper as cadeias de dependência mútua
que geriram a sociedade acreana durante toda sua história. Coronéis falidos,
comerciantes perdidos, seringueiros expulsos, toda uma sociedade refém de uma
sigla oficial POLAMAZONIA.
Havia
que resistir. A mesma sociedade pacata e tranquila, armou-se, contatou canais
de organizações de resistência, destacou homens de coragem para a linha de
frente da luta. A igreja, a CONTAG, o Varadouro, os grupos clandestinos que
podiam apoiar a resistência contra a devastação da terra acreana.
Mais
uma vez os seringueiros, os índios, os ribeirinhos foram chamados a lutar pelo
Acre. Era uma voz coletiva que dizia não. Dessa vez os líderes capazes de unir
o povo vieram do interior da própria sociedade em convulsão. Alguns tombaram, é
verdade, mas a voz que se levantava era a da paz perturbada pelos que chegavam
de fora como formigas cortadeiras no roçado. Criaram-se os empates, forma
pacífica de impedir a retirada da floresta. Único modo de não deixar que o Acre
se tornasse terra devastada de matas e homens. Era o povo da floresta em
levante contra o estado, por justiça, mais uma vez.
Logo
o governo, o país foram obrigados a ver que não havia possibilidade do Acre
permanecer naquele estado explosivo de coisas. A convulsão social estava por
demais próxima. O jeito foi nomear novos governadores qe tentassem minimizar os
conflitos sociais. Trata de tentar reverter tudo de novo. Retrato do Brasil que
pensava que sabia pra onde ia, mas não saia do lugar.
Era
tarde. O conflito estava posto, a guerra iniciada, o empate decidido.
Wilson
pagou com sua morte pela cegueira de um país que esquece que é feito pelos seus
habitantes, que não podem ser assim desrespeitados.
Logo
Wilson pioneiro de uma luta pela permanência. Wilson que não deixou uma palavra
escrita ou gravada conhecidas, mas que deixou seu corpo numa terra que exigia e
exige respeito. Sua história de lutas não pode ser subestimada jamais. O Acre é
brasileiro porque quis. Seu povo, que vive da floresta não poderia deixar de
lutar ao se ver mais uma vez ameaçado em sua integridade.
Hoje
isso se condensa numa única palavra que reúne e resume todo esse sentimento,
toda essa luta secular.
O PODER DO SILENCIO
Seu nome: Wilson Pinheiro. Um homem alto,
determinado, de fala mansa e rara, mas de olhar poderoso.
Por um mês procuramos, em vão, sinais de sua voz.
Nada.
Nenhum papel de pão manuscrito, nenhum documento do
Sindicato, nenhuma entrevista nos jornais, nenhuma frase solta e memorizada
pela multidão que instintivamente seguia os passos daquele homem de uma coragem
evidente.
Foi pelas vozes alheias que começamos a conhecer a
história do Wilson. Sobram relatos do dia 21 de julho de 1980, quando três
balas desferidas pelas costas puseram fim a sua vida. O primeiro dos líderes da
floresta a morrer sem razão, por uma causa. Mas não o ultimo a pagar com sua
vida para que outros pudessem continuar vivendo de acordo com suas tradições
ancestrais. Foram esses relatos da morte, da comoção popular, do enterro, da
indignação, da dor e das juras de vingança, publicadas nos jornais acreanos e
repetidas nas entrevistas feitas com as pessoas que participaram dessa
história, que nos fizeram começar a ouvir o som da voz daquele homem calado.
Não pudemos evitar um calafrio na espinha ao
conhecer a história do homem enterrado de bruços pela multidão, com uma moeda
na boca para evitar a fuga de seus assassinos. Os signos populares são
poderosos. A sina de um homem pode ser sintetizada em um único gesto.
Não pudemos, tão pouco, evitar um enjôo desagradável
ao ler matérias do jornal oficial que diziam que a culpa da malfadada “Tensão social” vivida pela população
acreana naqueles anos terríveis era dos agitadores, dos subversivos, dos
comunistas que só queriam conflagrar a multidão para destruir a ordem vigente.
Se bem entendemos essa história, era o povo que
estava tentando manter a ordem das coisas de um Acre invadido por pessoas
inescrupulosas, que pouco sabiam da gente que vivia do que a floresta tinha pra
oferecer, que só se interessavam por tirar o máximo possível no menor tempo
possivel. Quem subvertera a ordem natural das coisas havia sido o então chamado
“Capitalismo Selvagem”, o Governo Militar, o Governo Biônico Estadual; para os
quais só contavam índices econômicos favoráveis e um povo manso que obedecesse
prontamente o que lhe era determinado. Era preciso progredir, alcançar e
desenvolver as fronteiras de um país subdesenvolvido (outra palavra da moda
na época). Afinal de contas “Esse é um
país que vai pra frente”. “Brasil, o país do futuro”. E o que é o progresso ? Estradas
asfaltadas, bois no pasto, horizontes sem homens monotonamente preenchidos por
soja para exportação. Não importa o preço a ser pago. No máximo, uma ou duas
gerações de brasileiros cerceados, sem liberdade de ir e vir, falar, pensar, plantar,
sonhar, buscar a felicidade, enfim. Milhões de brasileiros entre 30 e 40, anos que
sabem bem o preço que foi pago por tamanha estupidez oficial encastelada nas
estruturas de poder desse país.
Naquela época eram eles que falavam, o Wilson
calava, mas agia. Usava sua enorme força vital para conduzir o povo em uma
marcha pacífica pelo “empate” do progresso. Todos sabiam que não se podia
vence-los. Eles possuíam a polícia, as forças armadas, o capital, a justiça,
tudo de seu lado. E o povo o que tinha ? Somente sua determinação e coragem
frente à força bruta. Mas, se não se podia vencer os opressores podia-se pelo
menos “empatar” com eles. E lá iam eles, mulheres e crianças à frente, impedir
mais uma derrubada. Centenas de Wilsons, anônimos, calados, transformando suas
ações em uma voz que gritava.
Da culminância da dor, a vingança. Morte trocada.
Para um Wilson morto, uma outra morte, um Nilão, culpado ou não, um deles. Era
o mínimo que podiam fazer se quisessem sobreviver. Aceitar de braços cruzados a
morte de Wilson significaria a derrota e a condenação à morte de muitos outros homens
de um povo submetido ao terror instituído. Existe razão possível na guerra ?
As versões estão lá, para todos verem. Quem perder
algum tempo lendo as matérias publicadas no “Varadouro”, no “Nós Irmãos”, na
“Gazeta do Acre”, no “O Rio Branco” e no “O Jornal” vão poder constatar
pessoalmente a mobilização popular que se espalhava por todos os vales do Acre
- de Boca do Acre até Brasiléia, de Sena Madureira até Cruzeiro - contra a
invasão predatória e ofensiva dos “paulistas”. Quem se detiver em ler as
páginas que apenas começam a amarelar daqueles jornais ficará sabendo do
descaso oficial com a captura dos assassinos de Wilson e depois a fúria com que
os assassinos de Nilão foram perseguidos, presos e torturados. “Operação Pega
Fazendeiro”, “Balas de Aço”, “Os sete dias de Brasiléia”. Uma sequencia de
manchetes que nunca precisariam ter sido publicadas, se nossos governantes
fossem homens sensatos e esse um país justo.
Anos se passaram desde então. A luta continuou e as
manchetes dos jornais seguiram estampando notícias de crimes de encomenda, de
conflitos eminentes, de empates vitoriosos e de ações públicas insuficientes.
Outros homens tombaram antes que a floresta acreana e o modo de se viver com ela
pudessem ser salvos. Poucos culpados foram presos por seus crimes. Mas o povo
venceu. No que era possível, mas venceu. Reservas extrativistas foram
demarcadas, o povo da floresta fez uma aliança que mostrou a todos a existência
de um povo que só queria tranquilidade e justiça pra tocar sua vida. A voz de
Wilson e de seu povo foi forte o suficiente para se fazer ouvir.
O Acre nunca mais seria o mesmo então. Os
governantes até continuariam os mesmos, nas mesmas famílias que à décadas. Mas
havia algo novo na paz que aos poucos voltava às cidades acreanas. O povo das
cidades também havia assistido à chegada de milhares de famílias expulsas de
suas casas, presenciado a miséria que explodia em suas invasões periféricas e
ouvido as vozes que se levantaram de dentro da floresta. Os educados filhos da
cidade, viram que tudo o que acontecera em Xapuri, Brasiléia, Boca do Acre,
Quinari, Tarauacá, era questão de resistência de um povo. Era preciso
reconhecer que nada daquilo havia sido coisa de comunista, de subversivo, de
políticos cassados, de ambientalistas pós-modernos, de ativistas burgueses, de
intelectuais urbanos.
Mais uma vez a voz que vinha do interior foi
expressa por veículos estranhos ao povo que falava. Foi a vez das monografias
acadêmicas, das dissertações de mestrado, das teses de doutorado. O que era
coragem e sabedoria popular foi logo promovido à ciência, multiplicando os
títulos, as abordagens, os recortes epistemológicos, as linhas
teórico-metodológicas de pesquisa, economia, história, sociologia,
antropologia, expressões e palavras estranhas ao povo que de sujeito se tornou
objeto (de pesquisa).
Diferente daquelas manchetes de jornais que não
deveriam ter sido escritas, alguns dos novos títulos revelaram o aprendizado de
uma sociedade civilizada com o que havia de mais antigo e inovador em sí mesma,
a voz do povo. “Ocupação recente das terras do Acre (Transferencia de capitais
e disputa pela terra)” (1982); O sertanejo, o Brabo e o Posseiro (Os cem anos
de andanças da população acreana)” (1985); “Conflitos pela terra no Acre”
(1987); “Os ‘Imperadores do Acre’ – uma análise da recente expansão capitalista
na Amazônia” (1988); “Modernização da agricultura – pecuarização e mudanças – o
caso do Alto Purus” (1991); “Seringueiros e Sindicato: Um povo da floresta em
busca de liberdade” (1991); “Capital e trabalho na Amazônia Ocidental” (1992);
entre tantos outros publicados nos corredores das UNBs, UFACs, UFMGs, PUCs.
Isso sem falar nas prateleiras das livrarias dos
shopping-centers repletos de livros sobre a devastação da Amazônia, sobre a
vida e a morte de Chico Mendes, sobre ecologia, etc. Será possível que essa
sociedade de consumo rápido e desenfreado tenha realmente ouvido aquela voz que
silenciou na boca de um Wilson Pioneiro ? Talvez nunca saibamos ao certo.
O que parece certo é que o Acre continua no seu
caminho, Tentando construir um destino próprio. Não importa se diferente das
receitas caseiras ou internacionais. Aqui existe uma voz que nunca foi escrita,
da qual não se registrou o timbre, da qual não restou nenhuma frase, mas que
não deixa de ser repetida e ouvida por seringais e cidades dessa Amazônia
Ocidental. Uma certa voz, de um certo homem alto e determinado, de fala mansa e
rara, dono de um olhar e um silêncio poderosos.
PS: Este deveria ser um artigo de história, na mais pura acepção pragmática
da ciência. Porém, como não sentir e escrever com o coração sobre uma tal
história de dor e vida ?
Pesquisa: Equipe do Departamento de Patrimônio Histórico e Cultural – FEM
Texto: Marcos Vinicius Neves
A Questão Fundiária Acreana: Síntese Histórica e a Problemática Recente.
ACERVO: DPH-FEM
O clima de expectativa e de incerteza que tem marcado
a disputa pela terra no Acre nos últimos anos veio evidenciar e exigir solução
para um problema que as autoridades preferiram ignorar ao longo do tempo: a
confusa situação fundiária de seu território. O traço distintivo da
problemática sócio-econômico-política que tem marcado a história recente do
Acre encontra suas raízes no processo próprio de formação da propriedade da
terra naquela região, cuja estrutura de distribuição apresenta marcas não
apenas representativas da economia extrativista, que definiu a sua ocupação
econômica, mas, fundamentalmente, da sua própria história
político-administrativa. Hoje, o problema da regularização da propriedade da
terra no Acre é, pelo menos, um desafio para o INCRA e para o Governo.
Apesar de que no extrativismo vegetal a terra
permanece praticamente intocada, não é transformada economicamente, ela
apresenta-se como um recurso natural prioritário do processo produtivo. Face á
distribuição natural e aleatória das seringueiras, o aumento da produção, na
impossibilidade da introdução de mudanças tecnológicas, implicaria um aumento
da área explorada, resultando na formação de unidades fundiárias de enormes
proporções, ou seja, numa estrutura da propriedade de terra bastante
concentrada, definida por latifúndios.
A forma como se deu a ocupação
produtiva do espaço acreano condicionou uma situação bastante confusa e
irregular com relação à propriedade das terras dos seringais foi registrada
pelos seringalistas sem que houvesse título de origem. Uma situação irregular
que se consolidou ao longo dos anos, pois, afinal, niguém estava interessado em
contestar a legalidade ou não daqueles títulos, uma vez que a terra era um
fator abundante e o seu valor era definido pela capacidade de produção do
látex. Só recentemente, com a transferência da maioria das terras acreanas aos
compradores do Centro-Sul, veio à tona uma série de irregularidades com relação
à propriedade da terra. E essas irregularidades eram de tal magnitude, que
possibilitaram aos especuladores, grileiros e aventureiros lançarem mão das
terras baratas dos antigos seringais, servindo-se dos mais variados expedientes
para expulsar seringueiros e pequenos posseiros. É praticamente impossível
pensar o Acre, sem levantar a questão da luta pela terra. Daí a razão de
introduzirmos alguns pontos de análise sobre a atual dinâmica da posse da terra
no Acre como uma tentativa de explicar o clima de tensão social no campo e na
cidade em quase toda a área do Estado, bem como a participação dos diversos
agentes nela envolvidos.
A história da formação da
propriedade da terra na região acreana confunde-se, de certa forma, com a
própria história da ocupação econômica da área, dadas as características da
estrutura do seringal nativo e os reveses políticos de sua história: A origem
do processo se deu na segunda metade do século passado, no momento em que,
impulsionados pela crescente demanda mundial de borracha, os brasileiros
começaram a penetrar as matas acreanas, até então reconhecidamente território
boliviano. A ocupação brasileira, a princípio, não foi contestada pelo Estado
Boliviano, abrindo possibilidades para que a Província do Amazonas assumisse a
administração política da área, apesar de que o controle econômico da região
como um todo era exercido pela Província do Pará.
Naquele período foram expedidos os
primeiros títulos definitivos de propriedades sobre terras acreanas.
Em janeiro de 1903, após o vitorioso
movimento revolucionário que poria fim á soberania boliviana, Plácido de Castro
cria o Estado Independente do Acre, e novos títulos de propriedades foram
concedidos. Finalmente, pelo Tratado de Petrópolis, assinado em 17 de novembro
de 1903, as terras do Acre são definitivamente anexadas ao território nacional.
“Portanto, até ser definitivamente incorporado ao Brasil, o Acre conheceu três
diferentes condições político-jurídico-administrativas: a do Amazonas, a
boliviana e a do Estado Independente do Acre. Ao firmar o Tratado de
Petrópolis, o Brasil comprometeu-se a reconhecer todos os direitos reais
adquiridos por nacionais ou estrangeiros, sob qualquer destas três situações,
desde que respeitados os princípios do direito civil. Isto é, o Poder Público brasileiro
responsabilizou-se por acatar e revalidar todos os títulos de propriedades
sobre as terras acreanas, desde que emitidos em acordo com as normas vigentes
em cada uma das condições” (CEDEPLAR, 1979:224). Contudo, além do
reconhecimento dos direitos adquiridos, o Brasil não se esforçou no sentido de
revalidar os títulos expedidos anteriormente, nem em regularizar a situação
daquelas terras ainda não tituladas. Na realidade, não foram muitos os títulos
expedidos nas condições vistas acima, isto é, antes da incorporação definitiva
das terras do Acre ao território nacional, e foram, em geral, títulos de áreas
pequenas. O descaso das autoridades governamentais fez surgir no Acre uma
prática que se tornou bastante comum na constituição da propriedade de terra na
região: o registro em cartório. Uma prática de regularização da propriedade
fundiária, que se consolidou historicamente no Acre.
Quase todas as áreas dos antigos
seringais, portanto, apesar de não possuírem titulação original, estão
escudadas por escrituras resultantes do livro de registro de imóveis. Uma
cadeia dominal confusa, que reflete a mais complexa situação fundiária do páis,
e que coloca pra o INCRA o
problema de reconhecer ou não as escrituras antigas e irregulares. Como órgão
responsável pela organização fundiária, o INCRA só aceita três tipos de títulos
de propriedade como válidos no Acre: expedidos ou pelo Estado do Amazonas, ou
pela Bolívia, ou pelo governo independente de Plácido de Castro. Se a situação
da propriedade da terra é tão irregular, poder-se-ía perguntar, então, porque
somente após aproximadamente um século de sua ocupação essa irregularidade
desponta e requer solução? A explicação é aparentemente simples, e já tem sido
colocada ao longo deste trabalho. Ocorre que, dado o caráter eminentemente
extrativista da economia acreana, onde praticamente só a seringa contava, a
terra somente era considerada enquanto fonte de recursos naturais, isto é, pelo
número de seringueiros que ela abrigava.
A exploração da seringa era,
portanto, a forma exclusiva de geração de valor, a única via de obtenção de uma
renda da terra. A terra em si, a terra desprovida de seringueiras, era uma
terra incapaz de produzir valor e, assim, não despetava qualquer interesse.
Esta é uma característica básica do extrativismo: o desinteresse pela terra em
si e, muitas vezes, o seu abandono quando se esgota o objeto de trabalho, ou a
fonte de riqueza que motivou a sua ocupação pelo homem.
A estrutura fundiária acreana é,
pois, um reflexo da forma como foi, originariamente, ocupada a região, isto é,
em função da extração da borracha nativa. É produto da forma de organização da
empresa extrativista que se, por um lado, assegurava ao patrão seringalista a
detenção de imensas áreas, por outro, excluía o seringueiro do acesso à terra.
O recente processo de corrida às
terras do Acre e a conseqüente transferência da maioria das terras dos
seringais a compradores do Centro-Sul trouxeram uma nova dimensão à questão da
terra no Estado, com mudanças na forma de uso da terra e reflexos
significativos na estrutura fundiária, onde é possível observar, como será
mostrado adiante, um crescimento acelerado das pequenas propriedades apesar de
que no conjunto a terra continua extremamente concentrada, predominando o
latifúndio, a grande extensão de terra, pouco ou escassamente explorada.
O Acre possui uma superfície
territorial de 15.258.900 ha distribuídos por 12 municípios, que constituem as
duas microrregiões homogêneas do Estado: a Alto Juruá, com 7.304.300 hectares,
e a Alto Purus, com 7.954.600 hectares.
Os dados apresentados (anexo 1)
mostram a evolução da área cadastrada nos anos de 1972, 1976 e 1982, no Estado,
por microrregião homogênea, estabelecendo-se a sua relação com as respectivas
áreas territoriais.
A área cadastrada, que em 1972 era
de 5.537.932 hectares, correspondendo 36,3% da área total do Estado, salta para
11.545.856 hectares em 1976, o que significa dizer que 75,7% das terras do Acre
já pertenciam a particulares naquele ano. Em 1982, a área cadastrada, 15.437.787
hectares, já representa 101,2% da superfície total do Estado, ou seja, a área
considerada como pertencente a particulares no Acre já superou a sua área
total.
Para a microrregião Alto Purus, os
dados evidenciam uma grande expansão das áreas cadastradas, pois já em 1976,
com 8.393.269 hectares, a área cadastrada representava 105,2% da área total da
microrregião. Em 1982, essa relação subiu para 130,8%, com a área cadastrada,
10.407.228 hectares, ultrapassando a área total em 2.452.628 hectares.
Uma visão mais esclarecedora desse
quadro torna-se possível, através de uma análise detalhada da relação área
cadastrada/área total, a nível de todos os municípios em 1982 (anexo 2). Em
cinco dos oito municípios que compõem a microrregião Alto Purus, a área cadastrada
excede a área total, com casos em que aquela é quase o dobro desta, como Sena
Madureira, em que a relação indica 185,3%.
Vale ressaltar que no período
1972/1982 foram incorporados 9.899.955 hectares à área cadastrada, o que
corresponde a um incremento de 178,8% em uma década. Apesar da área cadastrada
já haver superado a área territorial do Estado, a tendência indica que a
relação deverá aumentar, ou seja, que a cada ano novos cadastros serão feitos,
ampliando a diferença entre as áreas. Quer dizer, distanciando cada vez mais a
área cadastrada da área real. É bom saber que se diga que a área cadastrada é a
área declarada e tributada como propriedade privada, não estando ái incluídas
as áreas indígenas, posses não cadastradas e áreas de domínio da União, isto é,
as áreas desapropriadas e ainda não trasferidas a particulares.
Além disso, há que considerar também
que a relação área cadastrada/área total não é o indicador mais adequado para
explicar o grau de privatização das terras, porquanto em se tratando de imóveis
rurais seria necessário excluir, da área total, as áreas urbanas. Assim,
estaria bem definido a participação, a verdadeira grandeza das áreas
cadastradas no Acre.
Como explicar, porém, esse
supercadastramento? Como é possível que a área declarada como de propriedade de
particulares seja superior à área territorial total, seja do Estado, da
Microrregião, ou do Município? A resposta mais simples e imediata, e que é a
explicação dada pelo INCRA, é a de que ocorre com freqüencia o bicadastramento
de áreas. E, por que as áreas são bicadastradas? Ora, porque há superposição de
títulos sobre os mesmos imóveis.
A explicação poderia ficar por aí,
poderia ser suficiente, não fosse o fato perfeitamente observável de que o
supercadastramento ocorre notadamente nas áreas onde os conflitos pela terra, a
expulsão de seringueiros/posseiros e, principalmente, a presença de
especuladores e grileiros têm sido marcantes.
A terra tornou-se objeto
especulativo, mercadorias em rápida valorização. O capital especulativo criou
as condições objetivas para a sua reprodução. Muitos seringais foram lotados,
áreas imensas foram adquiridas por empresas declaradas como colonizadoras, tipo
COLOAMA, COAPAI, etc., várias transações tendo como objeto uma mesma área,
anexação ou incorporação de áreas vizinhas (processo de “esticamento” da área
bastante utilizado no Acre, em face da precária demarcação primitiva das terras
dos seringais). Aí, talvez, a explicação mais plausível para a superposição de
títulos, razão do supercadastramento. Grandes áreas são cadastradas sem levar
em conta a presença, em seu interior, de posseiros e pequenos proprietários,
que, por sua vez, também fazem seus cadastros. A propriedade da terra no Acre
continua extremamente concentrada. A maioria dos imóveis está situada nos
estratos inferiores, enquanto que a quase totalidade da área está nos
superiores. De acordo com os dados (anexo 3), cerca de 78% dos imóveis rurais
têm áreas inferiores a 100 hectares e possuíam, em 1978, menos de 1,5% da área
total cadastrada. No outro extremo, os imóveis com áreas iguais ou superiores a
10.000 hectares, que representam simplesmente 0,2% dos imóveis do Estado, vê-se
que eles se apropriravam de 45,3% da área cadastrada em 1978.
O crescimento relativo das áreas dos
imóveis com 100.000 hectares e mais entre 1972 e 1978 pode ser um indicador
significativo do agravamento da concentração da propriedade da terra no Acre. A
participação dessas áreas na área cadastrada total passou de 32,9% em 1972 para
38,4% em 1976 e para 45,3% em 1978. O aumento crescente das áreas gigantescas
relativamente à área cadastrada total indica que se acentua ainda mais a
situação de extrema desigualdade da propriedade da terra, que constituiu o
traço marcante da estrutura fundiária acreana.
O cadastro de imóveis rurais no Acre
registrou uma expansão absoluta de 13.694 imóveis entre 1972 e 1982, passando
de 4.078 em 1972 para 17.772 em 1982 (anexo 4), o que equivale a um incremento
de 335,8 % no período. Esse crescimento deveu-se, em grande parte, à forte
concentração dos imóveis na categoria de minifúndio.
Os dados indicar que a participação
dos minifúndios no total de imóveis cresceu de 77,5% em 1972 para 82,0% em
1982, o que pode significar que está ocorrendo um processo interno de
minifundização, ou de fragmentação da pequena propriedade no Estado, embora no
geral o processo seja concentrador. Apesar de representarem 82,0% dos imóveis
cadastrados em 1982, os minifúndios absorvem apenas 3,6% da área cadastrada,
enquanto que, por outro lado, os latifúndios, aí compreendidos, tanto aqueles
“por exploração” como o “por dimensão”, que representam apenas 16,6% dos
imóveis, se apropriam de 88,9%, da área cadastrada no mesmo ano.
Os 11 latifúndios por dimensão de
1972 mediam 1,9 milhão de hectares, passando os 20, apenas 0,1% dos imóveis, de
1982 a corresponder a 4,8 milhões de hectares, 31,1% da área cadastrada. O
rápido crescimento dos imóveis cadastrados nos últimos dez anos reflete a
expectativa que se criou recentemente no Acre, nas questões relacionadas à
regularização das terras. Antes de ininciar-se o processo de transferência das
terras dos seringais aos compradores do Centro-Sul, os pioneiros da região não
viram necessidade de relacionar a posse física com a posse legal ou jurídica.
Antes de o Acre ser atingido pelo
movimento extensivo do capitalismo, no início da década de 1970, praticamente
inexistia pressão sobre a terra e o acesso à ela era relativamente fácil em
todo o Estado. Dada a grande oferta de terras e o valor quase insignificante destas
em relação ao capital, quase nenhuma motivação havia para que proprietários e
posseiros regularizassem suas áreas. Além do mais, o Estado não dispunha de uma
estrutura jurídica com vista a
regularizar as terras.
Na medida em que o capital
transforma a terra em fator de especulação, numa mercadoria em rápida
valorização, na medida em que o acesso á terra começa a ficar difícil,
percebe-se a importância da propriedade da terra e intensifica-se a corrida
pela regularização das áreas. Essa pode ser, talvez, a explicação mais
plausível do grande aumento no número de imóveis rurais cadastrados na última
década.
Observando-se a distribuição dos
imóveis e áreas rurais por categorias e segundo as microrregiões homogêneas e
os municípios, em 1982 (anexo 5), vê-se que 13 (65,0%) dos 20 latifúndios por
dimensão estão nos municípios de Sena Madureira e Manoel Urbano, representando
uma área de quase 3,5 milhões de hectares (71,4%) do total cadastrado naquela
categoria. Por outro lado, alguns municípios concentram um elevadíssimo
percentual de suas áreas cadastradas na categoria de latifúndio (por exploração
e dimensão). É o caso, por exemplo, de Manoel Urbano, 98,0%; Sena Madureira,
95,3%; e Tarauacá, 91,9%.
Os dados evidenciam a presença
marcante e dominante dos latifúndios em praticamente todos os municípios do
Estado, indicando que a tônica da aquisição de terras no Acre foi a de grandes
áreas, em geral mantidas inexploradas, como reserva de valor, a título
puramente especulativo. A importância da propriedade da terra “põe em evidência
o caráter muitas vezes não progressista e até mesmo parasitário de algumas das
transformações que aí se realizam. É esse o caso das grandes extensões de
terras submetidas à especulação imobiliária, dos imóveis “vazios” à espera de algumas
das transformações que ái se realizam. É esse o caso das grandes extensões de
terras submetidas à especulação imobiliária, dos imóveis “vazios” à espera de
valorização, dos investimentos em pecuária extensiva e outras formas de
reservas de valor. Aí o capital não tem por objetivo intensificar o processo de
produção, mas apenas valer-se do ciclo da natureza e da desenfreada especulação
imobiliária que a inflação alimenta” (Graziano da Silva, 1982:35).
Comparando-se com o total de imóveis
e áreas cadastadas em 1982, os imóveis e áreas com 10.000 hectares e mais
(anexo 6), é possível verificar que estes, mesmo representando apenas 1,52% dos
imóveis do Estado, se apropriam de 72,97% da área total cadastrada. Na
microrregião Alto Juruá, os imóveis com 10.000 hectares e mais correspondem a
1,84 % dos imóveis e absorvem uma área equivalente a 73,4% do total ali
cadastrado; enquanto que na microrregião Alto Purus, 1,39% dos imóveis possuem
10.000 hectares e mais e detém 72.71% de sua área cadastrada.
Nos municípios de Sena Madureira e
Manoel Urbano, a área dos imóveis com 10.000 hectares e mais é superior á área
territorial desses municípios, sendo que neste último, 31 (19,14%) de seus 12
imóveis, se apropriam de 92,28% da área cadastrada no município. Em Tarauacá,
3,63% dos imóveis absorvem 86,24% da área cadastrada; em Feijó, 4,59% dos
imóveis possuem área igual ou superior a 10.000 hectares e detém 99,04% da área
cadastrada naquele município.
Dos 20 maiores imóveis rurais do
Acre (anexo 7) 7 estão em Sena Madureira, 5 em Manoel Urbano, 4 em Feijó, 3 em
Tarauacá e 1 em rio Branco. Esses 20 imóveis, tomados em conjunto, representam
apenas 0,1% do total de imóveis e se apropriam de 32,7% da área cadastrada no
Estado em 1982.
As áreas gigantescas de Sena Madureira
representam tão somente 0,5 dos imóveis e absorvem 38.8% da área cadastrada ou,
ainda, 71,9% da superfície territorial do município. Os 5 superlatifúndios de
Manoel Urbano, 3,1% dos imóveis, detém 67,7 % da área cadastrada, ou 83,3% da
área total do município. No caso de Feijó, os 4 imóveis relacionados, 0,6% do
total do municipio, se apropriam de 53,6% da área cadastrada. Em Taraucá,
apenas 3 imóveis, 0,3 % dos cadastrados, ficam com 37,1% da área tida como
pertencente a particulares. Finalmente, o latifúndio de Rio Branco que, embora
inexpressivo em relação ao número de imóveis do município (0,02%), incorpora
9,5 da área cadastrada, ou seja, mais do que os 5.445 minifúndios (87,8% dos
imóveis), que detém apenas 9,1% da mesma área.
Em síntese, os dados mostrados
permitem visualizar a evolução do cadastro de imóveis rurais no Acre Acre,
dando um perfil da distribuição desses imóveis por extratos de área e por
categorias, ao longo dos últimos dez anos. Permitem, ainda, mostrar a
predominância absoluta das grandes áreas e a importância decisiva que estas
assumem na definição do padrão fundiário do Estado, bem como na explicação da
persistência e do agravamento do elevadíssimo grau de concentração da
propriedade da terra.
Permitem, também, identificar as áreas
onde a ocupação, ou a apropriação das terras foi mais intensa, onde a ação de
grileiros praticamente conseguiu “dobrar” a área de alguns municípios.
Permitem, finalmente, identificar de quem são, onde se localizam e qual a
“verdadeira” dimensão das principais grandes áreas do Estado onde apenas um
imóvel possui área superior a 6 (50%) de seus municípios, tomados
separadamente, ou a 3 (25%) deles tomados em conjunto.
quinta-feira, 12 de setembro de 2013
O moralista dos anos 1980 que denunciava os privilégios dos mandatários do poder, agora pleiteia o privilégio de se aposentar como Deputado. Em vez de denunciar, preferiu a vantagem do se dar bem, indo contra aos interesses coletivos, que são acabar de vez com a PROSTITUTA LEI DE APOSENTADORIA DE POLÍTICOS.
A junta médica indicada pela Câmara para avaliar o estado de saúde do deputado José Genoino (PT-SP) foi a São Paulo na última terça-feira (10) examinar o parlamentar condenado no processo do mensalão, informou ao G1 a Direção-Geral da Casa. O laudo médico que indicará se Genoino tem condições de se aposentar por invalidez deve ser entregue nos próximos dias aos dirigentes do Legislativo.
Se os quatro médicos da junta o considerarem inapto para exercer o mandato parlamentar, o processo de aposentadoria deverá ser concluído entre cinco e 10 dias, segundo o diretor-geral da Câmara, Sérgio Sampaio. Se confirmarem que a doença impede Genoino de trabalhar, ele será aposentado com o salário integral de deputado federal, que, atualmente, é de R$ 26,7 mil.
Os servidores do departamento médico do parlamento tiveram de se deslocar à capital paulista para fazer o exame porque os médicos que atendem Genoino apresentaram um atestado de que, neste momento, ele não tem condições físicas de viajar a Brasília.
Condenado a 6 anos e 11 meses de prisão pelo Supremo Tribunal Federal (STF), Genoino foi submetido a uma cirurgia para correção de dissecção de aorta (quando a artéria passa a abrir em camadas, provocando hemorragias) no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo. Ele ficou internado na instituição de saúde até o dia 20 de agosto.
Suplente na eleição de 2010, o parlamentar petista havia assumido o mandato de deputado federal em janeiro, no lugar de Carlinhos Almeida, eleito prefeito de São José dos Campos (SP).
De acordo com o diretor-geral da Câmara, o deputado já havia se aposentado por tempo de serviço pelo parlamento. O benefício, porém, era proporcional ao tempo em que ele havia atuado no Legislativo. Quando retornou à Câmara, no início do ano, Genoino solicitou a suspensão da aposentadoria para ter condições de atuar como deputado.
No entanto, se o pedido de aposentadoria por invalidez for homologado, ele voltará a receber o benefício, só que, desta vez, correspondente ao subsídio integral de parlamentar. Além disso, manterá o plano de saúde oferecido aos deputados, benefício ao qual ele já tinha direito como aposentado por tempo de serviço.
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Cassação pode manter aposentadoria
O diretor-geral da Câmara, Sérgio Sampaio, disse acreditar que, na hipótese de a junta médica confirmar que se justifica a aposentadoria por invalidez, Genoino poderá manter o benefício mesmo que posteriormente venha a ter o mandato cassado – o STF já decidiu que, no caso de parlamentares condenados, caberá à Câmara somente decretar a perda do mandato.
O diretor-geral da Câmara, Sérgio Sampaio, disse acreditar que, na hipótese de a junta médica confirmar que se justifica a aposentadoria por invalidez, Genoino poderá manter o benefício mesmo que posteriormente venha a ter o mandato cassado – o STF já decidiu que, no caso de parlamentares condenados, caberá à Câmara somente decretar a perda do mandato.
Como Genoino apresentou o pedido de aposentadoria por invalidez antes de uma eventual cassação, a Diretoria-Geral da Casa entende que ele terá condições de manter o benefício, desde que a doença seja confirmada pelos médicos. Mas Sampaio ressalvou que a Casa terá de analisar o assunto posteriormente, no momento em que for publicado o acórdão definitivo do julgamento do mensalão.
"Acredito que ele [Genoino] tenha o direito [a manter a aposentadoria]. O fato de ter dado entrada antes [da conclusão do processo], acho que irá prevalecer a aposentadoria", avaliou o diretor-geral.
Nesta quinta (12), procuradora-geral da República em exercício, Helenita Acioli, afirmou que estuda pedido para impedir que o deputado José Genoino obtenha aposentadoria por invalidez
“Ele não pode, quando está para ser punido, pedir aposentadoria”, disse Acioly. “A pessoa não foi cassada, mas se ela foi condenada, como ela vai pedir essa aposentadoria?”
Indagado pelo G1 sobre a decisão do Ministério Público, o advogado de Genoino, Luiz Fernando Pacheco, ironizou a intenção da procuradora-geral em exercício. Na avaliação do defensor, cabe apenas aos médicos da Câmara a avaliação sobre o estado de saúde do parlamentar.
"O pedido é lastreado na opinião de médicos que estão cuidando da saúde do deputado [Genoino]. Pelo que sei, a procuradora não é medica", disse.
Por conta da cirurgia no coração, Genoino está afastado temporariamente da Câmara sob licença médica. O afastamento se encerraria na próxima quarta (18), no entanto, a assessoria de imprensa da Casa informou que o benefício deverá ser estendido por orientação da junta médica que está avaliando o processo de aposentadoria.
Ainda de acordo com os assessores do Legislativo, não há previsão de quanto tempo mais ele ficará em licença médica.
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