segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Precisamos amar mais...

O que faria Maquiavel se estivesse no Acre?


Os nobres vendo que não resistirão ao povo, escolhem um cidadão do povo, aumentam-lhe o prestígio e o fazem Príncipe.              Para com isso, sob sua sombra, satisfazerem os próprios apetites” (Maquiavel).

               Ufa! Essa viagem pelo túnel do tempo foi cansativa, mas, enfim, cheguei ao Acre - terra dos coronéis de barranco, dos fazendeiros e dos caudilhos políticos. Nossa!!! Estou na última década do século XX e é época de eleições. Essa é a minha chance, vou candidatar-me. Mostrarei ao Lourenço de Médicis o que ele deveria ter feito com a pobre Itália do século XVI. Eu, Maquiavel, tornar-me-ei O PRÍNCIPE.

            As coisas por aqui não vão bem. O Acre em 1998, mais parece a minha Itália de 1500 - dividida e inundada de crimes e corrupção. O “clero” e a “nobreza” parecem não convencerem mais o povo. Além do mais, no Acre tudo está por fazer. Nessas condições, não terei dificuldades para chegar à "Casa Cor-de-Rosa", pois os homens mudam de senhor com prazer, se bem fizermos acreditarem que terão melhorias.

            Em se tratando de política, já sou “macaco velho”, sei que os grandes caminham por estradas batidas por outros. Vou unir, numa só coligação, a “oposição” e os burgueses dissidentes, será um "show de democracia". O resto é puro marketing, é prometer o que o povo quer ouvir: 40 mil empregos, saúde de primeiro mundo, educação para todos, etc.

Foi fácil ganhar, agora sou o Príncipe do Acre. Tenho que tomar medidas urgentes para me manter no poder. Primeiro, devo eliminar os herdeiros do antigo regime. Para isso, farei uma grande campanha difamatória, afirmando que todos os meus inimigos pertencem ao grupo de extermínio e ao narcotráfico. Que são pessoas malvadas, oportunistas, corruptas, falsas e que não merecem o respeito dos acreanos. Depois, perseguirei os que não me apoiaram, fechando “portas”, cortando privilégios, retirando gratificações e vigiando o cumprimento dos horários. Devo aproveitar o início do meu reinado, já que, as injúrias sempre devem ser feitas de uma só vez, para que cicatrizem logo. Meu desejo é ser temido e não odiado.

Outra coisa que devo fazer é colocar os “pingos nos Is” em relação aos meus aliados. Fui eleito com o apoio de mais de dez partidos, no entanto, isso não significa que irei me condicionar a qualquer espécie de Conselho Político. No máximo, podem me aconselhar. Eu, porém, sou quem delibero, sozinho e como achar melhor. O PRÍNCIPE não pode ser governado por ninguém.  Pelo contrário, precisa ter sob seu controle os quatro poderes: o executivo, o legislativo, o judiciário e os meio de comunicação.

Talvez dirão: Vossa Excelência não era um democrata antes das eleições? Responderia: há quinhentos anos eu também era um republicano, no entanto, quando os Médicis reassumiram o poder em Florença, tornei-me um fervoroso defensor do Absolutismo. Em política não há ética, só há a sede pelo poder! Na política, não se pensa em ajudar as pessoas, mas em como se assenhorear dos “espaços de mando”. Para conservar a minha coroa, faço qualquer coisa: prometo o que nunca vou cumprir, finjo acreditar na democracia, faço aliança com os empresários ao mesmo tempo em que discurso a favor dos trabalhadores. Penhoro a floresta acreana para o BID ao mesmo tempo em que defendo a balela de um Tal Desenvolvimento Sustentável. Viro defensor das reformas, pratico o assistencialismo e até ando de mãos dadas com antigos inimigos. A glória provém da vitória e não do modo como a obtemos.

O Príncipe que desejar permanecer no trono, precisa fomentar o espírito cívico e construir uma identidade coletiva em seus liderados. Por isso, contratarei uma “penca” de historiadores profissionais para reescrever a história dessa pacata região, de modo que vejam que eu sou a continuidade de um passado glorioso, de um passado “revolucionário”. Organizarei “centenárias” comemorações, reconstruirei prédios, lançarei livros, trarei artistas da Globo, etc. O povo precisa conhecer o próprio passado, cultuar os seus heróis e reverenciar as autoridades, pois é no passado e nas tradições que se apagam os desejos e os motivos para as mudanças.

Escrevi uma frase há alguns anos que até hoje é observada: “É muito vantajoso para um príncipe mostrar uma excelente imagem de si próprio”. Afinal de contas, contra quem tem boa reputação é difícil conspirar. Quando se é respeitado e amado pelo povo, não se deve temer as eleições, a vitória é garantida. Daí a importância que dou a minha imagem pessoal, o povo se preocupa muito com a aparência das coisas. Nas TV, minhas ações e palavras devem mostrar que sou cheio de piedade, fé, integridade, humanidade e religião. Mas, para isso, se é necessário controlar a imprensa e gastar alguns milhões com marketing político. Ações consideradas normais quando se é um Príncipe.

...Já fazem muitos anos que governo essas terras, estou cansado de tanto marasmo, minha intenção agora é ir para Brasília, a fim de aumentar minha influência e expandir meu território. Entretanto, para que isso aconteça, preciso deixar herdeiros por aqui, vassalos capazes, inteligentes e acima de tudo obedientes. Minha intenção é administrar o Acre à distância. Quanto à população, agradá-la-ei com grandes empreendimentos em fins de mandato, pois, nada traz mais estima a um príncipe do que construir grandes obras.

Que barulho é esse? Quem é você? – Eu sou Karl Marx, tenho analisado o seu reinado e percebo que está perto do fim. O poder político continua sendo organizado por uma classe, para oprimir outra. O governo “moderno”, como na época do Manifesto que escrevi, não passa de um comitê para gerir os negócios de uma minoria. O desenvolvimento anunciado, não é o mesmo vivido pela população. Os que trabalham não lucram; e os que lucram não trabalham. As condições materiais de vida são similares as de antes. O Acre ainda não passou de sua pré-história! O motor da história não para, o Acre virtual deve ser superado. Acreanos de toda Rio Branco uní-vos!


-          Ei barbudo, o que você está querendo dizer com isso? Sai pra lá! Xô Satanás!!!

*Eduardo de Araújo Carneiro, artigo publicado em 2004.


O PT não moveu uma "palha" para as reformas políticas, pelo contrário, a "PUTARIA" na política brasileira continua. Dinheiro público na cueca é o de menos. FORA PT! Agora é a vez do POVO!


Lei de Reforma do Congresso (emenda da Constituição do Brasil)


8. Pena de Morte para os políticos que comprovadamente praticarem alguma forma de corrupção...kkkkkkkkk ... guilhotina neles!!!! Aí pensarião duas vezes antes de se aproveitarem do cargo público para enriquecerem a si e/ou a outros.

"Existem duas opções na vida: Se resignar ou se indignar, e eu, não vou me resignar, nunca" Darcy Ribeiro

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

PARA OS PARLAMENTARES BRASILEIROS LARGAREM a PRATICA DA CORRUPÇÃO LEGALIZADA

Lei de Reforma do Congresso de 2012 (emenda da Constituição do Brasil):

1. O congressista receberá salário somente durante o mandato. E não terá direito à aposentadoria diferenciada em decorrência do mandato.

2. O Congresso contribui para o INSS. Todo o fundo (passado, presente e futuro) atual no fundo de aposentadoria do Congresso passará para o
regime do INSS imediatamente. O Congressista participa dos benefícios dentro do regime do INSS exatamente como todos os outros brasileiros. O fundo de aposentadoria não pode ser usado para qualquer outra finalidade.

3. O congressista deve pagar para seu plano de aposentadoria, assim como todos os brasileiros.

4. O Congresso deixa de votar seu próprio aumento de salário, que será objeto de plebiscito.

5. O congressista perde seu seguro atual de saúde e participa do mesmo sistema de saúde como o povo brasileiro.

6. O congressista está sujeito às mesmas leis que o povo brasileiro.

7. Servir no Congresso é uma honra, não uma carreira. Parlamentares devem servir os seus termos (não mais de 2), depois ir para casa e procurar emprego. Ex-congressista não pode ser um lobista.

8. Todos os votos serão obrigatoriamente abertos, permitindo que os eleitores fiscalizem o real desempenho dos congressistas.

A hora para esta emenda na Constituição é AGORA.

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Raízes históricas da teologia da prosperidade

Alderi Souza de Matos

O evangelicalismo brasileiro apresenta características apreciáveis e preocupantes. Entre estas últimas está o gosto por novidades. Líderes e fiéis sentem que, para manter o interesse pelas coisas de Deus, é preciso que de tempos em tempos surja um ensino novo, uma nova ênfase ou experiência. Geralmente tais inovações têm sua origem nos Estados Unidos. Assim como outros países, o Brasil é um importador e consumidor de bens materiais e culturais norte-americanos. Isso ocorre também na área religiosa. Um movimento de origem americana que tem tido enorme receptividade no meio evangélico brasileiro desde os anos 80 é a chamada teologia da prosperidade. Também é conhecida como “confissão positiva”, “palavra da fé”, “movimento da fé” e “evangelho da saúde e da prosperidade”. A história das origens desse ensino revela aspectos questionáveis que devem servir de alerta para os que estão fascinados com ele.

Ao contrário do que muitos imaginam, as idéias básicas da confissão positiva não surgiram no pentecostalismo, e sim em algumas seitas sincréticas da Nova Inglaterra, no início do século 20. Todavia, por causa de algumas afinidades com a cosmovisão pentecostal, como a crença em profecias, revelações e visões, foi em círculos pentecostais e carismáticos que a confissão positiva teve maior acolhida, tanto nos Estados Unidos como no Brasil. A história de seus dois grandes paladinos irá elucidar as raízes dessa teologia popular e mostrar por que ela é danosa para a integridade do evangelho.

Essek W. Kenyon, o pioneiro
Embora os adeptos da teologia da prosperidade considerem Kenneth Hagin o pai desse movimento, pesquisas cuidadosas feitas por vários estudiosos, como D. R. McConnell, demonstraram conclusivamente que o verdadeiro originador da confissão positiva foi Essek William Kenyon (1867-1948). Esse evangelista de origem metodista nasceu no condado de Saratoga, Estado de Nova York, e se converteu na adolescência. Em 1892 mudou-se para Boston, onde estudou no Emerson College, conhecido por ser um centro do chamado movimento “transcendental” ou “metafísico”, que deu origem a várias seitas de orientação duvidosa. Uma das influências recebidas e reconhecidas por Kenyon nessa época foi a de Mary Baker Eddy, fundadora da Ciência Cristã.

Kenyon iniciou o Instituto Bíblico Betel, que dirigiu até 1923. Transferiu-se então para a Califórnia, onde fez inúmeras campanhas evangelísticas. Pregou diversas vezes no célebre Templo Angelus, em Los Angeles, da evangelista Aimee Semple McPherson, fundadora da Igreja do Evangelho Quadrangular. Pastoreou igrejas batistas independentes em Pasadena e Seattle e foi um pioneiro do evangelismo pelo rádio, com sua “Igreja do Ar”. As transcrições gravadas de seus programas serviram de base para muitos de seus escritos. Cunhou muitas expressões populares do movimento da fé, como “O que eu confesso, eu possuo”. Antes de morrer, em 1948, encarregou a filha Ruth de dar continuidade ao seu ministério e publicar seus escritos.

Quais eram as crenças dos tais grupos metafísicos? Eles ensinavam que a verdadeira realidade está além do âmbito físico. A esfera do espírito não só é superior ao mundo físico, mas controla cada um dos seus aspectos. Mais ainda, a mente humana pode controlar a esfera espiritual. Portanto, o ser humano tem a capacidade inata de controlar o mundo material por meio de sua influência sobre o espiritual, principalmente no que diz respeito à cura de enfermidades. Kenyon acreditava que essas idéias não somente eram compatíveis com o cristianismo, mas podiam aperfeiçoar a espiritualidade cristã tradicional. Mediante o uso correto da mente, o crente poderia reivindicar os plenos benefícios da salvação.

Kenneth Hagin, o divulgador
O grande divulgador dos ensinos de Kenyon, a ponto de ser considerado o pai do movimento da fé, foi Kenneth Erwin Hagin (1917-2003). Ele nasceu em McKinney, Texas, com um sério problema cardíaco. Teve uma infância difícil, principalmente depois dos 6 anos, quando o pai abandonou a família. Pouco antes de completar 16 anos sua saúde piorou e ele ficou confinado a uma cama. Teve então algumas experiências marcantes. Após três visitas ao inferno e ao céu, converteu-se a Cristo. Refletindo sobre Marcos 11.23-24, chegou à conclusão de que era necessário crer, declarar verbalmente a fé e agir como se já tivesse recebido a bênção (“creia no seu coração, decrete com a boca e será seu”). Pouco depois, obteve a cura de sua enfermidade.

Em 1934 Hagin começou seu ministério como pregador batista e três anos depois se associou aos pentecostais. Recebeu o batismo com o Espírito Santo e falou em línguas. No mesmo ano foi licenciado como pastor das Assembléias de Deus e pastoreou várias igrejas no Texas. Em 1949 começou a envolver-se com pregadores independentes de cura divina e em 1962 fundou seu próprio ministério. Finalmente, em 1966 fez da cidade de Tulsa, em Oklahoma, a sede de suas atividades. Ao longo dos anos, o Seminário Radiofônico da Fé, a Escola Bíblica por Correspondência Rhema, o Centro de Treinamento Bíblico Rhema e a revista “Word of Faith” (Palavra da Fé) alcançaram um imenso número de pessoas. Outros recursos utilizados foram fitas cassete e mais de cem livros e panfletos.

Hagin dizia ter recebido a unção divina para ser mestre e profeta. Em seu fascínio pelo sobrenatural, alegou ter tido oito visões de Jesus Cristo nos anos 50, bem como diversas outras experiências fora do corpo. Segundo ele, seus ensinos lhe foram transmitidos diretamente pelo próprio Deus mediante revelações especiais. Todavia, ficou comprovado posteriormente que ele se inspirou grandemente em Kenyon, a ponto de copiar, quase palavra por palavra, livros inteiros desse antecessor. Em uma tese de mestrado na Universidade Oral Roberts, D. R. McConnell demonstrou que muito do que Hagin afirmou ter recebido de Deus não passava de plágio dos escritos de Kenyon. A explicação bastante suspeita dada por Hagin é que o Espírito Santo havia revelado as mesmas coisas aos dois.

Reflexos no Brasil
Os ensinos de Hagin influenciaram um grande número de pregadores norte-americanos, a começar de Kenneth Copeland, seu herdeiro presuntivo. Outros seguidores seus foram Benny Hinn, Frederick Price, John Avanzini, Robert Tilton, Marilyn Hickey, Charles Capps, Hobart Freeman, Jerry Savelle e Paul (David) Yonggi Cho, entre outros. Em 1979, Doyle Harrison, genro de Hagin, fundou a Convenção Internacional de Igrejas e Ministros da Fé, uma virtual denominação. Nos anos 80, os ensinos da confissão positiva e do evangelho da prosperidade chegaram ao Brasil. Um dos primeiros a difundi-lo foi Rex Humbard. Marilyn Hickey, John Avanzini e Benny Hinn participaram de conferências promovidas pela Associação de Homens de Negócios do Evangelho Pleno (Adhonep). Outros visitantes foram Robert Tilton e Dave Robertson.

Entre as primeiras manifestações do movimento estavam a Igreja do Verbo da Vida e o Seminário Verbo da Vida (Guarulhos), a Comunidade Rema (Morro Grande) e a Igreja Verbo Vivo (Belo Horizonte). Alguns líderes que abraçaram essa teologia foram Jorge Tadeu, das Igrejas Maná (Portugal); Cássio Colombo (“tio Cássio”), do Ministério Cristo Salva, em São Paulo; o “apóstolo” Miguel Ângelo da Silva Ferreira, da Igreja Evangélica Cristo Vive, no Rio de Janeiro, e R. R. Soares, responsável pela publicação da maior parte dos livros de Hagin no Brasil. Talvez a figura mais destacada dos primeiros tempos tenha sido a pastora Valnice Milhomens, líder do Ministério Palavra da Fé, que conheceu os ensinos da confissão positiva na África do Sul. As igrejas brasileiras sofreram o impacto de uma avalanche de livros, fitas e apostilas sobre confissão positiva. Ricardo Gondim observou em 1993: “Com livros extremamente simples, [Hagin] conseguiu influenciar os rumos da igreja no Brasil mais do que qualquer outro líder religioso nos últimos tempos”.

Conclusão
Além de apresentar ensinos questionáveis sobre a fé, a oração e as prioridades da vida cristã, e de relativizar a importância das Escrituras por meio de novas revelações, a teologia da prosperidade, através dos escritos de seus expoentes, apresenta outras ênfases preocupantes no seu entendimento de Deus, de Jesus Cristo, do ser humano e da salvação. A partir dos anos 80, várias denominações pentecostais norte-americanas se posicionaram oficialmente contra os excessos desse movimento (Assembléias de Deus, Evangelho Quadrangular e Igreja de Deus). Autores como Charles Farah, Gordon Fee, D. R. McConnell e Hank Hanegraaff, todos simpatizantes do movimento carismático, escreveram obras contestando a confissão positiva e suas implicações. Eles destacaram como, embora essa teologia pareça uma maneira empolgante de encarar a Bíblia, ela se distancia em pontos cruciais da fé cristã histórica.

No Brasil, três obras significativas publicadas em 1993 -- “O Evangelho da Prosperidade”, de Alan B. Pieratt; “O Evangelho da Nova Era”, de Ricardo Gondim; e “Supercrentes”, de Paulo Romeiro -- alertaram solenemente as igrejas evangélicas para esses perigos. Tristemente, vários grupos, principalmente os que têm maior visibilidade na mídia, estão cada vez mais comprometidos com essa teologia desconhecida da maior parte da história da igreja. Ao defenderem e legitimarem os valores da sociedade secular (riqueza, poder e sucesso), e ao oferecerem às pessoas o que elas ambicionam, e não o que realmente necessitam aos olhos de Deus, tais igrejas crescem de maneira impressionante, mas perdem grande oportunidade de produzir um impacto salutar e transformador na sociedade brasileira.


Alderi Souza de Matos é doutor em história da igreja pela Universidade de Boston e historiador oficial da Igreja Presbiteriana do Brasil. É autor de A Caminhada Cristã na História e "Os Pioneiros Presbiterianos do Brasil".
asdm@mackenzie.com.br

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

O PT e os Evangélicos no Acre


"Como é possível a esse pequeno bando dobrar a vontade da maioria? [...] Parece que uma resposta óbvia a essa pergunta seria que a minoria, a classe dominante atual, possui as escolas, a imprensa e, geralmente, também a Igreja, sob seu poderio. Isto possibilita organizar e dominar as emoções das massas e torná-las instrumento da mesma minoria."
Esse trecho do discurso de Einstein revela muito bem o que outros autores como o francês marxista Althusser (Aparelhos Ideológicos de Estado) já afirmara: a religião é vista pelos grupos de poder como um instrumento de "massa de manobra". 

Como as Igrejas Evangélicas de modo geral, e as ditas "neopentencostais" em particular, são as que mais crescem no Acre atualmente (site: IBGE), a liderança PTista assumiu uma postura pró-ativa na busca de "dialogar" com pastores, apóstolos, bispos, missionários, etc. Pois estes, na visão dos estrategistas políticos, poderão "influenciar" a opinião do rebanho na hora do voto nas próximas eleições. Não é em vão que vários deles foram HOMENAGEADOS com a "Ordem da estrela do Acre" em janeiro no início desse ano.  

Antes, o diálogo com os cristãos acontecia com uma ala da Igreja Católica defensora da Teologia da Libertação, que havia aderido abertamente certos princípios marxistas. Há tempos atrás,  os evangélicos assumiam uma posição de resistência ao marxismo. O diálogo era delicado pois a liderança evangélica além de serem mais consagradas, estavam mais desprendidas dos interesses materiais e não havia neles interesse pela política.  
Atualmente coincidiu o apelo que os "evangélicos neopentencostais" fazem à $prosperidade$ com os interesses políticos de uma esquerda política "pró-capitalismo". Os líderes dos trabalhadores hoje não leêm Marx, pois o objetivo não mais é mais a "igualdade e a justiça social" e sim o apoderamento da máquina pública como parasitas.  
E para se fixarem onde a gestão do erário público é certa, vale tudo!!!! Até benção de pastores e de dito apóstolos que, conscientemente ou não, contribuem para a reprodução de um sistema sócio-econômico que tem se demonstrado mais letal do que uma guerra. As conseqüências humanas dele podem ser vistas claramente na periferia urbana.  
Mas vivemos num tempo onde o cristianismo virou comércio e as igrejas currais eleitorais. Difícil é encontrar uma igreja evangélica com certa quantidade de membros que não tenha "adotado" um candidato ao parlamento. Vemos até pastores largando o ministério religioso para se dedicarem à política. 

A união de um "marxismo light" com um cristianismo contaminado por Mamon é fruto da perda das ideologias tão debatida pelas teorias pós-modernas. O certo é que hoje tudo é válido!!! Corrupção tem benção de pastores e Igrejas Evangélicas são erguidas com dinheiro "doado" por políticos. 
Para os políticos de profissão, seja de qual partido for, as igrejas não passam de uma instituição capaz de influenciar pessoas e que, por isso, para o bem ou o mal dos grupos de poder, devem ter respectivas demandas "ouvidas". 
Todos sabem que mundialmente falando os Partidos de Esquerda estão fundamentados em princípios marxistas - das escolas de base ao estatuto . E mesmo um leigo no assunto sabe que o marxismo é baseado no ateísmo. Poderá um cristão ser ao mesmo tempo seguidor de Jesus "o cristo" e defender princípios marxistas? O "mundo comunista" idealizado por Karl Marx não tinha espaço para a religião.
Mas o que importa? O importante é qie o cristão, individualmente falando, esteja bem, ou seja, $PROSPERANDO$. Pois não é de forma inocente que se deixam "enamorar" pelo PTISMO. Ou têm cargos políticos e estão "segurando-os" ou estão à procura de um para si ou para familiares. É o FIM DOS TEMPOS!!!! Fim do Marxismo de Marx e do Cristianismo de Jesus. O homem para se dar bem é capaz de tudo!!!!!

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Prometeu, Pandora e o Desenvolvimentismo

Prometeu, Pandora e o Desenvolvimentismo[1]



Israel Souza[2]
Prometeu[3] rouba fogo do Olimpo e entrega ao homem. Um ato heróico de trágico fim. Através dessa narrativa mítica, os gregos explicavam o surgimento da tecnologia e da civilização - simbolizadas pelo fogo -, aquilo que permitiria ao homem poder e liberdade frente às forças divino-naturais[4].


Irado com Prometeu, Zeus, o “tirano do Olimpo”, o condenou a ficar acorrentado a um rochedo, “pelos tempos a fora”. Ali, todo dia, uma ave de rapina lhe vinha devorar o fígado.

Prometeu: aristocrático ou revolucionário?

À sua maneira, genial e reacionária, Nietzsche via na sorte de Prometeu a “justificação do mal humano”. Para ele, “o abutre que devora o fígado do fautor prometéico da cultura” revela uma inarredável contradição. O que possibilitaria ao homem gozar da liberdade também impunha a ele uma realidade de privação e escravidão. Em suas palavras: “a escravidão entra na essência da civilização”.
Mas, como lembra Domenico Losurdo em Nietzsche: o rebelde aristocrata: biografia intelectual e balanço crítico (obra de largo fôlego e erudição sem par, no Brasil, sobre o pensamento do filósofo alemão), essa maldição pesaria de modo diferenciado sobre os sujeitos: “a desventura dos homens que vivem de trabalho e de privação deve ser ainda aumentada, para tornar possível que um restrito número de homens olímpicos produzam o mundo da arte” (NIETZSCHE citado em LOSURDO: 2009, 60).
Mesmo sabendo do caráter inexorável da tragédia como entendida pelos gregos, não resta dúvida de que a leitura algo fatalista que o pensador alemão empreende do Mito de Prometeu é motivada pelo combate que ele move contra as classes subalternas. A exemplo de outros autores contemporâneos seus, também o filósofo do “eterno retorno” entendia que o que motivava a insurreição “dos de baixo” era o otimismo e a esperança na construção de um mundo justo. Por isso, ao otimismo e à esperança dos “escravos” ele contrapunha a “visão trágica do mundo” e o “pessimismo alemão”.
É sobejamente sabido que a tragédia representa a impotência das vontades (quer dos homens, quer dos deuses) ante a onipotência do destino. Este segue inexoravelmente. Lembremos de Édipo, clássica obra de Sófocles. Pode-se argumentar que isso era já o suficiente para sustentar a leitura fatalista de Nietzsche, filólogo-filósofo profundo conhecedor da Antiguidade e da tragédia grega (ver seu livro primeiro: O nascimento da tragédia). Mas importa destacar a tensão entre opressão e liberdade, resignação e esperança latente e patente na tragédia esquiliana.
De um lado, quando o Coro pergunta a Prometeu se “Virá, um dia, o termo de teus males?”, este responde: “Nenhum fim, senão o que ele quiser”. De outro, quando perguntando por Io se Zeus “perderia seu império”, ele afirma, de maneira enfática, “Ele perdê-lo-á, fica certa”, e sua queda “será a mais rápida e mais vergonhosa”. Dentre outras coisas, isso quer dizer que submetimento a um “destino inexorável” não significa submetimento ao despotismo e à tirania. Ignorar ou tentar subverter isso apenas mostra a fidelidade de Nietzsche a seu aristocratismo. Todavia, não faz jus ao caráter “aberto” que o espírito de Ésquilo imprimiu a Prometeu acorrentado. Previdente, não foi sem razão que o “benfeitor da humanidade” predisse o fim do império de Zeus e deu aos homens “uma esperança infinita no futuro”.
Vê-se, dessa forma, que não era sem causa a interpretação de Nietzsche, coisa de pura erudição filológica apenas. Afinal, como ressalta Jonh Bellamy Foster, Prometeu era o “maior herói cultural de todo o período romântico”. Na cultura ocidental, o semideus “representa não só a tecnologia, mas, ainda mais, a criatividade, a revolução e a revolta contra os deuses (contra a religião)” (FOSTER: 1999, 163). Dado o caráter subversivo e plebeu do mito prometéico, o “rebelde aristocrata” - para usar a feliz expressão de Losurdo - entendeu que era preciso esvaziá-lo de seu conteúdo revolucionário, transformando-o em seu contrário. Não a expressão da liberdade, mas da escravidão. Não a esperança, mas a resignação.

O verdadeiro prometeísmo de Marx

Mais recentemente, mostrando-se insofismável e ameaçador o poder destrutivo das forças produtivas no capitalismo, o mito de Prometeu ganhou outra interpretação. Para muitos que defendem a causa ambiental, a figura do semideus - porque vinculada à tecnologia - expressa uma apologia ao produtivismo, isto é, a persecução da “produção pela produção”, independentemente dos custos ambiental e social.
Alguns defensores da causa ambiental (“os verdes”), vendo em Marx e no marxismo a defesa de tal prometeísmo, distanciam-se das forças que lutam pelo socialismo (“os vermelhos”) ou declaram-lhes guerra sem trégua. Outros permanecem vinculados a essa tradição. São os chamados ecossocialistas (“verdes-vermelhos” ou “vermelhos-verdes”). Formam um movimento bastante diverso, plástico o suficiente para abarcar desde os “moderados” e “reformistas” à esquerda mais radical. Grosso modo, procuram conjugar a luta pelo socialismo com a defesa da causa ambiental.
Há, em meio a eles, quem faça uma leitura deveras cuidadosa da obra de Marx, a fim de julgar e aproveitar o que ela pode dar de sustentação ao pensamento e à luta ecológicos. Destacam-se, entre estes, Michael Löwy (Ecologia e socialismo), Jonh Bellamy Foster (A ecologia de Marx: materialismo e natureza), Elmar Altvater (Existe uma marxismo ecológico?), apenas para citar alguns. Há outros, entretanto, que entendem os fundadores do materialismo histórico como “adoradores da máquina”, apologetas do produtivismo e do domínio do homem sobre a natureza.
Em perspectiva assim, Marx e muitos de seus seguidores bem teriam compreendido as nefastas implicações que o capitalismo teria para a questão social. Porém, o mesmo não ocorrera em relação à questão ambiental, completamente ignorada ou submetida à visão “prometéica” que subjaz ao materialismo histórico. Prometeu - e Marx com ele - é, sob esse prisma, convertido em uma ameaça à liberdade, à natureza e à vida em geral.
Todavia, Foster advoga que, na obra de Marx, “Prometeu é invocado com mais freqüência como símbolo de revolução que de tecnologia” (FOSTER: 1999, 163). Em verdade, o pai do materialismo histórico sempre entendeu o mito de Prometeu numa perspectiva libertária, como eternizada na pungente e refinada poesia de Ésquilo (Prometeu acorrentado).
Citando Ellen M. Wood, Foster lembra que, para Ésquilo, o semideus “é a personificação da oposição ateniense à servidão e às leis arbitrárias, ao resistir à tirania de Zeus e escarnecer do servilismo de Hermes, o mensageiro dos deuses” (FOSTER: 1999, 163).

Fique certo de que não trocaria
A minha triste sina pela tua servidão.
Antes ser servo desta rocha
Do que fiel servidor de Zeus.

Isto disse Prometeu a Hermes na tragédia de Ésquilo. O que é louvado na versão que o referido trágico dá ao mito, prossegue outra vez Foster nos passos de Ellen M. Wood,

não é a tecnologia (...), mas a dádiva ao homem do trabalho, do artesanato e da criatividade - as artes práticas que sustentavam a democracia. Tão fundamental era o mito de Prometeu para a Atenas antiga que a oposição de classe entre cidadãos trabalhadores e seus adversários aristocráticos pode ser vista nos tratamentos radicalmente diferentes dados ao mito, conforme apresentados respectivamente pelo Prometeu acorrentado e o uso do mesmo mito por Platão na República. Compreendendo o caráter de classe revolucionário desse conflito na antiguidade, Marx identificou-se claramente com o Prometeu de Ésquilo, e não com o de Platão (WOOD citada em FOSTER: 1999, 163).

Na perspectiva marxiana, não há naquela narrativa nenhuma idolatrização do fogo. O fogo não é um fim em si mesmo. Ele é, apenas, o meio, um instrumento através do qual o homem alcançaria liberdade ante as forças divino-naturais. Não caberia, por conseguinte, extrair dali uma interpretação do tipo “produção pela produção”, do “acúmulo infinito” como sugere o “desenvolvimentismo” atualmente em voga.

Desenvolvimentismo, nova caixa pandoriana

Herdeiro e versão atualizada do “mito do progresso”, do “processo civilizatório” e da “modernização”, o “desenvolvimentismo” é hoje colado à figura de Prometeu. Em parte, porque promete domínio sobre a natureza, a superação das privações, a liberdade. E em parte, porque a maneira com que ele se concretiza - supostamente na busca de tais fins - tem em verdade resultado em algo bastante diverso do que se anuncia, colocando sob ameaça a vida no planeta.
Não sem uma peculiar mistura de alarmismo e superficialidade, ambientalistas, cientistas e, sobretudo, a mídia têm continuamente alertado sobre isso[5]. No entanto, diversamente do que sugerem as interpretações hegemônicas, o “desenvolvimentismo” - de suas versões “industriosa” e “modernizadora” à do “desenvolvimento sustentável” - é mais próximo do Mito da caixa de Pandora[6] que do de Prometeu.
Como se sabe, no universo da mitologia grega, o Mito de Pandora é colocado em linha de continuidade (e de descontinuidade) com o de Prometeu. Os deuses deram uma caixa a Pandora, caixa cheia de males. Abrindo-a, Pandora permitiu que os males fugissem, restando ali guardada apenas a esperança. Isso resultou em castigo e re-submetimento do homem.


Sem dar azo a certo entendimento machista a que se pode prestar o mito, não é arbitrário interpretar Pandora como um anti-Prometeu. A caixa pandoriana é a antítese do fogo prometéico. Enquanto este, numa perspectiva plebéia e libertária, visava à emancipação, aquela visava à desemancipação.
Outrossim, não é arbitrário dizer que o “desenvolvimentismo” representa a mais completa negação dos elementos libertários do mito prometéico. Em certo sentido, o “desenvolvimentismo” é verdadeiramente um “presente de grego”, com o qual os países centrais presentearam os periféricos. Como da caixa do mito, muitos são os males dele saídos. Como a caixa no relato mítico exerce poder de encanto, assim também o “desenvolvimentismo” na história mundial recente, apesar de décadas de fracassos e frustrações sem conta.
Contudo, não se trata do encanto (admiração, espanto) de que, segundo Aristóteles, nascia o pensar filosófico. Trata-se de um encanto fetichista que põe em prejuízo a reflexão crítica. O que faz do “desenvolvimento” um “mito” ou uma “ilusão” (WALLERSTEIN, 2006). Em virtude disso, o “desenvolvimento” transformou-se, ao lado da democracia, numa ideia-força a que a quase totalidade dos governos e das forças políticas - convictamente ou não - dizem perseguir.

Da “destruição produtiva” à “produção destrutiva”

O perigo que disso deriva é enorme. Isto porque a “sociedade burguesa” assemelha-se ao “feiticeiro que já não pode controlar as potências infernais que pôs em movimento” (MARX e ENGELS: 2006, 90). Hoje, mais que ao tempo em que foi formulada (1848), essa assertiva de Marx e Engels se mostra verdadeira, atual e apocalipticamente ameaçadora.
A burguesia “criou forças produtivas mais numerosas e mais colossais que todas as gerações passadas em conjunto” (MARX e ENGELS: 2006, 89). Ainda que não para todos, em seu período de ascendência histórica, o poder de produção do capital pôde ser traduzido “em potencialidade emancipadora” (MÉSZÁROS: 2006, 254). “No entanto”, faz notar Mészáros,

como esse progresso teria de ocorrer de forma alienada, sob o domínio de uma objetividade reificada - o capital - (...), o intercâmbio reprodutivo entre a humanidade e a natureza teve de se transformar no oposto (MÉSZÁROS: 2006, 254).
Desse modo, estimulada e apropriada para o acúmulo de capital, a contínua revolução a que estão submetidas as forças produtivas na sociedade burguesa trouxe-nos, por assim escrever, a uma espécie de “ponto de mutação”. Ou, para dizer com Mészáros (2006: 267), “passamos da prática de ‘destruição produtiva’ da reprodução do capital para uma fase em que o aspecto predominante é o da produção destrutiva cada vez maior e mais irremediável” (destaques do autor).
Com efeito, alerta ainda o autor supracitado, as circunstâncias de nosso tempo têm como marca a “absolutização do relativo” (o capital e seu imperativo de acúmulo) e a “relativização do absoluto” (a base natural da própria vida). Tais circunstâncias “são muito piores do que jogar roleta russa”. Elas encerram

a certeza absoluta (destaque do autor) da autodestruição humana no caso de o corrente processo de reprodução sociometabólico do capital não ser levado a um fim definitivo no futuro próximo, enquanto ainda houver tempo para tal (MÉSZÁROS: 2007, 28).

As “personificações do capital” certamente preferem seguir ganhando algum, ignorando ou subestimando a situação. Todavia, é um fato incontornável: perseguir (encantadamente) ou submeter-se (resignadamente) ao “desenvolvimentismo” é atentar contra a própria vida. Ou pode essa caixa de Pandora encerrar ainda alguma esperança? Os problemas ambientais e as guerras imperialistas, marcantes neste alvorecer de terceiro milênio, parecem não deixar margem a dúvida.

Mais que ciência e tecnologia

Culpa da “razão instrumental” e da tecnologia antiecológicas e inumanas, dirão alguns. E outra vez a culpa recai sobre os ombros do “benfeitor da humanidade”, como se fosse possível uma “razão pura”, sem “condicionamentos sociais”, um saber fruto de geração espontânea e auto-referido. Os críticos da tecnologia e da “razão instrumental” que assim procedem não são menos fetichistas em relação a elas do que seus adoradores. A estes é preciso retrucar, como Marx e Engels em a Ideologia alemã (2002: 24): “pesa uma maldição sobre o ‘espírito’, a de ser ‘maculado’ pela matéria” (destaques dos autores).
A bem da verdade,

a ciência e a tecnologia existentes estão profundamente incrustadas nas determinações que hoje prevalecem na produção, por meio das quais o capital impõe à sociedade as condições necessárias de sua existência instável (...). Em seu modo real de articulação e funcionamento, estão inteiramente implicadas num tipo de progresso simultaneamente produtivo e destrutivo (destaque do autor) (MÉSZÁROS, 2006, 265).

Malgrado nosso, “Esta condição não pode ser consertada separando-se o lado produtivo do lado destrutivo e seguir apenas o primeiro” (MÉSZÁROS, 2006, 265). Desse modo, é temerário atribuir à ciência e à tecnologia, isolando-as do contexto social em que são produzidas e apropriadas, a culpa pelo problema e a responsabilidade pela solução esperada e necessária. Nem Adão nem Cristo. Sozinhas, elas não geraram a queda (problema) e, da mesma maneira, sozinhas elas não serão capazes de trazer a redenção (solução).
Centrar toda a reflexão em questões como estas e na alegada “falta de consciência ambiental” é, no mínimo, ocioso. Dentre outras coisas, importa levar em conta o sistema, sua lógica destrutiva que a tudo submete ao imperativo da produção ampliada orientada para o lucro, deixando pouca margem a que se possa dar ao conhecimento em geral usos nobres; e as desigualdades entre as classes, nações e regiões, às quais ele (o sistema) alimenta e pelas quais ele é alimentado.
Em suma, os problemas que enfrentamos envolvem as forças produtivas, sim, mas também as relações de produção, relações de subordinação e exploração. Por enquanto, Pandora vence Prometeu. E usurpando o fogo que nos poderia elevar ao Olimpo, o capital - um deus ainda mais déspota que Zeus - mergulhou-nos no Hades. Acorrentou-nos, como fizeram ao herói símbolo da democracia ateniense. E, tal qual ave de rapina de indômita fome, é ele próprio que se alimenta de nossas vísceras.

Iconoclastia

Os sonhos de libertação são demasiado antigos. Tão antigos quanto a própria falta de liberdade. Bem vimos isso no mito prometéico, que remete ao início dos tempos. Ocorre que grande e perigoso é nosso inimigo, e o tempo urge. Como disse acertadamente o compositor brasileiro:

Nossos sonhos são os mesmos
Há muito tempo
Mas não há mais muito tempo
Pra sonhar (Humberto Gessinger)

Nesses dias em que o capital - o ídolo da morte - é idolatrado em sua versão “desenvolvimentista” e “sustentabilista”, a iconoclastia é irmã da vida. Por isso, a esperança que nos move é aquela que nasce e se alimenta dos sonhos e das lutas daqueles que são sacrificados em seu altar. Iconoclastia, sonhos de libertação, sonhos sonhados em cordão e de “olhos abertos” (Ernst Bloch).

Referências bibliográficas

ALTVATER, Elmar. Existe um marxismo ecológico? In BORON, Atílio A., AMADEO, Javier e GONZÁLEZ, Sabrina (orgs). A teoria marxista hoje: problemas e perspectivas. Buenos Aires: CLACSO; São Paulo: Expressão Popular, 2007.
BULFINCH, Thomas. O livro da mitologia: história de deuses e heróis. Martin Claret, 2006.
ÉSQUILO. Prometeu acorrentado. Martin Claret, 2010.
FOSTER, Jonh Bellamy. Marx e o meio ambiente. In WOOD, Ellen M., e FOSTER, Jonh Bellamy (orgs.). Em defesa da história: marxismo e pós-modernismo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1999.
FOSTER, John Bellamy. A ecologia de Marx: materialismo e natureza. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005.
HESÍODO. Teogonia; Trabalhos e dias. Martin Claret, 2010.
LOSURDO, Domenico. Nietzsche, o aristocrata rebelde: biografia intelectual e balanço crítico. Rio de Janeiro, Revan: 2009.
LÖWY, Michael. Ecologia e socialismo. São Paulo: Cortez, 2005.
MARX, Karl e ENGELS, Friedrich. Manifesto do Partido Comunista. São Paulo: Global Editora, 2006.
MÉSZÁROS, István. O poder da ideologia. São Paulo: Boitempo Editorial, 2004.
MÉSZÁROS, István. Para além do capital: rumo a uma teoria da transição. São Paulo: Boitempo Editorial, 2006.
MÉSZÁROS, István. O desafio e o fardo do tempo histórico: o socialismo no século XXI. São Paulo: Boitempo, 2007.
NIETZSCHE, Friedrich. O nascimento da tragédia. São Paulo: Editora Rideel, 2005.
WALLERSTEIN, Immanuel. Impensar a ciência social: os limites dos paradigmas do século XIX. São Paulo: Ideias &letras, 2006.



[1] Os mitos aqui tratados têm muitas versões, e são, como os outros, passíveis de interpretações várias. Dentre as versões, escolhemos uma e acrescentamos a ela um colorido particular. Ao leitor interessado em mais sobre o assunto, recomendamos Hesíodo (Teogonia; Trabalho e dias), Ésquilo (Prometeu acorrentado) e Thomas Bulfinch (O livro da mitologia: histórias de deuses e heróis). Para compreender o pensamento mítico grego, ainda são indispensáveis os clássicos atribuídos a Homero: Ilíada e Odisseia.
[2] Cientista Social, Membro do Núcleo de Pesquisa Estado, Sociedade e Desenvolvimento na Amazônia Ocidental (NUPESDAO) e do Movimento Anticapitalista Amazônico (MACA). Email: israelpolitica@gmail.com
[3] Pró: antes + manthánein: saber/ver = prudente ou previdente.
[4] Segundo Ésquilo, o fogo seria a “fonte de todas as artes”, de todo conhecimento, ciência, medicina, matemática, agricultura, indústria, etc.
[5] Entre as muitas frases que expressam este misto peculiar, destaca-se a que diz “Somos todos culpados pela ruína do planeta”. Com seu humor e refinamento de sempre, Eduardo Galeano (2006: 5-6) trata-a como uma das frases “que hacen crecer la nariz de Pinocho”. Todas as classes, grupos e nações agridem ao meio ambiente? Sim. Da mesma forma e na mesma magnitude? Não. Os níveis de consumo e exploração dos dominantes não encontram paralelo entre os subalternos. Ignorar ou encobrir esta responsabilidade “comum, porém, diferenciada” (ONU) é injustiça para com estes e favor servil para com aqueles. Partilha da mesma natureza mistificadora afirmações do tipo “o homem destrói a natureza”.
[6] Pan = todos + Dora: dons/presentes = “a que tem todos os dons”, “o presente de todos”.