terça-feira, 29 de julho de 2008

VESTIBULAR: Evolução Política do Acre III

Fonte:
http://www.scribd.com/doc/4253352/evolucao-politica-do-Acre-III-

VESTIBULAR: Evolução Política do Acre II

Fonte:
http://www.scribd.com/doc/4252516/Evolucao-politica-do-Acre-II

VESTIBULAR: Evolução Política do Acre I

Fonte:
http://www.scribd.com/doc/4251577/Evolucao-Politica-do-Acre-1

VESTIBULAR: Ditadura Militar no Brasil

Fonte:
http://www.scribd.com/doc/4250324/ditadura-prof-egina-carli

VESTIBULAR: O Islã (parte 1)

Fonte:
http://www.scribd.com/doc/4250004/idade-media-o-isla

VESTIBULAR: Dicas importantes

Fonte:

VESTIBULAR: Segunda Guerra Mundial

Fonte:
http://www.scribd.com/doc/4249412/Segunda-Guerra-Mundial-

VESTIBULAR: Povos Indígenas do Acre

Fonte:

VESTIBULAR: Reforma Protestante

Fonte:

VESTIBULAR: Primeiro ciclo da borracha - Ac.


FONTE:

quarta-feira, 23 de julho de 2008

RUI BARBOSA. O direito do Amazonas ao Acre Setentrional

A rara obra de Rui Barbosa agora está disponível ao público leitor do Blog. Como sabemos, o ilustríssimo autor discordou dos rumos dados pelo Barão de Rio Branco nas negociações sobre anexação do Acre ao Brasil com o governo boliviano. Motivo pelo qual não assinou o Tratado de Petrópolis em 1903. Essa importante obra, uma das muitas que a historiografia oficial fez questão de apagar da memória acreana, trás argumentos fortes em defesa do apoderamento das terras do então Território do Acre pelo Estado do Amazonas - ao todo são 351 páginas. Rui Barbosa era contra a autonomia acreana, por isso, foi e é até hoje interditado pela escrita oficial de nossa região.

PARA BAIXAR A OBRA COMPLETA ACESSE O LINK ABAIXO:

http://cid-daa5fcaa93b79f4d.skydrive.live.com/self.aspx/P%c3%bablico/Documentos%20da%20Hist%c3%b3ria%20do%20Acre/Rui%20Barbosa.%20O%20direito%20do%20Amazonas%20sobre%20o%20Acre%20Setentrional.pdf

sexta-feira, 18 de julho de 2008

José Guilherme de Araújo Jorge, o poeta que o Acre esqueceu

Por Isaac Melo

O literato inglês Samuel Johnson dizia que a glória máxima de um povo provém de seus escritores. Não precisamos ir longe para constatar isso, basta lembrar-se de Machado de Assis, Castro Alves, Drummond, Guimarães Rosa, Euclides da Cunha, Clarice Lispector, e inúmeros outros não menos importantes. Na literatura amazônico-acreana despontam também grandes nomes, tais como Craveiro Costa, Miguel Ferrante, José Potyguara, Djalma Batista, Jorge Kalume, Leandro Tocantins, etc., e finalmente J. G. de Araújo Jorge, que se não figura como o mais importante, é sem dúvida a maior expressão poética da literatura acreana desde os seus primórdios.Mas toda a glória que este poeta de multidões de leitores conquistou durante muito tempo no Brasil, é quase que oculta ao povo de sua terra.

Até sair do Acre, nunca havia ouvido pronunciar sequer na escola ou nos meios de comunicação o nome de J. G. de Araújo Jorge. Foi apenas quando cheguei ao Paraná que tive o meu primeiro contato com a sua poesia. Ali, li e comprei pela primeira vez um livro do Príncipe dos Poetas acreanos. José Guilherme de Araújo Jorge é um ilustre filho de Tarauacá, nascido no dia 20 de maio de 1914. Filho de Salvador Augusto de Araújo Jorge e Zilda Tinoco de Araújo Jorge, descendentes de tradicionais famílias do estado de Alagoas, composta por homens de grandes destaques, formado por médicos, escritores, políticos e grandes oradores. JG viveu em Tarauacá até os 7 anos de idade. Seu pai Salvador Augusto de Araújo Jorge, foi Juiz Municipal na Comarca de Tarauacá, em 1912. Transferindo-se para Rio Branco, em 1923 foi chefe de polícia. Em Rio Branco JG fez o curso primário no Grupo Escolar 7 de setembro.

O curso secundário e superior JG cursou no Rio de Janeiro nos Colégios Anglo-Americano, Pedro II, e finalmente, na então Faculdade Nacional de Direito da Universidade do Brasil.Sua vida estudantil foi marcada principalmente pela atuação no meio literário. Foi desde menino versado às letras e à oratória. Aos doze anos já estava escrevendo os seus primeiros poemas. No Colégio Pedro II, um dos mais renomados do país na época (autarquia Federal) e de grande tradição até hoje, despontou como um grande líder estudantil e lançou seu nome na literatura. Ali ele foi Presidente e fundador da Academia de Letras e eleito Príncipe dos Poetas do Pedro II, sendo saudado na ocasião, por nada mais nada menos que Coelho Neto, um dos mais importantes prosadores do Brasil. Foi ainda também fundador e o primeiro presidente da Academia de Letras da Faculdade de Direito, que tinha como patrono Afrânio Peixoto.

Ainda como estudante participou de caravanas universitárias ao Chile, Argentina, Uruguai, Portugal (onde recebeu o título de "Estudante honorário"), França, Espanha, Bélgica, Holanda e Alemanha, onde realizou um curso de extensão. Como professor do Pedro II, lecionou História e Literatura.Poesia e política na vida de Araújo Jorge são como duas faces de uma mesma moeda. Devido as suas posições políticas antifascistas, democráticas e socialistas, sofreu inúmeras perseguições e fora preso inúmeras vezes, principalmente no período do "Estado Novo" (Era Vargas), enquanto estudante, e da ditadura de 64, enquanto poeta e político. Foi candidato a vereador e a deputado estadual e federal no antigo Distrito Federal (posteriormente estado da Guanabara), hoje estado do Rio de Janeiro. Sendo eleito deputado federal em 1970, pela Guanabara, reelegendo-se para o terceiro mandato, em 1978.

Politicamente muito ativo JG foi um dentre tantos outros poetas que enfrentou a ditadura, como ele mesmo afirmava: "Quando a crítica metia o rabo entre as pernas com medo da ditadura, e os poetas, como caramujos de jardim enclausuravam-se em hermetismos artificiais, lancei livros que o DIP apreendeu, participei de comícios dissolvidos a bala...". Assim era JG um poeta da praça, um poeta que pregava a liberdade e lutava para que ela não fosse apenas uma quimera, mas uma realidade.JG foi colaborador e diretor de inúmeros jornais, além de manter durante vários anos programas literários, transmitidos principalmente por emissoras de rádio, como nas Rádios Eldorado, Tupi e Nacional do Rio de Janeiro, dentre outras. Tudo isso lhe rendeu o título de Poeta do Povo e da Mocidade. Sua poesia se destaca tanto pela sua mensagem social quanto política e lírica, impregnada de grande romantismo moderno, que chega até ser dramático. E a maior prova disso é o seu livro "A SÓS...", que é a maior expressão romântica de sua poesia, de um profundo lirismo, que conquistou o coração de inúmeros leitoras e leitores.

É por isso que JG fez tanto sucesso entre os jovens, ele tinha o dom de tocar-lhes o coração, por meio de sua poesia permeada de paixão e romantismo.Produziu muito e com qualidade. Possui 36 obras publicadas dos mais variados gêneros desde poesias, coletâneas, prosas até trovas. Somando todas as suas obras publicadas, ultrapassam a tiragem de dois milhões de exemplares. Todos os que viveram nesse período, são unânimes em afirmar que JG foi o poeta mais lido no Brasil, e conseqüentemente um dos mais combatidos também. Não é à toa que não vemos seu nome figurar em nenhuma antologia poética atual, e nem nós acreanos nos damos conta da importância desse nosso brilhante conterrâneo.Ele nunca esqueceu sua terra, sua gente, o chão que o pariu e o nutriu durante os primeiros anos de sua vida. Segundo me disse Olga Percário, uma das responsáveis por manter o site que conserva e divulga a poesia de JG, ele sempre alardeava dizendo com muito orgulho "Sou Acreano" e dedicou lindos poemas à nossa terra natal. Como afirma Camilo Castelo Branco, a poesia não tem presente: ou é esperança ou é saudade. Para JG eram as duas coisas.

Nutria um grande desejo de esperança de uma vida melhor para o seu povo, ao mesmo tempo em que era tocado pelas reminiscências de sua infância no Acre.Sua poesia é marcada por um grande humanismo e pela crítica social, onde o homem exerce papel central. Dizia ele: "a liberdade do futuro será a do homem sem medo da vida, dispondo da educação, da saúde, da terra, dos meios de trabalho, como de ar ou de sol, em igualdade de condições". Diante disso percebemos o quanto a mensagem de JG é atual, e o quanto soa para nós hoje como um apelo para repensarmos nossas maneiras de ser e agir, diante de uma sociedade cada vez mais desigual, e porque não dizer, desumana.Assim foi José Guilherme de Araújo Jorge, um poeta romântico, um utópico, um político, um homem que buscou na própria vida e na realidade que o cerca a inspiração para a sua poesia, e que deixou uma lacuna no meio literário que demorará a ser preenchido. JG morreu no Rio de Janeiro, terra que abraçou com imenso amor, no dia 27 de Janeiro de 1987.Creio que JG mereça um estudo mais aprofundado de sua obra, o que até o momento não foi feito, pois ela tem muito a nos dizer ainda.

Fica o desafio para a nova geração, em especial a acreana. Pois o Acre tem uma dívida para com este poeta, e se faz mister colocá-lo no devido lugar, que é, à galeria dos grandes homens do Estado, que ajudaram a construir e solidificar a nossa história com a própria vida seja com o sangue ou com a pena. É de estranhar que tanto em Tarauacá sua terra natal, quanto em Rio Branco, não há nada que registre o nome do Poeta do Povo e da Mocidade, nem ruas, escolas... Mas já valeria a pena se conhecesse pelo menos a sua obra. Não sei se esse fato se dá por ignorância ou por conivência. Uma coisa é certa ou JG é um poeta que o Acre esqueceu ou ainda não conheceu...Eis o desafio!


Fonte: ://www.google.com/notebook/public/11191268862387917317/BDQGASgoQwcqJuqQj?hl=pt-BR

http://www.jgaraujo.com.br/index.html



(Obs do Autor.: Para este artigo utilizei como base de fontes três obras de J. G. de Araújo Jorge: A Sós, O Poder da flor e O Poeta na Praça.) Clique aqui para conhecer o site do poeta JG de Araújo Jorge.

terça-feira, 8 de julho de 2008

Dissertação de Doutorado faz menção ao Acre

TÍTULO:
Cosmologias Políticas do Neocolonialismo: como uma Política Pública
AUTOR: RONALDO JOAQUIM DA SILVEIRA LOBÃO
Capítulo 1 – Reservas Extrativistas: trajetórias de reprodução social ou de proteção ambiental?
1.1. A luta dos seringueiros do Acre 1.2. Uma breve reflexão Um outro relato: a ênfase no extrativismo 1.3. Uma primeira revisão dos conceitos e sua construção 1.4. Algumas questões preliminares
1.5. Um evento paradigmático 1.5. O Quadrado Contra-Ataca: o Retorno do Incra
LEIA O CAPÍTULO 1:
Resumo
Nesta tese construo uma trajetória para as Reservas Extrativistas Marinhas enquanto uma política pública. Construídas a partir da luta dos seringueiros do Acre, as Reservas Extrativistas constituíram-se em um lócus onde diversos sentidos e ideologias estão em permanente tensão. Procuro mostrar que, ao longo da trajetória da política pública conquistada, vários de seus significados originais foram sendo subsumidos em outros, bastante diversos. Sugiro que as Reservas Extrativistas foram enredadas em uma nova cosmologia política, onde novas percepções e significações sobre o tempo e o espaço colocam os grupos locais em uma posição tutelada ou subalterna. Denomino esta nova configuração como Cosmologia Política do Neocolonialismo. Sob o domínio desta nova cosmologia eclode uma nova política, a do Ressentimento, uma vez que os grupos locais envolvidos com a política vêem-se alvos de atos de desconsideração de várias ordens. São convidados a ingressar em um novo universo cognitivo, mas desde que o façam de forma subalterna, sem poder tornar-se senhores de seus próprios destinos. Os instrumentos mais comuns neste aprisionamento são a construção de identidades de fora para dentro, a ressignificação de seus lugares como Unidades de Conservação ou Áreas Protegidas sob a égide do Meio Ambiente e submissão aos ditames do Desenvolvimento Sustentável.

domingo, 6 de julho de 2008

Dissertação de Mestrado do Professor Bento da UFAC


LEIA A DISSERTAÇÃO COMPLETA:



INTRODUÇÃO




“Desde que há mundo, nenhuma autoridade ainda teve boa vontade para se deixar tomar como objeto de crítica”. Nietzsche, Aurora.


Ao se tomar contato com a discussão em torno do autoritarismo é comum vincular a sua manifestação como sendo algo que se identifica somente com regimes de força oriundos da caserna ou de ditaduras civis. Especificamente sobre a ocorrência das ditaduras militares, há um vasto olhar acerca deste fenômeno, principalmente em relação à América Latina e ao Brasil, seja no volume de obras ou nas distintas visões interpretativas[1].

Em parte, isto contribui de maneira significativa às várias tentativas que buscam compreender tal questão. Mas é meu intento fazer uma discussão mais ampliada sobre os pressupostos teóricos e conceituais que dizem respeito a esse problema. Pois, embora toda ditadura — civil ou militar — careça do componente autoritário, o autoritarismo político não se expressa somente em uma situação de ditadura. Nesta, ele se exacerba.

Tanto o adjetivo autoritário, quanto o substantivo autoritarismo, são empregados regularmente em três contextos a saber: estruturas de sistemas políticos, disposições psicológicas de certos indivíduos ou para ressaltar determinadas ideologias políticas[2]. Na perspectiva política que irei trabalhar, são chamados de autoritários os regimes que privilegiam a autoridade governamental e declinam em gradações diferenciadas o consenso, mantendo o poder político nas mãos de uma só pessoa, de um órgão ou de um grupo específico, colocando em posição secundária as instituições representativas e exacerbando de maneira significativa o predomínio do poder executivo.

Para melhor compreensão é necessário afirmar, que mesmo fora de situações específicas relacionadas aos acontecimentos que discuto neste trabalho, a possibilidade de ocorrência dos conflitos abertos — bem como a adoção de procedimentos autoritários na esfera pública — estão presentes na própria formação dos Estados Nacionais no ocidente, que comporta a idéia de uma ordem essencialmente de origem burguesa. Uma Razão de Estado construída a partir de meados do século XVII para combater a “desordem”, impedir e controlar os conflitos originários das classes em luta, garantindo assim a reprodução de uma ordem idiossincrática, baseada objetivamente nas doutrinas legitimadoras do status quo do chamado Estado Moderno.

Ao tratarem especificamente do caso brasileiro e de suas peculiaridades, autores das mais variadas matizes ideológicas e interpretativas sugerem em seus estudos, que o fenômeno autoritário é algo intrínseco ao Estado erguido no período colonial/escravista, marcado sobremaneira por uma rede variada de relações sociais complexas que envolviam personalismo, autoritarismo, clientelismo, patrimonialismo, corporativismo e compadrio[3]. Este legado perdurou posteriormente, sofrendo somente alterações e recombinações; mas, na sua essência, permaneceu sendo um elemento duradouro e indelével na formação e desenvolvimento da “sociedade nacional”[4].
Florestan Fernandes (1975) ao estudar alguns processos sociais brasileiros demonstra que eles sempre ocorreram pelo alto, sem participação ou clamor popular que pudessem dar a estes acontecimentos, um verniz de autonomia e mobilização das classes sociais subalternas.

Para ele, a revolução burguesa ocorrida no Brasil aconteceu sem rupturas políticas fortes, não sendo capaz de construir uma institucionalidade democrática com incorporação social. A guisa de ilustração, assim foi com a abolição da escravidão, — que embora extremamente necessária e justa, foi resolvida por um Decreto-Lei — e, com a adoção do regime republicano, implantado através de um golpe militar. Partindo destes pressupostos, isto reforça ainda mais a característica excludente, hierárquica e centralizadora do exercício do poder existente na formação da Nação brasileira e em particular, do Estado Nacional.

Analisando as experiências do período pós 1930, comumente batizado de Segunda República, Wanderley G. Santos (1988) destaca três formas de experiências autoritárias na política brasileira: a primeira seria o Integralismo, que oriundo do império, sobrevive na República e é baseado nas desigualdades naturais entre os homens e no direito diferenciado; a segunda é caracterizada pelo Estado Novo, que é marcado pela acentuada intervenção e uso de mecanismos regulatórios do Estado, no intuito de disciplinar as questões sociais e assegurar certos níveis de eficácia econômica através do processo de industrialização. Conjugando ainda um grau acentuado de paternalismo e a busca de subordinação dos trabalhadores urbanos, ao chefe político; por último, o autoritarismo instrumental com seu viés pragmático e temporário — geralmente de cunho militar —, onde os procedimentos autoritários visam edificar uma sociedade liberal, estabelecendo mecanismos de um Estado forte como sendo momentâneos e necessários para corrigir, dissolver desvios, fragilidades e tendências de desagregação da ordem social e nacional.

A partir dessa sumária exposição, quero apontar para questão de que no Brasil se conviveu muito pouco com a manifestação e prática democrática. Deixando de lado o período anterior a 1889, e concentrando o enfoque nestes poucos mais de cem anos republicanos, percebe-se que até os anos trinta o conceito de democracia também não se aplica aos procedimentos e práticas políticas existentes até então.

Entre 1931 e 1934 passa a funcionar um regime provisório muito frágil do ponto de vista político e institucional; somente de 34 a 37 há a primeira e breve experiência de democracia formal de fato, substituída pela ditadura estadonovista que subsiste até 1945. Na seqüência, ocorreu a implementação da chamada democracia populista (45/64)[5], rompida com o golpe de 1964 e legando a ditadura militar que perdurou até metade dos anos oitenta. Ou seja, durante todo o último decênio do século XIX e todo o século XX, conviveu-se de forma alternada pouco mais de trinta anos com a democracia representativa em seu sentido moderno e universalista[6].

Levantadas essas questões preliminares e de ordem mais geral, quero deixar patente que são a partir destas considerações maiores que irei discutir, dentro da temática do autoritarismo político, o assunto que abordarei neste trabalho. Do ponto de vista pessoal, a escolha e os caminhos a serem percorridos estão ligados à minha formação acadêmica. Por isso, estas problematizações advêm de reflexões sobre as quais me debrucei durante a minha graduação em Ciência Política[7], ao abordar dentro desta perspectiva, a transição política de 1982 no Acre.

Nesta monografia, ficou a preocupação de que práticas autoritárias também eram comuns e se explicitaram durante o interstício em que vigorou a ditadura militar no período pós 64 e a chamada abertura política. A princípio, a meta para o mestrado era fazer uma abordagem que englobasse somente os anos em que vigoraram os governos biônicos indicados pela ditadura militar (64/82). Mas ao olhar para o caso acreano, me deparei com a presença destas práticas como já presentes no período de formação política do Território do Acre, no início do século passado. É em função disto, que o trabalho aqui apresentado busca modestamente discutir as “As raízes do autoritarismo no executivo acreano — 1921/1964”.

Passarei agora para o ponto fulcral deste trabalho, que procurará colocar em relevo algumas questões – tanto de ordem geral quanto específica – sobre como se deu no Acre a convivência da sociedade com procedimentos de cunho autoritário emanados a partir do Estado[8], onde este passa a conformar e dominar os espaços públicos através de suas instituições.

O Acre como Unidade da Federação brasileira se insere no contexto nacional — geográfica e politicamente — de forma gradativa, conflituosa e tardia. Contribuíram para isto acontecimentos como a República independente de Luís Galvez[9]; o levante liderado por Plácido de Castro visando a anexação, posteriormente ratificada com o Tratado de Petrópolis; a luta autonomista[10]; a unificação departamental e a elevação a Estado federado ocorrida somente em 1962. Acontecimentos complexos e de abordagens amplas, que acabaram forjando a “invenção” de uma certa identidade ao Acre e aos acreanos.

Mesmo após sua inserção no mapa brasileiro, os desígnios políticos-administrativos do Acre ficaram sob a incumbência da União, representada pelas oligarquias[11] dirigentes da chamada República Velha e seus pares locais. Estas oligarquias, se expressavam na concentração do poder nas mãos de um grupo restrito de pessoas, ligadas entre si por interesses ou privilégios particulares, que se serviam de todos os meios ao seu alcance para conservá-los através de influências conjugadas com o apoderamento da máquina estatal.

Com a revolução de 30 e a posterior instauração do Estado Novo varguista, o Acre, na condição de Território Federal, não teve essa característica alterada: continuou sob governos que não expressavam a vontade manifesta dos governados. Todos estes sendo todos formados basicamente por militares ou profissionais liberais, — como médicos e advogados — até mesmo durante a fase da chamada democracia populista brasileira.

Somente no ocaso do período conhecido por populismo democrático é que ocorre a elevação do Acre a Estado federado (15/06/62), se efetivando, de fato e de direito, algo que já existia em forma de luta primária desde o momento da anexação do território à União. Ou seja, a busca de uma maior autonomia política do Acre e sua formal independência administrativa, que se implementou, permeada de contradições e peculiaridades, a partir do Projeto de Lei apresentado na Câmara Federal pelo então deputado José Guiomard Santos[12].

No seu conjunto, a proposta desta dissertação é colocar em relevo essas questões, procurando evidenciar alguns aspectos sobre a gênese da formação política do Acre e das práticas autoritárias presentes no seio do poder executivo, como marca singular da faceta do Território acreano.
Inicio minha análise traçando um panorama mais amplo sobre as bases formadoras do autoritarismo no Acre, percebendo-o como sendo uma prática originária de um processo longo e duradouro, indelevelmente associado à própria formação política desta unidade federativa. Tendo prevalecido como algo constante ao longo do seu desenvolvimento, exacerbando-se de maneira mais evidente no período posterior a 64 com a instituição do autoritarismo militar explícito.

Intenciono analisar, na esfera do poder executivo estadual, as características mais gerais das adoções de medidas políticas de cunho autoritário durante o período compreendido entre os anos de 1921 e 1964. Este recorte temporal se justifica por englobar um período bastante significativo do ponto de vista da organização burocrática e administrativa do Acre.

Se entre 1904 e 1920 o Território era dividido em Departamentos administrativos, é a partir de 1921 que ocorre a unificação de fato do Território e a centralização do poder executivo. Os anos 40 e 50 são marcados pelas disputas entre Guiomard Santos e Oscar Passos e, a posterior elevação do Acre a Estado federado em 1962 coincide com as primeiras eleições diretas para governador, tendo sido eleito o professor José Augusto de Araújo. Em seguida vem o golpe militar, marcado pela vigência de governos biônicos impostos pela ditadura, tanto no plano nacional quanto local.

Procuro acompanhar ainda, questões relacionadas à forma de atuação e o papel desempenhado pelo Estado a partir do norte que as classes dirigentes lhe imprimiram. Este Estado procura acima de tudo assegurar uma ordem vigente, intencionando manter sob seu controle o conflito entre grupos e interesses antagônicos. Consignado a isto, busco identificar também os interesses, as principais forças e atores políticos envolvidos no período citado, mostrando ainda o impacto do autoritarismo e do burocratismo[13] e o “legado” que ambos deixaram a posteriori no conjunto da “sociedade acreana”[14].

Por fim, me baseio em um entendimento ex-anti e empírico que me leva a dizer que no Acre, pelas suas características peculiares, as práticas de cunho autoritário remontam o Território, sobrevivem no momento em que este se eleva a Estado e se reforçam com mais intensidade a partir do golpe de 64. Por isso, o meu interesse em problematizar estas questões circunscritas no período supra citado.

Acredito que as questões levantadas aqui como relevantes, já servem como base para justificar o meu interesse pelo assunto proposto, buscando uma reflexão e uma compreensão mais acurada a respeito dessa temática. Por outro lado, o presente trabalho se constitui e se insere numa perspectiva que busca dialogar e refletir, com e sobre a história política acreana, a partir das questões preliminarmente apontadas.

Procuro trilhar em uma linha historiográfica voltada para uma abordagem política, no intuito de interpretar as relações e contradições existentes entre as oligarquias dirigentes e outros grupos sociais que compuseram e construíram a “sociedade acreana”. Sem com isto me pautar em determinismos, dogmatismos ou em uma visão maniqueísta do problema.

Ao fazer preliminarmente essas digressões mais gerais, ressalto que a discussão dessas categorias e conceitos até agora citados devem ser considerados antecipadamente de acordo com o sentido que eles possuem no seu contexto histórico, bem como suas transformações e a incorporação de novos significados que passam a adquirir. Considero de suma importância fazer estas ressalvas para melhor caracterizar os constructos utilizados na análise interpretativa.
A intenção é não concebê-los como sendo abstratos e deslocados de materialidade, nem destituí-los de estarem intimamente ligados a modos de vida distintos. Portanto, não tendo eles uma aplicabilidade automática sem que se faça uma discussão entre o referencial teórico e os processos históricos que estão em análise.

Mesmo assim, se os múltiplos paradigmas estão postos, talvez seja preciso abordá-los tendo como pressuposto que eles não explicam nem atribuem conexões absolutas, que tornem a compreensão imediata e total entre o sujeito e o anacrônico “objeto”. Isso ocorre porque os sujeitos históricos, e o historiador em particular, não chegam nunca a finitude da narrativa e da interpretação a respeito do passado. Não são dados a conhecerem todas as alternativas possíveis do amanhã e não têm controle sobre as situações do presente. Com isto, o saber histórico se torna o singular e o relevante de um passado reconstruído a posteriori.

Desta forma, embora o presente temporalmente seja um produto do passado, inversamente o passado ao “ser dito” se torna algo construído a partir do presente, através das múltiplas visões daqueles que procuram interpretá-lo[15]. Segundo José Luiz Fiori (1995), “são as expectativas que fazem do futuro um elemento ativo no presente, possibilitando a coexistência de uma dimensão que embora não seja ainda vivida e conhecida, comporta uma certa lógica e é fundamental para a compreensão daquilo que está sendo vivido” (idem, p.17). Assim, o presente está sempre “prenhe” de uma perspectiva futura que já existe como potestade neste mesmo presente sem, no entanto, este futuro ser conhecido e entendido antecipadamente. Talvez devido a essas complexidades o fardo da história seja tão pesado.

No tocante ao processo de pesquisa, me ative fundamentalmente em leituras de jornais e documentos dos Arquivos do CDIH/UFAC, Museu da Borracha, Instituto Lígia Hammes, Arquivo Geral do Estado do Acre, Assessoria de Comunicação da Policia Militar do Acre, Biblioteca da Assembléia Legislativa do Acre e Biblioteca do Tribunal de Justiça do Acre, além de acervos em Cruzeiro do Sul e da Biblioteca Nacional (RJ). Como fica evidente nesta relação, todos os Arquivos notadamente estão vinculados a órgãos estatais, construídos e mantidos pelo Estado e pelos poderes constituídos.

Lugares por definição, que guardam certas “memórias”, que estabelecem o que deve ser preservado e lembrado; por oposição, o que deve ser silenciado e esquecido. Além, do material bibliográfico — geral e regional — em que me apoiei para discutir os princípios teóricos-metodológicos que nortearam e fundamentaram este trabalho. Junto a estas observações, tenho a compreensão de que os documentos e outras fontes não “falam por si mesmo”, contém intencionalidades subjetivas e objetivas, silêncios, leituras invertidas e discursos de práticas sociais permeados de interesses, estratégias e propósitos.

Um outro ponto a ser explicitado na decorrer da pesquisa, refere-se a dois problemas que se colocaram a priori como entraves na consecução deste trabalho. O primeiro deles se configurou na escassez de fontes escritas. Além dos jornais, não há quase nada escrito e desconheço a existência significativa de documentos oficiais disponíveis. Devido essas singularidades, fui levado em certa medida a dialogar e discutir as interpretações destes acontecimentos, a partir de relatos jornalísticos, entrevistas e depoimentos. No caso destes últimos, isto foi proporcionado por aqueles que, em maior ou menor grau, vivenciaram estes eventos e processos sociais em graus diferenciados de atuação e olhar interpretativo.

Desta forma, um alento para esta deficiência documental primária nos é dada por Fustel de Coulanges (apud Paz, 1996) ao afirmar que embora o historiador deva permanecer próximo ao documento, alerta que o mundo histórico não pode necessariamente ser reduzido a um texto. Contudo não se pode abrir mão, como ressaltou Michel de Certeau (1995, p. 19), de um sistema de referências. Sistema este que sempre contém uma filosofia implícita e particular que remete à subjetividade do autor. Esse entendimento se aproxima em muito da visão de Hayden White, (1994) que afirma ser o “fato histórico” algo que não é antecipadamente dado, mas que elaboramos a partir de certas indagações que fazemos ao passado.

Outro fator está relacionado com os marcos temporais, que embora do ponto de vista macro já estejam delimitados, existem micro-tempos que evidenciam a indefinição clara de limites. Simultaneamente, isto leva a optar em reduzir fatores e atores, implicando assim que se considera a priori alguns, dentre muitos, como efetivamente significativos em relação a um determinado acontecimento a ser analisado. Inspirado em Fernand Braudel, José Luís Fiori (1995) indaga, “se os inúmeros ‘rios do tempo’ correm de forma integrada, conquanto estabeleçam curvas e confluências não coincidentes, será possível a cada navegante descobrir a lógica de sua vertente sem que conheça a dos demais?” (idem, p.32). Certamente, este é um problema que aflige a todos aqueles que se voltam para o interpretar das ações humanas. Uma resposta metafórica e pessoal a esta pergunta, seria afirmar que nos é dado a conhecer apenas trechos ínfimos de alguns dos inúmeros “rios do tempo” e as águas estão sempre turvas, onde cada um observa e analisa aspectos singulares dentre os diversos existentes.

Compreendo que a abordagem é complexa e a diversidade de interpretações que ela comporta é muito grande. Isto também ocorre pelas implicações e injunções de ordem teórico/metodológica que se inserem em tal abordagem, como também pelas singularidades presentes em qualquer evento histórico e pelas escolhas das veredas que foram feitas.

Concomitante a isto, entendo que a percepção do social não pode ser encarada como sendo neutra, sem produzir estratégias e práticas pelo historiador, pelos sujeitos e pelos diversos grupos sociais envolvidos. Assim, “fugirei” das prenoções rankeanas de uma história isenta, de falar do passado pelo passado, como se este não tivesse uma conexão com o presente e com aquele que a escreve.

Contrapondo-se a esta ótica, parecem ser bastante apropriadas as observações de Michel de Certeau (1995, p. 17) ao afirmar não existir considerações e leituras capazes de apagar as particularidades do tópos de onde falo, domino e conduzo minha investigação. Porque na escrita da História, e para o historiador, o sistema de pensamento está intimamente ligado a “lugares” que englobam aspectos sociais, econômicos, políticos e culturais.
Os tópicos levantados aqui não comportam explicações definitivas, nem é minha pretensão procurá-las. Isso recoloca todos aqueles que lidam com a dimensão humana, inclusive o historiador, em uma posição de construtores de visões particulares e interpretações que jamais podem adquirir a etiqueta de absolutas.

No entanto, deve-se tomar cuidado com as visões enviesadas como a de White, que concebe a história como sendo feita da forma que o historiador achar melhor e que este faça dela o que quiser (apud Paz, 1996, p. 194). Não concordo com esta assertiva da negativa radical de um mínimo de pressupostos no estudo da História.

Entendo que é somente a busca do conhecimento, a problematização e a dúvida metódica que constroem algumas certezas, que embora parciais e discutíveis são necessárias. Como afirma Agnes Heller (1981) com bastante propriedade, compreender a história significa trazer os fenômenos e as experiências vividas para dentro do nosso mundo, procurando explicar e conhecer o que antes era obscuro e com isto, promovendo uma certa inteligibilidade sobre o passado.

Traçadas estas observações, considero de vital importância discutir o contexto histórico dos acontecimentos a serem analisados em meu estudo, articulando-os com os constructos que também são comuns a outras ciências, notadamente a Ciência Política e a Sociologia. Pois, dialogando com as suas respectivas categorias e paradigmas, entendo que se possa fazer uma análise fundamentada em torno do político e do social de maneira mais consistente. Como bem observou Fernand Braudel (1980), “todas as ciências sociais se contaminam umas com as outras; e a História não escapa a estas epidemias. Daí, essas transformações de ser, de modos ou de rostos” (p. 125).
Após essas explanações e considerações em torno da história enquanto área de produção e entendimento dos acontecimentos, e das múltiplas visões dos determinados autores aqui citados, ressalto que procurei me ater e manter uma proximidade maior com aqueles autores que considero importantes para o desenvolvimento, tanto teórico quanto metodológico, de meu estudo.

Reconheço, como já foi antecipadamente colocado, que há uma proximidade argumentativa com a Sociologia e a Ciência Política, que contribuíram para a execução deste trabalho proposto. Assim como Carr, entendo que “quanto mais sociológica a História se torna, e quanto mais histórica a Sociologia se torna, tanto melhor para ambas” (in Hunt, 1992, p. 02).

Acredito que essa percepção da contribuição e das trocas entre as disciplinas são essenciais para o surgimento de novas abordagens e perspectivas analíticas, que em vez de anular, somam e tornam o conhecimento sobre os eventos passados mais ricos através dos múltiplos olhares. Talvez haja aí a complementaridade que Max Weber achava existir entre as ciências humanas, que segundo ele se orientam em duas direções: uma relacionada às causalidades históricas, daquilo que só ocorre uma única vez; e a outra seria a causalidade sociológica, que reconstruiria funcional e conceitualmente as instituições sociais.

Estruturalmente este trabalho está organizado e dividido em três capítulos, a saber:

— Capítulo I – A presença do Estado e sua conformação como centro do poder político: a hipertrofia do executivo — Procuro neste tópico ressaltar o caráter autoritário da formação e o direcionamento político do Território do Acre nas suas diversas fases, que vai desde sua anexação ao Brasil em 1903[16], passando pelas várias organizações administrativas, dando maior ênfase no período após 1920, quando ocorre a unificação administrativa. Para efeito didático, compreendo este período como sendo composto de quatro fases: a primeira está circunscrita entre 1904[17] e 1920, quando o poder executivo era descentralizado nos Departamentos; a segunda entre 1921 e 1930, quando os governadores (Delegados da União) passam a ser nomeados; a terceira vai de 1930 até 1937, com a figura dos Interventores Federais e a última de 1937 a 1962, quando novamente os governadores voltam a serem nomeados;

— Capítulo II – Do Movimento Autonomista à elevação do Acre a Estado: mudanças e continuísmos — procuro colocar em evidência a luta do Movimento Autonomista, que desde os primórdios da anexação do Acre ao Brasil começou a tentar elevar o Território à condição de Estado federado. Ressaltando aspectos relevantes que marcaram a trajetória dos grupos em luta, contra ou a favor da autonomia; incluindo ainda as disputas políticas entre Guiomard Santos e Oscar Passos. Entendendo por princípio, que o desfecho desta contenda pouco acrescentou para diferenciar o legado autoritário oriundo dos tempos do Território;

— Capítulo III – De José Augusto ao capitão Cerqueira: fragilidade política, falta de hegemonia e exacerbação do autoritarismo no executivo — Aqui ressalto alguns aspectos relacionados aos conflitos e embates, — de cunho partidário e de busca de hegemonia política — enfrentados pelo governo de José Augusto. Este foi o primeiro governador constitucionalmente eleito e logo deposto pelo golpe de 64 em virtude do rearranjo político que ocorreu em âmbito nacional, açodado mais ainda pelas peculiaridades da política local. Após sua queda, assume o poder o capitão do Exército Edgard Pedreira Cerqueira, que imprime inicialmente uma série de medidas, visando punir os atos “subversivos” praticados por José Augusto e seus auxiliares durante o curto mandato frente ao executivo acreano.
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[1]Ver capítulo III, tópico 3.3.
[2]Cf.: Stoppino (1993), pp. 94 e ss.
[3]Interessantes reflexões acerca dos conceitos destes termos, podem ser encontradas em Faoro (2000); Prado Júnior (2000); Holanda (1976); Freyre (1973); e, Leal (1997). Cf. Bibliografia.
[4]O termo “sociedade nacional”, remete a um conjunto de universais abstratos muito próximos: Estado, Nação, Povo, País e Identidade nacional. Vistos como totalidades uniformes onde as pessoas se sentem ligadas por uma rede de vínculos percebidos como sendo comuns, que os mantém unidos e os fazem sentirem se diferentes dos “outros”, provocando uma alteridade coletiva. Estes termos, geralmente estão ligados à idéia de uma sociedade sem oposição, na qual os conflitos foram dissimulados na identidade da sociedade consigo mesma, produzindo ideologicamente uma fusão que procura coincidir indivíduo, sociedade e Estado.
[5]Cf. entre outros, Weffort (1980); Ianni (1988) e, Ianni (1989).
[6]Para este caso, e a título de didatismo, explicitarei alguns elementos mínimos, sine qua non, apontados por diversos autores para se caracterizar, sem definir, a existência da democracia: eleições livres e regulares para cargos executivos e legislativos, sufrágio universal, universalização do direito, liberdade de expressão e de associação a todos cidadãos. Como não cabe fazer aqui uma discussão acerca da democracia representativa, indicarei aqui apenas alguns autores que lançam distintos enfoques sobre esta questão: em um plano mais geral Sartori (1986), Hirst (1992), Bobbio (1986) e Dahl (2001). Sobre as democracias latino-americanas ver, entre outros, O’ Donnell (1993) e O’ Donnell (1997). Cf. Bibliografia.
[7]Cf.: Silva (1998).
[8]Reporto-me aqui ao sentido amplo de Estado, que engloba tanto o poder público federal (União); quanto territorial (Acre).
[9]Luiz Galvez Rodrigues de Árias, espanhol que trabalhou na embaixada de seu país em Buenos Aires; depois seguiu para o Brasil e se estabeleceu em Manaus, onde trabalhou primeiramente como jornalista e depois no Consulado boliviano em Belém, quando toma contato com a “Questão acreana”. Figura folclórica e controversa que em 14 de julho de 1899, proclamou o Acre Independente (Governo do Estado do Acre, 1999). A intencionalidade da data coincidindo com a revolução francesa de 1789 e as compras adquiridas previamente em Manaus não foram por acaso.
[10]Embora o Projeto de Lei nº 4.070 que redundou na elevação do Acre a Estado tenha sido apresentado em 1957; muito antes, em 1908, o deputado cearense Francisco Sá já tinha apresentado semelhante Projeto na Câmara Federal, depois reapresentou com algumas alterações o mesmo Projeto no Senado Federal em 1915, ambos foram rejeitados. Somente em 1919 seu Projeto é reapresentado e aprovado com substanciais alterações, dando ao Acre a centralização administrativa, mas negando-lhe o estatuto de Estado. Cf. Craveiro Costa (1974).
[11]Semânticamente deriva do grego e significa governo (arché) de poucos (oligos). Para Ianni (1989), as oligarquias no Brasil são compostas por lideranças políticas e econômicas onde o poder é exercido pelo mesmo grupo e pessoas interpostas, em nome ou em benefício de uma classe social bastante reduzida e solidária no controle do poder (ibidem, p. 47).
[12]Cf. Costa (1998).
[13]Para Saes (1992), em A formação do Estado burguês no Brasil, o “burocratismo” é um sistema de organização dos servidores do Estado (civis e militares) que os enquadra em determinadas práticas e regras jurídicas, construindo uma tendência ideológica própria desta categoria, baseada na impessoalidade e não-monopólio das funções, hierarquia vertical. Ou seja, qualquer um a partir da competência profissional pode desempenhar as mais variadas funções dentro do aparelho estatal; com isto, procura-se descaracterizar o caráter de classe do Estado.
[14] O termo sociedade acreana encontra-se ao longo do trabalho “aspado” devido ser muito amplo e vago conceitualmente, assemelha-se ao termo sociedade nacional, já comentado na nota 04 desta introdução.
[15]Discussão levantada por Carl Becker, in Wehling, (1994, p. 128).
[16]Após a vitória do exército liderado por Plácido de Castro contra os bolivianos, o governo federal temendo uma retomada dos conflitos, envia para o Acre um destacamento militar comandado pelo general Olímpio da Silveira, que obriga os acreanos a deporem as armas e leva a questão para o âmbito diplomático. Do momento em que termina o conflito armado entre brasileiros e bolivianos e a assinatura do Tratado de Petrópolis, o Acre foi dividido em duas zonas administrativas: o Acre Setentrional (Juruá/Tarauacá), governado pelo general Olímpio da Silveira e o Acre Meridional (Acre/Purús), governado por Plácido de Castro. Cf. Souza (1994, p. 134).
[17]Tenho como ponto de partida o Decreto 5.188, de 07 de abril de 1904 que instituiu a criação dos três Departamentos administrativos (vide mapa 01 em Anexos).

quinta-feira, 3 de julho de 2008

O Golpe Militar de 1964 no Estado do Acre

AUTOR
Professor Ms. Chico Bento da UFAC

RESUMO DE LIVRO

DUARTE, Élio Garcia. Conflitos pela terra no Acre: a resistência dos seringueiros de Xapuri. Rio Branco: Casa da Amazônia, 1987.
- O livro foi uma adaptação da dissertação de mestrado defendida em 1986 na UNICAP. O autor foi professor de História na UFAC no período de 1978 a 1981. Na época da edição do livro era professor de História Econômica na Universidade de Goiás. - O Acre se caracteriza por um processo violento de ocupação fundiária. Os fazendeiros ocupavam os antigos seringais, desmatando-os. “Atitudes concretas foram tomadas por um grupo de acreanos inconformados, que em maio de 1899, se rebelaram e conseguiram expulsar a Delegação boliviana da região. Foi a primeira Revolução Acreana, que ocorreu sem tiros” p. 13. “Enquanto isso, em Belém e Manaus, preparava-se um plano para a tomada da região pelos brasileiros. O mentor deste plano foi o espanhol Luiz Galvez Rodrigues de Arias. Galvez, com a ajuda do Governo do Amazonas e de comerciantes de Manaus, formou uma expedição que partiu para o Acre com a finalidade de constituir um governo no local. Chegando ao Acre, Galvez se reuniu com os seringalistas...” p. 13. - O Estado Independente do Acre teve sede em Puerto Alonso. O governo de Galvez durou 8 meses e neste período foram criados vários departamentos administrativos, “... organizados os serviços públicos e também se legislou sobre títulos de propriedade” p. 13. “Seu governo, no entanto, foi efêmero. Logo surgiram reações. Os comerciantes de Manaus e Belém se recusavam a pagar o imposto cobrado da borracha exportada pelo território acreano e também suspenderam o fornecimento de mercadorias para o Acre. Outra reação foi dos bolivianos que se prepararam para atacá-lo tanto através de Manaus, com o consentimento do governo brasileiro, como diretamente da Bolívia, por via terrestre ou descendo pelo Rio Acre. No entanto, quem acabou obtendo a rendição de Galvez foi uma flotilha da Marinha brasileira, em março de 1900” p. 13. “Após a deportação de Galvez, outros líderes da Revolução Acreana assumiram a presidência do Estado Independente do Acre e continuaram dificultando a consolidação do domínio boliviano na região” p. 13. “O Governo brasileiro, com exceção do governo do Estado do Amazonas, mantinha-se fiel ao tratado de Ayacucho, reconhecendo o direito da Bolívia sobre a região... Só no final de 1901, após a constituição do Bolivian Syndicate é que as autoridades brasileiras passaram a se opor à Bolívia, no tocante à questão do Acre” p. 13. - O Acre seria arrendado aos capitais ingleses e americanos. Por trinta anos, ficariam à frente da administração fiscal do Acre. O Brasil se preocupava com a segurança nacional, já que, o acesso ao Acre se dava por águas nacionais. “Este movimento se tornou mais forte quando D. Lino Romero, o novo Delegado da Bolívia, chegou ao Acre e estabeleceu uma legislação discricionária, com a cobrança de inúmeros impostos que descontentaram os seringalistas e comerciantes. - O Estado Independente anterior ao de Plácido de Castro foi extinto em abril de 1900, “... ocasião em que o então Presidente Joaquim Vítor assinou uma ata de paz permitindo o funcionamento da alfândega boliviana e a instalação de autoridades da Bolívia no Acre” p. 14. - Acre Setentrional, ocupado pelo General Olímpio, ficava entre a Linha Cunha Gomes e o paralelo 10°20’. - O Acre ficou dividido em dois governos: “... o Governo Militar do Território Setentrional do Acre e o Governo do Estado Independente do acre, com jurisdição ao sul do paralelo 10°20’. - Em maio de 1903, Plácido de Castro dissolve o exército e declara extinto o Estado Independente. “... enquanto a diplomacia brasileira negociava a incorporação do Acre ao Brasil, era interessante manter o status quo da revolução acreana” p.15. - Posterior ao Tratado de Petrópolis, os Peruanos ocuparam militarmente o alto Juruá e Purus, “... instalando postos aduaneiros e militares” p. 15. “A anexação das terras acreanas ao Brasil foi conseguida com o sacrifício e a persistência dos seringueiros acreanos. Este fato traz outra característica marcante para o Acre: o orgulho do seringueiro pro ter sido aquela região incorporada ao Brasil pela luta e pelo sangue de seus antepassados” p. 15. - Xapuri foi sede do governo Independente por algum tempo. “... os interesses do capital foram responsáveis pelo desenvolvimento da economia gomífera na Amazônia, e a conseqüente ocupação das terras do Acre...” p. 16. - A vulcanização possibilitou a ampliação da aplicabilidade da borracha como matéria-prima industrial. “O enorme interesse pela borracha fez com que houvesse a expansão das áreas produtoras e estimulou a migração de nordestinos para os altos rios da Amazônia” p. 16. “Segundo cálculos de Benchimol, no período de 1877-1900, só no Ceará emigraram 158.125 pessoas para a Amazônia. Moacir Fecury, comparando a população paraense entre 1872 (275.237 hab.) e 1906 (872.000 hab.), observou que houve um aumento populacional de 300% em 34 anos. Conforme Caio Prado, o Acre: ‘... entranhado 5.000 Km no continente, e deserto até os primeiros anos do século atual, reunirá em menos de um decênio para ais de 50.00 habitantes[1]’. Craveiro Costa calcula que na época da anexação do Acre ao Brasil sua população chegava a 100.000 habitantes[2]” p. 17. “A dispersão das seringueiras pelas florestas, a ausência de técnicas de produção e cultivo, a falta de apoio oficial, o alto custo da mão-de-obra, a falta de capital, as dificuldades de transportes, tudo isso contribuía par a manutenção do alto custo de produção da borracha amazônica” p. 17. - A economia do Acre era o mono-extrativismo gomífero. “Uma das conseqüências desta crise foi a reemigração para o nordeste, havendo um grande esvaziamento populacional. A população do Acre, que no início do século, segundo Craveiro Costa, era calculada em aproximadamente 100.000 habitantes, no censo de 1920 apresentava 92.379 habitantes, enquanto quem em 1940, esta população baixara para 79.768. Somente no censo de 1950, é que apresentou um aumento populacional; 114.755 habitantes[3]”. P. 17 “Os seringueiros que permaneceram no Acre passaram a se dedicar à agricultura de subsistência, à coleta de castanha, à caça e à pesca, sem abandonar completamente a extração da borracha. Nos seringais abandonados, muitos seringueiros permaneceram como posseiros, ficando livres da dependência do seringalista. Nos outros seringais, pelo menos foi atenuada a subordinação ao patrão...” p, 17-18. - Na SEGUNDA GUERRA MUNDIAL, “... o capital industrial voltou a se interessar pela borracha nativa produzida em Amazônia” p. 18. - Banco de Crédito da Borracha tinha como atribuição estimular a produção da borracha e regularizar os preços para a comercialização da mesma. Funcionava através no monopólio estatal da borracha. - SEMTA (Serviço Especial de Mobilização de Trabalhadores para a Amazônia) fazia o recrutamento de trabalhadores para a região. Foi substituído pelo CAETA (Comissão Administrativa do Encaminhamento de Trabalhadores para a Amazônia. “Pensavam estar servindo à Pátria, quando na verdade estavam servindo apenas aos interesses do capital” p. 19. “Como dissemos anteriormente a ocupação do Acre foi motivada pelo capital industrial, que já estava plenamente constituído na Europa e nos Estados Unidos, já exercendo seu domínio a nível mundial” p. 19. “Portanto, a produção que se organizou na Amazônia, especialmente no Acre, apesar de não ter assumido as formas típicas do capitalismo, foi uma produção de mercadoria para o capital[4]” p. 19. “O seringueiro, portanto, mesmo não sendo um assalariado... trabalhava para valorizar o capital” p. 19-20. “O perpétuo endividamento e a quase total ausência de dinheiro vivo fazia com que o seringueiro estivesse sempre vinculado ao patrão seringalista” p. 20. - Os jagunços do patrão impediam que o seringueiro fugisse para outro seringal ou para sua terra natal. - O seringueiro não era um assalariado porque não era livre para vender sua força de produção. - No dizer de Márcio Souza, o seringueiro era “... um escravo econômico e moral do patrão[5]” (apud, p. 20) - O capitalismo reinventa o trabalho compulsório, no momento em que o Brasil se livrava da escravidão. - Capital Monopolista Internacional → Capital Mercantil do Extrativismo da Borracha→Relações de Produção Pré-Capitalista na Amazônia[6]. “O aviamento é uma forma sui generis de relação de produção que foi recriada pelo capitalismo para valorizar o capital” p. 21. “... foi o capital industrial, com as relações capitalistas predominantes, que estimulou e organizou a produção extrativista da borracha, por intermédio do capital mercantil” p. 21. - A produção da borracha foi estimulada diretamente pelo capital mercantil. No entanto, o comércio gomífero respondia a uma demanda imprimida pelo capital industrial. - O capital mercantil só funciona na esfera da circulação, como uma das fases do processo de reprodução do capital. - O sistema de aviamento funcionava sob a dominação imediata do capital mercantil (capital mercadoria/dinheiro). No entanto, era o CAPITAL INDUSTRIAL das grandes potências que fazia funcionar a empresa do seringal nativo, isso porque as casas exportadoras estavam diretamente ligadas ao capital monopolista internacional e era este que, em última instância, detinha o controle do sistema de aviamento. - LER MARX: capital mercantil e financeiro “Acreditamos que no caso do Acre em particular e da Amazônia de maneira geral, apesar de o capital não ter atuado diretamente na organização da produção, extraindo a mais-valia através da subordinação real, mas através do capital mercantil, recriou e subordinou formalmente relações de produção que permitiram a apropriação do sobretrabalho do produtor direto, e que contribuíram par apropriação do capital industrial” p. 22. “Embora o extrativismo gomífero tenha sido estimulado pelo desenvolvimento da indústria na Europa e Estados Unidos, a produção da borracha não foi organizada diretamente pelo capital industrial. A produção desta mercadoria, importantíssima como matéria-prima para as indústrias, teve a intermediação do capital mercantil... O capital mercantil era, internamente, representado pelas casas aviadoras e pelas exportadoras. As CASAS AVIADORAS, com financiamento da rede bancária ou com crédito das casas exportadoras, eram as que estimulavam diretamente a organização de seringais. Estas casas, não só financiavam e organizavam o transporte de nordestinos para os seringais, como também aviavam, isto é, forneciam a crédito, aos seringalistas, as mercadorias para a abertura e movimentação do seringal” p. 23. “Em compensação, as CASAS AVIADORAS mantinham, sobre os seringalistas o monopólio da venda de mercadorias e o monopsônio da compra da borracha” p. 23. “O seringal era dividido em várias colocações, dispersas pelo interior da floresta. Casa colocação era constituída pelo tapiri (cabana de palha) e pelas estradas de seringa trabalhadas pelo seringueiro” p. 23. - Os seringais eram “... enormes latifúndios” p. 25. “O mono-extrativismo da borracha se baseou, portanto, em uma estrutura fundiária bastante concentrada” p. 25. - Isso por que as seringueiras estavam distribuídas de forma aleatória a mata. OBS: a monografia de Economia tem por objetivo analisar os fundamentos econômicos da ocupação do Acre. “Dados do Censo de 1920 nos mostram que 84% das terras recenseadas do Acre ocupadas por propriedades com mais de 10.000 ha” p. 26. - Logo no início, não se havia a preocupação em legalizar a terra. Isso só veio a ocorrer a partir de 1870, quando se buscou nas leis a garantia jurídica da posse. Assim, passou-se a demarcar as terras. “Os primeiros títulos de terra no Acre foram emitidos pela Província do amazonas (na república passou a ser denominada de Estado). Com a instalação da Delegação do Governo Boliviano no Acre, em 1899, tanto as antigas, como as novas concessões teriam que ser registradas na Secretaria da Delegação. Também o Estado Independente do Acre, criado por Galvez e depois o de Plácido de Castro, legislaram sobre terras. Quando o Acre foi anexado ao Brasil, em 1903, o governo brasileiro se comprometeu em respeitar os títulos emitidos pelos governos anteriores” p. 26. - No entanto, antes da anexação, não foram feitas muitas titulações, não havia uma grande preocupação com o domínio jurídico. O que prevaleceu foi à posse efetiva. O que tornava a terra valiosa não era sua extensão, mas a concentração de seringueiras. - Na Batalha da Borracha, o financiamento ao seringalista passou a ser feito pelo Banco de Crédito, que passou a ter o monopólio da compra do produto. CAP 2 – A política de ocupação da Amazônia Pós-64. CAP 3 – Concentração fundiária e conflitos sociais no Acre. CAP 4 – A luta pela terra em Xapuri. BIBLIOGRAFIA: ABGUA, Bastos. A conquista acreana. SILVA, Adalberto Ferreira. Raízes da Ocupação Recente das Terras do Acre. (1982). CAVALCANTE, Francisco Carlos. O Processo de Ocupação Recente das Terras do Acre (1983). [1] 240 p. [2] 128 p. [3] Anuário Estatístico do Brasil (1980) - Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, rio de janeiro, 1980, p. 72. [4] Não vieram para estender os limites da pátria, mas vieram à servido do grande capital. [5] SOUZA, Márcio. A expressão amazonense: do colonialismo ao neocolonialismo. São Paulo: alfa-ômega, 1977, p. 100. [6] É uma produção capitalista baseada em relações não-capitalistas. Geralmente isso acontece quando o comércio comanda a economia.

Etnologia e história dos índios Yaminawa, do rio Acre

Fonte: http://www.jornalocal.com.br/noticias/?id=1559 Os índios Yaminawa são despojados, destrutivos, humoristas, mal-afamados e descontentes de si mesmos, não resgatam nossas utopias nem nos dão satisfações morais. Essas são algumas das características da comunidade Yaminawa da Terra Indígena Cabeceiras do Rio Acre, situada no município de Assis Brasil, Acre, apontadas na obra O nome e o tempo dos Yaminawa, de Oscar Calavia Sáez, lançada pela Editora Unesp em parceria com o Instituto Socioambiental (ISA) e o Núcleo de Transformações Indígenas (NuTI). Oficializado em 1988 pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI), o grupo indígena Yaminawa foi pesquisado por Sáez nos anos 1990, quando atravessava uma fase problemática: eram índios aculturados, que haviam abandonado todas as suas tradições. A primeira parte do livro é dedicada a uma etnografia do grupo Yaminawa, voltando-se à organização social. Sáez apresenta a aldeia Yaminawa, seus protagonistas e espaços, a economia e o cotidiano. Em seguida, discute as complexidades do sistema de parentesco Yaminawa e também descreve as festas, a chefia e a reserva do Xamã. Já a segunda parte da obra é composta por uma espécie de crônica Yaminawa. Dentre uma diversidade de temas, destacam-se a época anterior à convivência com os brancos; o período de aproximação dos Yaminawa aos patrões brancos e vice-versa; a intervenção da Funai na comunidade em 1975 – data em que o órgão indigenista foi criado no Acre; o ciclo da borracha; a formação do etnômio Yaminawa; além de fábulas indígenas sobre a Amazônia e os Incas, por exemplo. A mitologia Yaminawa é apresentada na terceira parte. Sáez descreve o corpus de mitos, as condições em que foi compilado e algumas linhas gerais para classificá-los. Depois, trata de temas como a construção da sociabilidade e o papel da afinidade. E, por fim, aborda a historicidade e a temporalidade Yaminawa e reflete sobre o papel e o valor dos mitos. O anexo da obra apresenta um resumo de diversos mitos, que servem como ilustração. O nome e o tempo dos Yaminawa é um estudo situado na confluência da História com a Antropologia. É a história de um pequeno grupo humano, escrita a partir de uma documentação secundária e pouco expressiva e dos relatos locais, porém que busca a visão que seus herdeiros têm dessa história, e ainda o papel que essa visão exerce na vida social – um ser, um ver e um fazer entretecidos. Sobre o autor – Oscar Calavia Sáez é doutor em Antropologia Social pela USP e obteve o pós-doutorado no Centre National de la Recherche Scientifique, CNRS, França. É membro do Conselho de Administração da Societé des Americanistes; pesquisador associado da Equipe de Pesquisa em Etnologia Ameríndia do CNRS; membro do Conselho Acadêmico do Master em Estudos Ameríndios da Universidade Complutense-Casa da América de Madri; e professor-adjunto do Departamento de Antropologia da Universidade Federal de Santa Catarina. Título: O nome e o tempo dos Yaminawa: etnologia e história dos Yaminawa do rio Acre

terça-feira, 1 de julho de 2008

Rebentos, Rebanhos e Marias Redentoras [eleições na UFAC]


*Por Gerson Albuquerque



"Flutuando como água... você vai em frente com rapidez, jamais
enfrentando a corrente nem parando o suficiente para ficar estagnado
ou se grudar às margens ou às rochas - propriedades, situações
ou pessoas que passam por sua vida -, nem mesmo tentando agarrar-se
a suas opiniões ou visões de mundo, apenas se ligando ligeiramente, mas com
inteligência, a qualquer coisa que se apresente enquanto você passa e depois
deixando-a ir embora graciosamente sem apegar-se..."
(Lao Tse, citado por Zygmunt Balman, Vida Líquida, 2007; 11)



A Universidade Federal do Acre vive, mais uma vez, um clima de disputas e divisão interna entre grupos que se digladiam pelo controle da reitoria e, portanto, do mais alto Cargo de Direção dessa Ifes. Característico do processo em curso, no entanto, tem sido o grande empenho com que as professoras que lançaram suas candidaturas, seus articuladores e apoiadores têm se debruçado na definição e/ou ampliação de um leque de alianças - é assim que se fala na política partidária - que defina a eleição antes da eleição, sem discussão ou na base do reflexo que cerceia a reflexão, numa clara demonstração de que o interesse maior, nem de longe é com a universidade.

A queima de fogos de artifício e congratulações a cada nova adesão entre os dois principais grupos, até o momento interessados na "gestão da Ufac", o lançamento formal e informal de candidaturas a reitor(a) e a vice-reitor(a), bem como a "partilha" dos cargos de pró-reitores pelo critério da correlação de forças internas aos grupos, o curioso surgimento de camisetas, bottons, adesivos, folders, faixas, banners, balões coloridos, entre outros, em um contexto onde sequer foram definidas e publicadas as regras eleitorais com critérios claros e democráticos, universo de votantes, natureza do voto, locais das sessões, Comissão Eleitoral, prazos para inscrição, data da eleição, escrutínio, caráter e limites para a campanha/propaganda eleitoral, entre outros, fundamentais para nortear qualquer processo eleitoral - em especial quando se trata de instituições públicas - constituem-se, também, como um escandaloso indício de que a última coisa que interessa é a Universidade Federal do Acre.

As duas principais candidatas, seus vices e respectivos grupos, para amenizar o fato de que "o carro saiu na frente dos bois", vez em quando, se intitulam como "pré-candidatas", numa grosseira simulação da política partidária brasileira. Esquecem, no entanto, que as "pré-candidaturas" são lançadas para as convenções dos partidos que definem quem serão seus candidatos pelos mais variados e "democráticos" métodos e, fundamentalmente, seguindo as regras, condições e prazos estabelecidos para cada certame. Somente depois de cumprida essa etapa é que as candidaturas são lançadas e tem-se início a propaganda eleitoral.

Nas duas últimas semanas de junho, circularam, em formato eletrônico, as "cartas de apresentação" das duas candidatas. A primeira, assinada pela professora Margarida Carvalho, pregando mudanças, embora a professora em questão tenha sido parte constitutiva da atual gestão - nos últimos quatro anos - e, o que é inexplicável, sem ter dito uma única palavra, uma mísera manifestaçãozinha pública de descontentamento ou discórdia quanto aos rumos da instituição ou das práticas, palavras e atos de seus gestores, da qual a mesma integrou seu primeiro escalão à frente da Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação.

A segunda, assinada pela professora Olinda Batista - também integrante da atual gestão na condição de vice-reitora -, ancorada no estapafúrdio slogan "para avançar mais", subestima nossa capacidade de ver e sentir as coisas. Avançar o que? A adesão da Ufac aos programas de desmonte da universidade pública, levado a cabo pelo governo Lula da Silva, a exemplo do Reuni? Avançar no silenciamento dos fóruns de deliberação interna de nossa instituição e na varredura do "lixo para debaixo do tapete", a exemplo dos já clássicos "erros protocolares" em certames públicos internos e externos, como o do Edital Pibic 2006-07 ou em concursos para professores e técnicos administrativos, ao longo dos últimos quatro anos?

O que provoca estranhamento é assistir como um amplo conjunto de colegas professores doutores e mestres, além de funcionários e estudantes se posicionam com naturalidade frente ao que está em curso no interior dessa Instituição de Ensino Superior, aderindo a uma ou outra candidatura, assumindo os símbolos, slogans e signos de suas campanhas, sem tecer comentários ou reflexões sobre seus significados. É como se o lançamento de candidaturas com suas propostas "salvacionistas", ancoradas na distribuição de camisetas, adesivos, bottons, folders, cartas e a colagem de faixas e banners fosse a coisa mais natural do mundo. Mais ainda, como se isso fizesse parte de nossos pressupostos mentais, nossas possibilidades de compreensão e posicionamento no mundo.

No mínimo, valeria a pena um questionamento público sobre a origem dos recursos que anunciam e vendem como "produtos de última geração", candidaturas de um processo que sequer foi instalado pela devidos órgãos deliberativos da instituição. Qualquer estudante da Ufac que se proponha realizar uma atividade de arrecadação de fundos, como vender bilhetes de rifas para organizar "festa" de formatura, comprar uma bicicleta para o colega que não tem como se deslocar até o campus universitário, participar de um congresso fora do Estado ou publicar um informativo de seu Centro ou Diretório Acadêmico, sabe o quanto é difícil conseguir a colaboração voluntária de professores e técnicos, mesmo quando o preço da rifa é de um real.

Na Ufac, em outras eleições, articulações e "ajuntamentos" de grupos e interesses sempre existiram, mas as candidaturas eram lançadas com base em processos definidos e de acordo com regras públicas e previamente estabelecidas, como em qualquer outra eleição. Desta feita, porém, as coisas tomaram outros rumos e as cartas das "pré-candidatas", paradoxalmente firmadas na condição de candidatas, atestam o afã e a ansiedade de se definir tudo por outros caminhos, subordinando os mais importantes órgãos de deliberação da instituição à condição de meros "homologadores" de articulações, acordos e decisões de outras instâncias, algumas delas obscuras e alheias ao cotidiano e a realidade acadêmica.

Em abril de 2008, lançamos um manifesto pelo voto paritário, como elemento inicial para a reflexão sobre a sucessão na reitoria. Esse documento envelheceu precocemente. Não pela falta de coerência em seus argumentos e tese central, posto que ainda acreditamos que o voto paritário é a melhor alternativa em processos de eleição para reitor. No entanto, a honesta opinião pública do professor Ronaldo Melo e a conveniência como essa questão passou a ser tratada, aliada ao fato de que a quase totalidade dos envolvidos nas discussões sobre a sucessão na reitoria estavam e estão voltados para a definição de nomes e blocos eleitoreiros, deixando a reflexão sobre a atual situação e os rumos da universidade para último plano, nos levaram a priorizar uma outra discussão e colocar outras questões para o debate: qual universidade queremos? Voto paritário para que? Para, plebiscitariamente, homologar candidaturas de ocasião? Para manter a Ufac omissa frente aos grandes problemas que atingem as populações que vivem nessa parte da Amazônia? Para continuarmos seguindo à risca os pacotes e portarias governamentais que desmontam a universidade pública no Brasil? Para ampliarmos o fosso que nos separa da sociedade e da defesa de um mundo mais justo, igualitário e livre para todos? Para "avançar mais" na prática de tratar o "outro", o "diferente", o "anormal", como incapaz e destinarmos a ele nossa "fraternidade piedosa" e nossa "tolerância" em recebê-lo como "igual" em nossos ambientes de "normalidade" e "racionalidade"?

Creio que as atuais candidaturas a sucessão do professor Jonas Filho na reitoria da Ufac nada têm a nos dizer, na proporção em que não apenas suas trajetórias recentes foram de silêncio e omissão frente aos inúmeros ataques sofridos pela universidade, mas, principalmente, porque partem da mesma lógica de apego a cargos de mandos e desmandos na administração pública e de tratar como dispensáveis as instâncias deliberativas e a prática do debate aberto, público na definição de processos e certames no interior dessa instituição.

Quem esteve participando da última greve da categoria de professores, em 2005, uma das mais difíceis e conturbadas da história do movimento docente, deve lembrar o quanto as duas reitoráveis foram "democráticas" em diferentes momentos dos mais de cem dias de paralisação: a pró-reitora fingindo-se de "surda" e "desentendida" frente às decisões de nossas assembléias no tocante ao funcionamento de programas interinstitucionais e ações de pós-graduação e pesquisa; a vice-reitora tocando em frente a participação da Ufac na "ressurreição" do nefasto Projeto Rondon, herança da ditadura militar, completamente a margem do debate e das decisões dos órgãos colegiados.

Mas que importância tem o passado, mesmo que ele não seja tão passado assim? A incrível forma como colegas professores, com históricos procedimentos e opiniões no interior da Ufac, se articulam nos mesmos blocos e grupos com outros colegas professores, cujos procedimentos e opiniões são completamente diferentes e mesmo antagônicos aos seus, nos faz pensar que tempos mais sombrios virão pela frente.

A palavra "democracia", desgastada e esvaziada de significados, está sendo utilizada como um clichê para ocultar que nossas escolhas no processo que ainda vai se instalar, não obstante aos choques de vaidades e sentimentos durante as reuniões do Conselho Universitário, já estão definidas. Não importa a natureza do voto: se proporcional com o "generoso" peso de 70% para os docentes, se proporcional paritário ou se universal, a palavra de ordem será: façam suas escolhas na candidatura 1 ou na candidatura 2. Porém, não devemos esquecer que elas já estão escolhidas e lançadas, independentemente das regras, da natureza do voto, dos prazos, do universo de eleitores e votantes, das propostas e da própria sobrevivência da universidade pública, gratuita e de qualidade.

Diante de nós, o horizonte e seus desafios. Muitos escolheram o caminho das "ligações frouxas", incorporando aqui as reflexões do sociólogo polonês Zigmunt Bauman, em seu livro "Vida Líquida", onde "compromissos revogáveis são os preceitos que orientam tudo aquilo em que se engajam e a que se apegam". Para eles, as experiências e as lições da vida vivida no interior da Ufac - no passado e no presente - de nada valem: "avançar mais" é "possível". "Acredite" nisso, mesmo sem saber para onde você está "avançando" - ou se está mesmo "avançando" - e na companhia de quem.

No horizonte, a redenção virá pelas mãos femininas. As redentoras, como resultado de uma alquimia que funde "diferentes" credos e interesses, tornaram-se "puras" e "predestinadas" a "civilizar" a "barbárie". Os rebentos salvadores são projetos orquestrados milimetricamente para contemplar os agregados e agradar aos próprios ouvidos e aos ouvidos dos eleitores e votantes. Estes, tratados como rebanhos ouvirão sons em a-cor-des da re-pe-ti-ção ininterrupta dos slogans e palavras de ordens que deve lhes propiciar "bem estar", enquanto seguem conformados e felizes seus pastores - intermediários entre eles e as redentoras. Os olhos dos que se deixarem tratar como rebanhos, ávidos de desejos - como diria Drumond - nada deverão questionar e se inundarão com as cores de fantasmagóricos lançamentos de candidaturas que, como se estivessem sobre esteiras para exames ergométricos, correrão a plenos pulmões para provar que são saudáveis, mas sem sair do lugar.


Aos que não se dobram frente ao cômodo "quem não tem cão caça com gato" - sabedores como inúmeras mulheres e homens amazônicos que existem "mil maneiras de caçar" - cansados de repetir a máxima do "esmagai a infâmia" de Voltaire, restará manter a dúvida e a capacidade de dizer não, cientes, mas sem se desesperar como Stefan Zweig que "a cada dia surgirão infâmias piores que as do dia anterior".


*(Gerson Rodrigues de Albuquerque, professor do Centro de Educação, Letras e Artes da Ufac, Rio Branco - Acre, 30/06/2008)