quarta-feira, 29 de julho de 2009

O princípio da impessoalidade na administração pública no Acre.

Dalmir Rodrigues Ferreira 22/07/2009, membro do Conselho Estadual de Cultura.

Um dos princípios constitucionais que regem a Administração Pública que mais precisa ser observado no nosso Estado é sem dúvida o princípio da impessoalidade prevista no artigo trinta e sete da Constituição Federal. Impessoalidade essa que se apresenta em duas vertentes: primeiro, proibir que os agentes públicos se valham da coisa pública (vale dizer, do dinheiro público e dos bens públicos) para fins de promoção pessoal e segundo, impedir que os agentes públicos concedam privilégios a poucos em detrimento do interesse geral da coletividade.

O objetivo dessa breve introdução é contextualizar, neste artigo, sob a ótica da Constituição, a (in) validade jurídica da prática brasileira, e, principalmente no Acre, do vício da atribuição de nomes de pessoas vivas a bens públicos. Trata-se de uma conduta reiterada, a pretexto de homenagem a pessoas que prestaram ou ainda prestam relevantes serviços à coletividade.

Considerando-se que o parágrafo primeiro do artigo trinta e sete da Constituição Federal estabelece que a publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas de órgãos públicos devem ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos, considerando também que o intuito daquele comando constitucional é o de evitar a promoção pessoal seja de autoridade ou de servidores públicos de sorte que o regramento está vinculado à atividade, ao exercício de cargo ou função.

Alem do que, o poder público já dispõe de diversas outras formas de realizar homenagens, que, aliás, quase sempre se traduz em auto-homenagem. Os entes públicos, já possuem as suas comandas honoríficas, que representam uma forma criativa e inteligente de se homenagear sem qualquer ferimento aos princípios constitucionais e sem aviltamento à impessoalidade administrativa.

Nesse contexto a Biblioteca da Floresta Ministra Marina Silva, criada em nov/2008 se constitui num exemplo gritante de propaganda política e flagrante desrespeito a constituição, constituindo-se num crime de responsabilidade, que ao perdurar desde sua criação, denota o grau de cidadania de nossa população, sempre indiferente aos abusos que vão sendo impostos, mormente àqueles a quem compete objetivamente a vigilância e o cumprimento do processo democrático.

Essa postura agride frontalmente o princípio constitucional da impessoalidade na Administração Pública. Os bens e logradouros públicos não podem ser denominados com o nome de pessoas vivas, pois é um comportamento que “pessoaliza” a coisa pública, fazendo da homenagem um modo de promoção pessoal ou propaganda eleitoreira que se realiza às custas do patrimônio que pertence à coletividade, que ao final nem faz homenagem, não tem caráter educativo, informativo ou de orientação, faz sim, e bem visivelmente, uma eficiente propaganda política ilegal, que se constitui efetivamente num crime contra a determinação constitucional.

A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverão ter caráter educativo, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridade ou servidores públicos. “Não se trata de questionar o mérito ou demérito dessas pessoas, o que a lei quer evitar é justamente a indevida promoção pessoal de pessoas vivas com utilização de finanças e bens públicos”.

Observe-se também que os emblemas da administração do governo são hoje transformados em bens perenes, ou seja, são colocados de forma permanentes, em locais que também são irregularidades, pois em regra, os emblemas não deveriam ter essa utilização, uma vez que é necessária que se faça uma distinção entre estado e governo. O brasão do estado se tornou uma coisa quase desconhecida pela população, pois o que se massifica são os emblemas de partido ou de governo.

Em Rio Branco até mesmo nas calçadas estão impressos em baixo relevo bem visíveis, com o símbolo do partido na prefeitura, prática que se aplica também aos prédios públicos com símbolos impressos em bronze ou em metal de forma perene o que efetivamente parece não ser uma conduta regular. As mudanças recentes de nomes de praças, ruas, sem qualquer consulta pública, ou critério, bem como o batismo pomposo de espaços com nomes que atendem a uma inegável campanha eleitoral, em nada educam, pelo contrário denotam o respeito pela população que o poder vai impondo de forma ilegal e criminosa, sem que se ouçam vozes discordantes.

Parentes do governador chegam a ter o nome em até mais de um espaço público, enquanto outros que nada têm a ver com o espaço a que dá o nome, são festivamente colocados, como a lembrar a comunidade que ela não tem ainda pessoas que mereçam qualquer homenagem desse porte e, sobretudo que ela, a comunidade, está satisfeita com isso. Chega-se ao cúmulo de se buscar alhures, nomes de famosos ou globais que mal tiveram tempo de nascer aqui e cuja única contribuição para o estado foi ter ido embora mais cedo. E se isso é pra dar caráter educativo, subentende-se que o que se quer ensinar é que melhor é ir embora.

Nesse contexto que bem nos lembra o velho Stálin da extinta União Soviética, chega-se ao cúmulo de apagar nomes consagrados para atender a megalomania governamental cujo maior mérito é a esperteza e a sanha na busca de se perpetuar no poder a qualquer custo onde artigos como esse, podem denotar mais insensatez do que cidadania, tal é a prepotência e a certeza de impunidade dos nossos poderosos, ou será que esta é a verdadeira face da florestania?

O ESTADO DE SÃO PAULO (30 de dezembro de 1989) - Quem Matou Chico Mendes?

QUEM MATOU CHICO MENDES

Revista Veja - 04 de Janeiro de 1989 - Assassinato de Chico Mendes

Chico Mendes - Revista Veja - Jan 1989

REVISTA VEJA - 11 de janeiro 1989 - Assassinato de Chico Mendes

REVISTA VEJA - Acervo Digital

sábado, 25 de julho de 2009

Ciência anuncia 250 geoglifos descobertos no Acre

http://www.agencia.ac.gov.br/index.php?option=com_content&task=view&id=9715&Itemid=26
Edmilson Ferreira 24-Jul-2009 Geoglifos foram construídos há mais de 2000 anos (Foto: Diego Gurgel/Divulgação) Os pesquisadores Alceu Ranzi e Denise Schaan anunciaram nesta sexta-feira, 24, a identificação de vinte novos geoglifos no Vale do Acre, elevando para 250 o número de estrutura catalogadas em Senador Guiomard, Rio Branco, Xapuri, Plácido de Castro, Acrelândia e Epitaciolândia. Algumas ocorrências foram registradas também em Sena Madureira, Bujari e Epitaciolândia. Acrelândia possui grande potencial de pesquisa e identificação.
"Teremos novas escavações em 2010”, informou Schaan. As últimas escavações fizeram uma descoberta importante em Xapuri: um buraco de esteio em boas condições foi localizado em um geoglifo de formato redondo, reforçando a tese de que os índios daquela época poderiam ter usado fortificações paliçadas para habitação e segurança.
Geoglifos são sítios arqueológicos em estrutura de terra construídos há cerca de 2.000 anos e que pela complexidade remontam à civilizações pré-colombianas de elevado grau de conhecimento em várias áreas e domínio de avançadas técnicas de movimentação de terra e água. As pesquisas, de acordo com a arqueológa Denise Schaan, integrante do Grupo de Pesquisa Geoglifos da Amazônia, tem envolvido rastreamento em imagens de satélites cedidas pela Fundação de Tecnologia do Acre (Funtac), sobrevôos e visitas de campo, quando os sítios são mapeados, fotografados e por vezes materiais arqueológicos são coletados para análise. Com o resultado dos trabalhos realizados, já existem alguns acadêmicos que estão desenvolvendo monografias de graduação e especialização sobre os geoglifos do Acre.
Coordenado por Schaan, que é também presidente da Sociedade de Arqueologia Brasileira, o grupo de pesquisa registrado no CNPq com o nome de “Geoglifos da Amazônia Ocidental” vem desenvolvendo desde 2005 pesquisas intensivas sobre os geoglifos no Estado, com o objetivo de fazer um amplo levantamento dos geoglifos na parte Leste do Acre.
Os geoglifos fazem parte de uma lista do Instituto Nacional de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) para recomendar à Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco) o tombamento dessas estruturas como patrimônio cultural da humanidade, assim como as Pirâmides do Egito e as Ruínas de Machu Pichu, no Peru, entre outros exemplos.
O GGAO vem distribuindo folhetos explicativos aos moradores das áreas onde a pesquisa é feita a campo. Em outros lugares do mundo existem estrutura gigantescas que podem ser vistas do alto, como as linhas de Nazca, no Peru. Existem também estruturas de terras defensivas e estradas no Alto Xingu e colinas de terras e lagos artificiais construídos na Ilha do Marajó por civilizações pré-colombianas. Mas os geoglifos ocorrem apenas na Amazônia Ocidental. Por serem únicos, tem o potencial de atraírem a atenção de pesquisadores e visitantes de todo o mundo.
Um geoglifo é uma marca na terra que, por suas dimensões, só é percebida completamente do alto. Na parte oriental do Acre, tem sido encontradas essas estruturas de terra em formatos como círculos, retângulos, hexágonos e outros. Essas estruturas compõem-se de uma vala de um a três metros de profundidade, escavada no solo argiloso, e de uma mureta externa formada pela deposição do solo escavado. O desenho impresso no solo possui entre 100 e 300 metros de diâmetro.
O grupo de pesquisa conta com apoio do CNPq, Governo do Estado do Acre, universidades Federal do Pará e Federal do Acre, Instituto Íbero-Americano da Finlândia e Biblioteca Marina Silva.

segunda-feira, 20 de julho de 2009

http://blogdoacreucho.blogspot.com/

FONTE: http://blogdoacreucho.blogspot.com/ A entrevista do Carioca ao Jornalista Luiz Carlos Moreira Jorge é um celeiro de coisa que a gente é obrigado a comentar, coisas “não ditas” que ficam nas entrelinhas, escondidinhas pra não serem divulgadas. Do Jornal A Tribuna Carioca: Com a crise econômica, o Acre perdeu R$ 67 milhões em arrecadação, isso pesa negativamente na hora de falar de salário. Fizemos tudo o que está ao alcance do governo, pois este é o último ano de negociação salarial, 2010 é eleição e a lei proíbe. Avançamos para um salário mínimo de R$ 525 de forma imediata, valor que em julho de 2010 chegará a R$ 560. Nem o novo salário-mínimo a ser fixado pelo Lula chegará a esse patamar. Acreucho: A crise econômica que cita o Carioca parece não ter afetado as “obras” no Acre. Não seria uma opção retrair um pouco as obras ao invés de comprimir os salários dos funcionários? Tenho certeza de que um “controle de qualidade” das obras feitas por aqui, com isso diminuindo os consertos que tem que ser feitos pelo governo, seria mais que suficiente para compensar esse desequilíbrio orçamentário. São estradas, ruas, parques, praças, avenidas que se deterioram constantemente e têm que estar sendo consertadas. Tem obras que ainda nem foram inauguradas e já estão deterioradas. Mas, a gente sabe que as obras não são afetadas porque o governo tem um “cronograma” a cumprir com as empreiteiras parceiras. Carioca: A violência de fato aumentou. Vamos ter que botar polícia na rua. Nos grandes centros, numa rua, numa esquina, sempre se nota um policial como referência, está faltando isso no Acre. Ficou acertado que nos pontos de saturação, onde acontecem mais casos de assaltos, furtos e roubo, será colocado mais policiamento ostensivo. O banco de horas pode ajudar a remanejar mais de 500 policiais de folga para a execução deste plano. Isso será mais uma motivação financeira. Acreucho: Bem, antes de qualquer coisa, eu disse aqui neste blog que, “ninguém fazia nada para diminuir a violência imediatamente”, “porque estão esperando o tempo certo”. Carioca fala de um futuro próximo. Binho outro dia deu prazo até sete de setembro, mas, acho que vai mais além. Só serão tomadas realmente providências concretas, quando elas puderem ser lembradas e tiverem influência na próxima campanha eleitoral. Carioca: ... Existe um plano que será executado para combater as drogas. A situação é grave. O Acre deixou de ser corredor para ser consumidor. Estamos perto do Peru e da Bolívia, os maiores produtores de cocaína no mundo. Acreucho: Novamente Carioca coloca o verbo no futuro. O Acre não deixou de ser corredor, é mais do que nunca, com a inauguração das novas rodovias e a “integração” com Bolívia e Peru. Notícias dão conta de que Evo Morales está trazendo “agricultores”, segundo dizem na verdade um bando de desocupados de La Paz, pra plantar coca na divida da Bolívia com o Brasil. Em sendo isso verdade, alguém duvida que em breve teremos no Acre, plantações de coca? Carioca: Os delegados querem isonomia com os defensores públicos. O Binho topa discutir. Isso colocaria o inicial de um delegado em R$ 8 mi e o teto final em R$ 16 mi. Só que nesta discussão vai ser embutida a gestão. Não pode continuar um delegado ser procurado na delegacia e não ser achado. Para melhorar a gestão, o governador Binho irá contratar 33 novos delegados de polícia. Acreucho: Não é absurdo que os delegados queiram isonomia com outros servidores com seu mesmo currículo escolar. O que acho absurdo é que assessores que não fazem coisa nenhuma, a não ser estarem debaixo das asas do poder, ganhem igual a quem enfrenta a bala do bandido nas ruas. Carioca: É o grande problema do governo Binho, que está jogando pesado para resolver. Não vamos deixar essa herança para o Tião Viana, que tenho certeza de que será o próximo governador. A Márcia Regina está no cargo para fazer mais a parte de contatos com a Justiça e com o Ministério Público. A parte operacional ficará a cargo do delegado Emilson, que trabalhará com a Márcia para implantar esse modelo novo, que não pode repetir o erro de ficar sempre correndo atrás de bandido. Isso exige mentes mais arejadas que esqueçam o modelo antigo, que não está dando certo. O Walter Prado é ouvido porque tem experiência de anos na função, é um parceiro, mas o Binho não cogita tirar a Márcia, que acho que faz um bom trabalho. Acreucho: Concordo com o Carioca, Márcia Regina é o grande problema do governo Binho. Não tem sido eficiente, não sabe como resolver o problema da violência e misteriosamente está “cimentada no cargo”. Com uma canetada, Binho pode resolver isso “se quiser”, porém, parece que como em Brasília, Janio Quadros tinha suas “forças ocultas”, Binho também as tem por aqui. Carioca está errado. Não conheço outro modo de combater a violência a não ser “correr atrás dela”, de dentro de gabinetes não se consegue combater a violência e Márcia Regina de maneira alguma tem feito “um bom trabalho”, pelo menos é a opinião da maioria da população com quem a gente conversa. Carioca: Em eleições, não se pode ter arrogância, mas não assusta de modo algum. A oposição sabe que perderá em 2010 ou não teria lançado seu time reserva com o Tião Bocalon e o Rodrigo Pinto para disputar com o Tião, e deixado no banco as suas mais fortes lideranças, o Flaviano Melo e o Márcio Bittar. Time que pensa em ganhar não coloca reservas. Acreucho: Só se Márcio e Flaviano fossem loucos para tentar disputar as próximas eleições para o governo. No momento em que se cogitar isso, Jorge Viana volta e seria uma tentativa inútil da oposição. Dizendo que não se deve ter “arrogância” em eleições, Carioca já o foi dizendo que a situação (FPA) não está assustada. Tanto está que as brigas internas já começaram. Mesmo com Bocalon disputando, já se cogita de fonte segura, que Jorge Viana seria o candidato, pra assegurar a vitória. Carioca: O Jorge Viana foi muito feliz em adotar esse modelo. O problema da oposição é que defende modelos que agridem o meio-ambiente, como os de Rondônia e de Mato Grosso do Sul, mas tem vergonha de assumir isso publicamente. Hoje, não tem mais lugar no mundo para quem não seguir o modelo de preservação ambiental. A oposição não tem um programa de governo próprio, como alternativa a Florestan ia. Acreucho: Somos 27 estados neste Brasil. O Acre é o único que “se preocupa” com a defesa do meio ambiente. É o paladino da Justiça, da Ética e da Moral. Enquanto isso os cacaineiros invadem nossas fronteiras, nosso povo morre nas matas de malária e dengue, nossas crianças brincam nos esgotos, enorme parte de nossas famílias vive do assistencialismo governamental, a periferia de nossas cidades se enche de pessoas que fogem das matas impulsionados pela fome e pelas agruras ambientais, vítimas do tão sonhado “manejo sustentável” que não existe e não funciona, políticos, apaniguados, amigos e empresários ligados ao governo enchem os bolsos de dinheiro, a marginalidade assola nossas cidades com uma violência sem limites, nossos jovens não têm onde trabalhar, nossas crianças se prostituem, nossos doentes são maltratados em postos de saúde e hospitais, a educação é só um arremedo de ensino... “tudo isso acontecendo e nós, nas praças ou na Gameleira, dando milho aos pombos”. Precisamos sim, preocupar-nos com o meio ambiente, sem o qual não sobreviveríamos, mas, a preocupação da FPA não é essa, é preservar a qualquer custo, pois, não vivem onde vive o nosso “homem das matas” e dessa preservação dependem os acordos feitos com organismos internacionais de financiamento que lhes garante a permanência no poder. Carioca: Se é um político que só pede favores pessoais, desse tipo de político, nós não gostamos. O vereador Cabide (PTC) chegou outro dia e me entregou 94 currículos para empregar esse pessoal na Prefeitura. Fazer o quê? Claro que não será atendido. O Binho é atinente aos grandes problemas do governo. Eu sei que muitas vezes o político não tem como escapar dos pedidos dos eleitores, isso ocorre em todo Brasil, não é só no Acre, mas não podemos entrar no modelo da política individual. Acreucho: O Cabide é um problema que o próprio governo criou, para ele mesmo. Não tem do que reclamar. A pior declaração do Carioca foi: ... “mas, não podemos entrar no modelo de política individual”. Sinceramente esta declaração é hilária. É só o que o PT pratica, haja vista a maneira como trata até seus “aliados”. Tudo na FPA é um projeto pessoal, dos que estão no poder. O slogan diz tudo: Florestan ia. A cidadania e o cidadão não têm vez. Carioca: O senador Tião Viana (PT) é o favorito. Aprendeu muito com sua passagem pelo Senado. A questão do celular foi um erro que reconheceu, mas pagou, não causou nenhum prejuízo ao Senado. E olhe que reviraram toda sua vida e não acharam nada. Veja o que está acontecendo com o Sarney. O Tião tem liderança. Não tenho dúvida de que será o próximo governador do Acre. Sobre o Binho, desde que assumiu o governo, disse que não seria candidato a nada depois do mandato. Mas é um nome a ser discutido em 2010 para a Prefeitura. O Flaviano Melo se elegeu a prefeito de Rio Branco em cima do que fez no governo Acreucho: Declaração justíssima: Tião Viana “aprendeu “muito” com sua passagem pelo Senado”. Com certeza! O caso do celular não tem nada a ver com os 14 mil da conta, sem trocadilho, o que conta é a irresponsabilidade dele. O difícil vai ser o Binho querer ficar fora do poder. “Quem nunca comeu mel, quando come se lambuza”.

IMAGENS. Território Federal do Acre (1946-48)

IMAGENS. Território Federal do Acre (1946-48)

Geografia do Acre - Apostila PROVÃO

os aspectos geográficos e ecológicos da Amazônia A Amazônia brasileira, com uma área de 260 milhões de hectares, formada pela bacia do rio Amazonas, possui um clima tropical equatorial, com altas precipitações, umidades e temperatura elevada. A Amazônia Brasileira, chamada de Amazônia Legal, é sete vezes maior que a França e é formada pelos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins e ainda parte do Maranhão, sem falar que a Amazônia ainda está presente na Colômbia, Venezuela, Equador, Peru, Bolívia, Guiana Francesa e Suriname. O solo O solo da Amazônia é bastante úmido, devido aos constantes chuvas na região, e pobre de nutrientes. Sua fertilidade é bastante reduzida, estando situada na camada de cima, numa profundidade 20 a 30 centímetros. Em áreas cobertas pelas florestas o empobrecimento do solo é menor, devido à cobertura das árvores que protegem o solo da erosão causada pelas chuvas, e também devido a decomposição de matéria orgânica. aspectos geográficos e ecológicos do acre Com uma área de 152.589 km2.o Acre, representa 3,16% da Amazônia e 1,79% do território nacional. Está localizado na parte mais ocidental do Brasil, no sudoeste da Amazônia, e faz divisa com os estados do Amazonas e Rondônia. Em nível internacional, o Acre faz fronteira com a Bolívia e Peru. Em relação a Greenwich, o Acre está no 5º fuso horário e no 2º em relação à Brasília (2 horas a menos). Regiões As duas grandes regiões do Acre são: JURUÁ - Banhada pelo rio Juruá - Essa região compreende os municípios de Cruzeiro do Sul, Mâncio Lima, Porto Valter, Marechal Thaumaturgo, Jordão, Feijó e Tarauacá. PURUS - Formada pelos municípios de Rio Branco, Sena Madureira, Manoel Urbano, Santa Rosa do Purus, Bujari, Assis Brasil, Brasiléia, Xapuri , Plácido de Castro, Senador Guiomard, Porto Acre, Acrelândia, Campinas, Capixaba e Epitaciolândia, tendo como principal rio o Purus. Clima O clima do Acre é tropical, caracterizado como quente e úmido, com uma temperatura de 22º a 26º C, com leves mudanças e variações do tempo. Relevo O Acre é formado por uma larga planície com forma plana e moderadamente ondulada, as chamadas depressões. Possui um platô de rochas sedimentares, onde predomina o arenito. Seus terrenos são formados de argila e areia, com afloramento de piçarras. Florestas Predominam na vegetação acreana os seguintes tipos de florestas: FLORESTA LATIFOLIADA PERENE - É densa e sempre verde, as espécies de árvores que formam este tipo são: castanheira, aguano, cedro e seringueira, entre outras. É também conhecida como floresta de terra firme. FLORESTA RIBEIRINHA - Localiza-se às margens dos rios e apresenta menor quantidade de espécies e menor tamanho. Também é conhecida como floresta de várzea CAPOEIRA - Ocorre em áreas que geralmente apresentam um mato ruim e que estão passando por crescimento natural. formação econômica do acre O primeiro surto da borracha A partir da segunda metade do século XIX, os seringais da Amazônia, fornecedores de um líquido branco, denominado látex, começaram a ser explorados no sentido de atender o mercado europeu. Este primeiro surto da borracha se deu por volta de 1870 a 1912, em decorrência do grande avanço da indústria automobilística. A borracha da Amazônia passou a ser comprada pela indústria internacional, no sentido de atender a fabricação dos pneus Dunlop. Durante este primeiro surto, teve início a migração nordestina . O número de nordestinos que vieram para a Amazônia entre 1812 a 1890 foi em torno de 54.000 indivíduos que vieram em virtude da grande seca, mas também influenciados pelo desejo de riquezas. Os cearenses preferiram a região acreana em decorrências das ricas seringueiras, existentes nessa região, que continham um ótimo látex (leite) de boa qualidade e principalmente porque possuía grandes áreas de seringas desocupadas. Os nordestinos, no Acre, sofreram todo tipo de violência para instalarem-se na floresta acreana, enfrentaram a ganância dos seringalistas, além de doenças e animais. Os primeiros seringais amazônicos foram criados às margens do rio Tocantins. A crise do primeiro surto A crise do primeiro surto da borracha, se deu a partir de 1913, quando a indústria estrangeira começou a receber borracha de melhores qualidades, devido à racionalidade de exploração e, acima de tudo, muito mais barata. Isto se deu em decorrência de plantios efetuados por ingleses na Malásia. Esse plantio foi oriundo de mudas que um inglês chamado Henry Wickman, em 1877, levou para a Malásia, de onde foram preparadas mudas e em seguida plantadas em série, uma atrás da outra, que facilitava a obtenção do produto, haja vista, não ser preciso aos trabalhadores, enveredarem por dentro da mata fechada, por quilômetros até chegar a uma seringueira, como acontecia aqui na Amazônia. A Inglaterra, com isso, deu início a um cultivo de seringueira, usando técnicas em seus seringais. A partir daí, a indústria estrangeira começa a receber uma borracha mais barata do que a borracha da Amazônia. Com isso estava definitivamente quebrado o monopólio da borracha da Amazônia. A crise Com a crise da borracha amazônica, o Acre teve suas rendas financeiras diminuídas. Muitos seringais foram abandonados e os seringueiros tiveram a chance de voltar para o nordeste, os que ficaram foram obrigados a trabalhar nos diversos ramos da agricultura. As medidas governamentais não conseguiram evitar a falência de muitos seringalistas. A falência comercial As duas cidades da região norte, que viveram momento de glória com a produção de goma elástica Amazônica, tiveram que enfrentar a cruel falência de seus comerciantes de borracha. As cidades de Belém e Manaus, começaram a sentir os efeitos econômicos, já que os seringalistas já não gastavam mais enormes quantidades de dinheiro nessas duas cidades. O segundo surto da borracha Aprendendo a conviver com a crise da borracha desde 1913, o Acre não esperava ser novamente o grande exportador do produto para as grandes nações como Estados Unidos e Inglaterra. Mas aconteceu o que não era esperado. O Acre tornou-se novamente o grande exportador de látex para estes países, entre os anos de 1942 e 1945, período que aconteceu a chamada batalha da borracha durante a Segunda Guerra Mundial. Foi a época em que se dirigiram para o Acre, milhares de nordestinos, conhecidos hoje, como soldados da borracha. O acontecimento da Segunda Guerra Mundial, entre 1939 e 1945, fez com que o Acre voltasse a ser novamente um grande exportador de borracha, dessa vez para atender os interesses dos americanos, ingleses e franceses na guerra contra os alemães. O Japão que lutava a favor da Alemanha e da Itália, tomou os seringais da Malásia, deixando com isso os ingleses e franceses sem a matéria-prima para a fabricação de armamentos e pneus, com isso os Estados Unidos, criaram programas sobre o produto e compraram a borracha da Amazônia Brasileira. Em 1942, o governo americano, assina acordo com o Brasil, o chamado acordo de Washington, voltados para aquisição da borracha amazônica, visando isso o governo brasileiro cria em 1942 o Banco de crédito da Amazônia, com finalidade de financiar a compra da borracha produzida nos seringais acreanos. O sistema de aviamento A palavra “aviamento” vem de aviar, que significa fornecer mercadoria a alguém a crédito, ou seja, sem dinheiro. Neste sistema, o seringalista, além de produtos alimentares, financiava materiais para trabalho de extrativismo do seringueiro e por sua vez o seringueiro pagava com produção de borracha. O sistema de aviamento funcionava de seguinte maneira. a - O seringueiro produzia a borracha para pagar dívidas junto aos seringalistas para as casas aviadoras de Belém e Manaus, onde parte da produção era somente para pagar as dívidas dos instrumentos e investimentos. b - Em seguida as casas aviadoras vendiam a borracha às casas exportadoras localizadas em Belém e Manaus. c - Por fim, as casas exportadoras vendiam a borracha acreana para as indústrias da Inglaterra e dos Estados Unidos. Em resumo, somente neste último estágio é que o dinheiro aparece na transação comercial. Como era formado o seringal No sistema e aviamento, o seringal era local da produção de borracha, geralmente eram instalados às margens dos rios nos lugares mais altos devido às enchentes. O seringal de propriedade dos seringalistas era formado por barracões, extensas colocações de seringas. Formação social do Acre, durante o primeiro e segundo surto Com a produção da borracha, formou-se no acre, uma sociedade dividida entre ricos e pobres. Nos seringais havia os seringalistas ricos, por serem os possuidores de todos os seringais e os seringueiros pobres e explorados. A cidade de Rio Branco, era habitada por grandes, médios e pequenos funcionários do Acre, além de militares e pequenos comerciantes, sem falar dos trabalhadores que trabalhavam no porto. A expansão da pecuária no Acre Em agosto de 1971, a SUDAM (Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia), elabora um plano para o desenvolvimento da região. Seu objetivo era implantar na Amazônia grandes fazendas de gado em favor dos ricos empresários. Com isso o Governo Federal cortou os incentivos aos seringalistas e os empréstimos financiados pelo Banco de Créditos a Amazônia, foram suspensos. Para os seringalistas, só existia uma solução: vender seus seringais para os agropecuaristas do eixo centro-sul. As terras compradas foram transformadas em fazendas de gado. Essa postura adotada pelo Governo Federal significava uma interpretação de economia que discriminava o extrativismo por considerá-lo um atraso. Porém a história nos mostra que foi um erro, haja vista, que os problemas ambientais causados por atividades predatórias, causaram sérios problemas econômicos e sociais, exemplo claro, foi a expulsão dos seringueiros para a cidade, ocasionando um grande inchaço urbano. o processo de anexação do acre ao Brasil A quem pertenceria o Acre Todos os movimentos armados ou diplomáticos pela posse do Acre, findando com o Tratado de Petrópolis, assinado entre Brasil e Bolívia, foram motivados pela riqueza de borracha existente na floresta amazônica e acreana, que servia de matéria-prima nas indústrias dos Estados Unidos e Inglaterra. A riqueza em borracha no Acre, despertou grandes interesses pela região. A Bolívia que considerava o Acre como terras não descobertas, resolveu exigir o reconhecimento como de sua propriedade. A Bolívia e a exigência do reconhecimento do Acre como terra boliviana O Acre aparecia nos mapas boliviano como terras não descobertas, quer dizer, não exploradas pelo governo boliviano, que se ocupava em explorar suas ricas minas de prata, sua atividade econômica de exportação. A decisão da Bolívia em ocupar o Acre, aconteceu na Segunda metade do século XIX. Alguns fatores fizeram com que a Bolívia não ocupasse o Acre antes dos seringueiros brasileiros: a) A Bolívia mantinha como principal atividade econômica a exportação de ouro e prata, onde suas minas na região de Potosi lhe rendiam um bom lucro; b) Os trabalhadores da Bolívia estavam quase todos envolvidos nos trabalhos da minas e quase não sobravam homens que se deslocassem para a região do Acre; c) A migração dos bolivianos para a região acreana foi muito reduzida. O Bolivian Sydincate Com medo de perder a região acreana para o Brasil, a Bolívia após enviar uma grande expedição, visando averiguar uma situação, a Bolívia, através de seu presidente José Manuel Pando, tem a idéia de tentar alugar, ou seja, arrendar o Acre aos Estados Unidos. A idéia de arrendar o Acre foi proposta pelo presidente boliviano José Manuel Pando, onde propunha aos Estados Unidos que: a) O Bolivian Syndicate tinha o direito de explorar todas as riquezas existentes no Acre, por um período de 30 anos; b) O Bolivian Syndicate tinha que expulsar todos os brasileiros na região; c) A Bolívia dava direito ao Bolivian Syndicate por um período de 30 anos arrecadar qualquer tipo de imposto no Acre. Visando evitar uma guerra diplomática com o Brasil, Os Estados Unidos desfez o acordo com o governo brasileiro. O Tratado de Petrópolis Em 17 de novembro de 1903, na cidade de Petrópolis, no Estado do Rio de Janeiro, foi assinado entre o Barão de Rio Branco e Assis Brasil (Ministros Brasileiros), Fernando Guachala e Cláudio Pinilha (Ministros Bolivianos) o Tratado de Petrópolis, que tratava entre governos brasileiro e boliviano a compra das terras acreanas. Esse tratado resolvia as seguintes questões: a) Tornava o Acre brasileiro e traçava os limites definitivos entre Brasil e Bolívia; b) O Brasil obrigava-se a construir uma estrada de ferro (Madeira Mamoré) desde o Porto de Santo Antonio, no Rio Madeira, indo até Guajará Mirim; c) A Bolívia teria liberdade de transitar pela estrada de ferro Madeira Mamoré e pelos rios acreanos.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Mapa do (ACRE) Brasil, Bolívia e Peru - 1829

Este mapa, colorido à mão, da parte norte da América do Sul apareceu, originalmente, no Um Novo Atlas Geral Exibindo As Cinco Grandes Divisões do Globo,publicado por John Grigg (1792-1864), em Filadélfia, em 1829. Mostra a demarcação ainda um pouco vaga das fronteiras entre os países no interior do continente. O atlas de Grigg se baseou na obra de Conrad Malte-Brun (1755-1826), um geógrafo dinamarquês que emigrou para a França em 1799, onde produziu, em 1803-07 a obra de seis volumes Geographie mathématique, physique politique et de toutes les partes du monde (Geografia matemática, física e política de todas as partes do mundo). Em 1826, Malte-Brun concluia a Geografia Universal.O editor de Filadelphia, Anthony Finley (circa 1790-1840), produziu uma versão americana da Geografia de Malte-Brun, em 1827-29, juntamente com um atlas com 40 mapas, que foi depois reeditado por Grigg. Finley baseou seus mapas de grande parte do mundo no trabalho do cartógrafo londrino Aaron Arrowsmith, mas fez seus próprios mapas da América do Norte e do Sul. O engravador de Finley era James Hamilton Young, que nasceu na Escócia em 1793 e emigrou para os Estados Unidos em alguma época após 1800. Young mais tarde se tornou o engravador chefe do famoso editor de mapas de Filadéfia, Samuel Augustus Miller
OBSERVE NO DETALHE A REGIÃO QUE HOJE COMPREENDE O ESTADO DO ACRE.

Mapa do (Acre) Brasil, Bolívia, Paraguai e Uruguai; Mapa do Chile - 1860

S. Augustus Mitchell nasceu em Connecticut em 1790 e tornou-se um professor. Ele achou inadequado para o ensino de geografia os materiais encontrados na América no início do século XIX e após ter se mudado para Filadélfia, em 1829 ou 1830, abriu uma empresa que logo estava produzindo mapas aperfeiçoados, atlas, guias turísticos, e livros didáticos de geografia. Mitchell publicou a primeira edição do seu Novo Atlas Universal em 1846. Seu filho, S. Augustus Mitchell, Jr., assumiu a empresa por volta de 1860. Ele publicou o Novo Atlas Geral de Mitchell a partir do qual tiraram estes mapas dos cinco países Sul-Americanos. Os principais mapas foram complementados por inserções do "Porto do Rio de Janeiro," "Porto da Bahia," e da "Ilha de Juan Fernandez."Este último é o maior de um conjunto de ilhas vulcânicas, esparsamente povoadas, localizadas a cerca de 670 quilômetros no Pacífico, e parte do Chile. A fronteira decorada, como neste caso de vinhedos, que rodeiam os mapas era uma característica comum de toda publicação cartográfica Americana do século 19.
OBSERVE no detalhe a região que hoje compreende o Estado do Acre.

Biblioteca Digital da UNESCO

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terça-feira, 14 de julho de 2009

Capítulo II — O movimento autonomista e a elevação do Acre a Estado: mudanças e continuísmos.

“Quanto mais um poder dura, maior é a parte irreversível com a qual terão de contar aqueles que conseguirem derrubá-lo”. Pierre Bourdieu. 2.1 – A gênese e as várias faces do movimento autonomista acreano.
Desde a epopéia de Luiz Galvez no apagar do século XIX, e a partir dos primeiros momentos em que o Acre se constituiu como membro do território nacional, a questão autonomista foi algo que sempre se aventou como uma necessidade por certos grupos internos. Muitos autonomistas começam a se organizar, nesse contexto, no intuito de requererem um direcionamento político da “sociedade acreana” de maneira mais autônoma, que passasse preferencialmente por uma decisão final das oligarquias locais e o controle do poder executivo sendo decidido a partir de uma escolha emanada pelos auto-intitulados homens das “classes conservadoras” do Acre.
Internamente, as maiores brigas se estabeleceram entre os grupos políticos e econômicos dos vales do Acre - Purús e do Juruá. Onde neste último, ocorreram as mais fortes tentativas de contraposição à unificação departamental e intentos separatistas em relação ao vale do Acre - Purús.
Em princípio, não havia um movimento autonomista unificado e sim, vários focos autonomistas que foram surgindo ao longo dos anos: nos seus primórdios são movimentos dispersos e inconsistentes, em alguns momentos exacerbados em revoltas nos Departamentos — como as ocorridas no Alto Juruá e no Alto Purús — onde predominavam como justificativa os elementos políticos — principalmente ligados às diversas concepções de autonomia; — e, econômicos — vinculados à taxação elevada de impostos sobre a exportação de borracha.
Somente a partir dos anos 20 é que irão surgir, com certa regularidade, os jornais e panfletos autonomistas; nos anos 30 surgem os partidos e associações autonomistas e, a partir de meados dos anos 40, já com o fim do Estado Novo, a tese ganha força através de Guiomard Santos, dos seus partidários do PSD e alguns poucos membros do PTB, não alinhados a figura de Oscar Passos.
Todavia, já em 1904, surge na cidade de Cruzeiro do Sul, o chamado Movimento Autonomista do Alto Juruá, composto pelos comerciantes e personalidades locais. Estes primeiros ecos contestatórios conseguiram chegar à capital federal e “sensibilizar” algumas vozes parlamentares acerca da causa acreana. Pouco tempo depois, dois Projetos de Lei foram apresentados no Congresso Nacional, levantando a questão da autonomia dentro do ambiente legislativo brasileiro.
Como o Acre não contava com representantes legislativos, o primeiro Projeto autonomista foi apresentado em 1908 pelo deputado cearense Francisco Sá e um outro, em 1910 por Justiniano Serpa, ambos foram devidamente “esquecidos” e engavetados no Congresso Nacional. Pois não havia interesse nenhum do poder central em dar a pretendida autonomia política ao Território do Acre.
Mas, umas das primeiras medidas, coletiva e organizada, ocorreu em 1910, quando vários comerciantes de Sena Madureira enviaram uma carta, datada em 11 de abril, tratando da questão autonomista, ao presidente Nilo Peçanha. Esta missiva, que foi publicada na íntegra na Folha Official, abria com um texto da seguinte forma: “mensagem da maioria dos proprietários e commerciantes e industriaes, representantes da classes conservadoras do Alto Purús” e era assinada por 78[1] personalidades, os auto-intitulados “homens de bem daquela localidade”.
Como fica claro, o texto ressalta acima de tudo a condição econômica e a posição social daqueles que se consideravam “homens de bem”. Proprietários e, portanto, no entendimento deles, detentores de direitos que lhes eram negados enquanto cidadãos de fato. Isto relembra as bases do liberalismo clássico inglês, baseado no famoso lema “no representation, no taxation”. Nesta acepção, aqueles que pagam impostos e que têm propriedade a zelar, devem em correspondência ter seus direitos políticos assegurados e a cidadania apta a ser exercida em sua plenitude. Se isto não acontece, ocorre um cerceamento e uma incompletitude a partir da não correspondência entre direitos e deveres do cidadão. Acima de tudo, era isso que estava posto por essas vozes dissonantes do Território acreano.
Contudo, no período em apreço ocorreu um dos mais significativos levantes com signo autonomista. Foi a chamada “Revolta do Alto Juruá”, que teve seu início em 01º de junho de 1910, quando uma Junta Governativa[2] toma o poder e declara criado o Estado do Acre. Este movimento teve seu estopim quando chega à Cruzeiro do Sul, o novo prefeito nomeado pelo governo federal, João Cordeiro, “que a população recebeu com desagrado, acirraram os ânimos dispostos à insuflação de idéias subversivas” (Craveiro Costa, 1974, p. 164). Diante do quadro de animosidade que se instaurou, o prefeito, que só existiu formalmente no papel, embarcou de volta para o Rio de Janeiro.
O movimento era composto basicamente por seringalistas e comerciantes locais, ligados ao chamado Partido Autonomista do Juruá – PAJ. Teve inclusive o apoio inicial da Força Policial Federal, comandada pelo então capitão Fernando Guapindaia. O movimento contou “com apoio de todos os proprietários, dirigidos pelo venerado Francisco Freire de Carvalho” (ibidem, p. 164), presidente da Associação Comercial do Alto Juruá. Para tentar ganhar apoio do Departamento do Alto Purús, os insurretos do Alto Juruá propuseram nomear Sena Madureira capital do “Estado do Acre” e ainda, o coronel Antônio Antunes de Alencar, então prefeito do Alto Acre, governador do aludido Estado.
Este, encontrava-se em viagem à Manaus e se mostra pouco interessado em assumir a cadeira de governador que lhe ofereceram, preferindo ficar ao largo do movimento juruaense. Com esses entraves iniciais, provocados pela indiferença dos outros Departamentos, o movimento cruzeirense começou natimorto, pois fragmentado e sem o apoio dos dois co-irmãos era impossível lograr êxito nos seus intentos autonomistas. Mesmo assim, levaram-no adiante isoladamente.
Abaixo está transcrito fragmentos do intitulado Manifesto Autonomista, apresentado pela Junta Governativa em 01º de junho de 1910:
“É conhecida do país inteiro a situação humilhante e excepcional que o poder legislativo entendeu de criar para os brasileiros que habitam o Acre (...) banidos da constituição; relegados ao tempo da treda justiça d’El-Rei; considerados incapazes de intervirem nos negócios nacionais; exilados dentro da pátria; carecidos de tudo os acreanos (...) vêem o produto do imposto que pagam — o mais exorbitante do mundo inteiro — aplicar-se em serviços que não lhes aproveitam, em melhoramentos que não lhes beneficiam, em prazeres de que não gozam, em suntuosidade, que nem sequer imaginam. (...) Se todos os brasileiros são iguais perante a lei, não deve haver exceção para os 120.000 homens que habitam as terras acreanas (...) e se o governo, cerrando os ouvidos ao julgamento nacional, pretender impedir esse grande movimento de liberdade, que sobre ele recai a responsabilidade do que acontecer; que o sangue que se derramar fique como um estigma eterno na história da nossa nacionalidade[3]”. Este levante durou cerca de três meses, com intensas negociações entre os segmentos políticos dos Departamentos acreanos. Causou ainda fortes preocupações junto aos comerciantes de Belém e Manaus, que se manifestaram contrários ao movimento[4] após a interrupção do envio da produção de borracha[5] dos seringais acreanos para estas praças, um duro golpe ao sistema de aviamento[6]. De acordo com um conhecido comerciante e seringalista da época chamado Gentil Norberto[7], residente no Alto Acre, esta “revolução visa escangalhar o fabrico e dar enorme prejuízo às praças do Pará e Manaus” (apud Craveiro Costa, p. 170).
O governo federal, preocupado com os acontecimentos, através do presidente da República Nilo Peçanha, envia à Manaus um telegrama datado de 13 de julho e endereçado ao prefeito destituído do cargo, com o seguinte teor: “o governo da República está disposto a agir resolutamente no sentido de fazer respeitar a autoridade federal e manter as leis vigentes. Convém aconselhar nossos compatriotas, cessarem o movimento insurrecional com o qual o governo não transigirá” (ibidem, p. 170).
Esta questão só chegou ao fim na primeira semana de setembro, quando o movimento foi sufocado pela Força Policial Federal, que no início tinha dado apoio aos chamados autonomistas. Mais uma vez, a força se sobrepôs ao consenso e a fugaz autonomia, sem alicerces sólidos, ruiu ao primeiro confronto. Ruiu porque, do ponto de vista econômico, estava causando um enorme prejuízo ao comércio local e regional pela interrupção da comercialização da borracha. Pelo viés político, causava intranqüilidade ao governo federal, que não poderia acatar movimentos de cizânia que colocassem em xeque sua autoridade.
Pouco tempo depois, o exemplo vindo do Alto Juruá reaparece no Alto Purús, cuja sede era a cidade de Sena Madureira. Em 1912 cerca de 350 pessoas, segundo relatos da época, se insurgiram contra o prefeito Tristão de Araripe, incendiaram a prefeitura, depuseram-no e proclamaram o Estado Livre do Acre. A insurgência contra a municipalidade foi deflagrada pelos “coronéis” e homens de poder da localidade, que forneceram todo apoio logístico para tal intento, mas o movimento logo foi sufocado e os insurretos foram obrigados a se refugiarem no seringal Oriente[8]. Este embate terminou com dois soldados mortos, um tenente e nove soldados feridos (Barros, 1981, p. 71). Mais uma vez, as aspirações autonomistas, isoladas e esparsas, foram reprimidas e momentaneamente controladas.
Com estes acontecimentos, a questão acreana ganha cada vez mais amplitude. No âmbito legislativo, em 1921, o deputado amazonense Aristides Rocha apresentou um Projeto na Câmara Federal, onde visava anexar o Acre ao Amazonas. O deputado Juvenal Antunes, do Rio Grande do Norte, apresentou parecer favorável ao referido Projeto. É o estopim para a fundação em 17 de novembro daquele ano da Liga contra a anexação do Acre[9], composta pelos chamados homens de bens e dignos representante das classes “conservadoras”, como se auto-denominavam. Frente a esta oposição, o referido Projeto não foi adiante. Este procedimento reforça mais ainda a idéia de que o governo federal não queria abrir mão do controle sobre o Território do Acre, dando lhe a autonomia.
No ano de 1927, em um artigo intitulado “Pró-alforria” e assinado pelo Juiz de Direito Giovanni Costa, a questão autonomista foi mais uma vez colocada em evidência. Dentre outras coisas, ele afirmava nos seguintes termos:
“somos cerca de 100 mil brasileiros sem direitos políticos, sem dispor de nossas rendas, lutando com toda sorte de agressividades, atrophiados pela indifferença da união, reduzidos a mera condição de colonos na própria pátria. Nunca tivemos a gestão de nosso bens, organização agrícola, formação industrial, estímulo para applicação das nossas atividades; pelo contrário, temos sido sempre um povo infelicitado pelas imposições do governo central, impingindo-nos governantes, sem capacidade econômica e social, sem amor pelos irmãos na raça”[10]. Um ano depois, no dia 08 de julho, foi organizado no Rio de Janeiro o Comitê Pró-autonomia do Acre, sendo eleita na ocasião a primeira diretoria cujo presidente era Octávio Steiner, que tinha como vice Paulino Pedreira. Os demais membros da direção eram Pedro Timótheo, Povoas de Siqueira, Laudelino Benigno[11] e Clodoveu Gadelha.[12] Todos eles considerados personalidades do meio político-social acreano, embora morassem na Capital Federal.
Mas, nem todos sem colocavam como defensores do intento autonomista de forma contundente. Em seu relatório de governo[13], apresentado ao Ministro da Justiça, Augusto Vianna do Castello, o governador Hugo Carneiro (27/30) afirma que a questão da autonomia não era oportuna, pois só uma diminuta parte dos habitantes acreanos aspirava tal intento e que “a maioria não está preparada para recebê-la e exercitá-la”. No entanto, em seu relatório ele advoga que sejam dados para acreanos os mesmos direitos políticos que ao restante dos brasileiros: o voto para elegerem os seus representantes legislativos federais e escolherem o presidente e o vice-presidente da república. Ironicamente, ele foi o primeiro parlamentar do Acre no Congresso Nacional, representando a facção política Legião Autonomista Acreana.
Embora fosse advogado, Hugo Carneiro não encarava a figura do Território Federal como algo inconstitucional ou extra-constitucional, como muitos à época viam a questão. Para ele, “a organização política do Acre tem sido e continua a ser uma instituição tutelar e de estágio, pela qual se vae preparando a formação de um futuro Estado autonômo na grande pátria commum” (ibidem, p. 128). Sua justificativa era eminentemente política, em consonância direta com a postura do governo federal.
Como chefe do executivo designado pelo poder central, seu discurso não poderia ser diferente. Era natural que todo e qualquer governador estivesse afinado com os ordenamentos vindo da capital federal, a quem deviam prestar contas do cargo que exerciam e gratidão política. Este ponto de vista se opondo à criação do Estado do Acre, Hugo Carneiro manteve muito tempo depois. Em 1958, ao conceder entrevista ao jornal carioca O Globo[14], o mesmo defende a manutenção do instituto do Território e faz criticas ao Projeto de Guiomard Santos, acusa-o ainda de pretender ser senador com a criação do Estado. Além destas questões colocadas anteriormente, no seu entender a criação do Estado do Acre serviria antes de tudo, para benefício político do seu autor.
Mas recuando um pouco no tempo, um limitante às pretensões autonomistas se deu com um entrave jurídico criado em 1934, quando foi aprovada a nova Constituição Federal. Versava a Carta em seu artigo 16, parágrafo 1°, que para ser eregido a Estado, o Território Federal teria que ter no mínimo 300 mil habitantes e recursos suficientes para manutenção dos seus serviços públicos[15]. Um duro golpe aos propósitos autonomistas, pois o Acre tinha menos de um terço da população mínima exigida. Passou ainda, ter taxas decrescentes de crescimento demográfico (vide em Apêndices, Tabela III), provocadas pela crise no volume produtivo da borracha amazônica e a derrocada do seu preço no mercado internacional, produto este que sempre foi o principal elemento impulsionador da economia local e o atrativo que fixou as bases colonizadoras da região acreana.
Com a crise extrativista dos anos 20 e 30, conseqüentemente, a dependência dos recursos repassados pela União se agravou ainda mais. Um alento fugaz à crise da borracha foi o advento da Segunda Guerra Mundial, ao permitir que a Amazônia, — e o Acre em especial —, adquirissem por razões estratégicas uma importância impar, após o domínio dos países do Eixo sobre os seringais de cultivo da Ásia. Desta forma, o Brasil e os EUA pactuam os famosos “Acordos de Washington”, que visavam acima de tudo a produção de borracha para atender a demanda dos países aliados no conflito. Novamente vêm para Amazônia uma leva nordestinos trabalhar como “soldados da borracha” nos declinantes seringais nativos nortistas (Martinello, 1988).
Com o fim da Segunda Guerra, as pressões locais frente ao governo federal sobre “a questão acreana” surgem novamente como assunto primordial. O setor do comércio, — que sempre foi um elemento importante na economia acreana —, em meados dos anos 50, também se manifestou no intento de requerer ao presidente da república um governador autóctone, não no sentido de nascimento; mas que residisse e não fosse uma pessoa estranha às hostes locais. Em uma carta enviada em 1953 ao presidente Getúlio Vargas, a Associação Comercial do Acre reforça esta tese ao afirmar ser que “o referido governador seja escolhido entre os homens aqui radicados para atender um pedido justo e um apelo angustioso”[16].
As vozes contrárias, embora em menor número e com menor intensidade e eco, também se manifestavam em âmbito local e nacional. Em Rio Branco, no final de 1960 o jornalista Foch Jardim, do jornal O Liberal, defendia em editorial a inconveniência da tese autonomista ao afirmar que
“somos de opinião que na atual conjuntura política e econômica do Acre, governador a ser nomeado pelo presidente da República deverá ser um estranho ao nosso meio e pessoa de inteira confiança, para que possa haver modificações na máquina administrativa, para que possa ser consertada muita coisa errada, o que qualquer pessoa ligada ao Acre não fará por questões de ordem política e social”[17]. De acordo com esse jornalista udenista, por mais paradoxal que possa parecer — já que todos governadores anteriores eram forâneos — somente um governador com total desvinculação com as questões políticas locais poderia romper com uma ordem de coisas que foi construída ao longo dos anos, por esses mesmos governadores em consonância com grupos locais. Para mudar, era preciso continuar aquele modelo. Naquela conjuntura, talvez um udenista de inteira confiança de Jânio Quadros, recém eleito presidente.
Na mesma época, em Cruzeiro do Sul, o jornal O Juruá[18] reproduziu uma reportagem originária do jornal carioca Tribuna da Imprensa cujo título era: “porque ainda é cedo para o Acre ser Estado”. Mas divergia deste em alguns pontos do referido artigo, principalmente no tocante a honestidade dos ex-governantes vindos para o Acre, pois segundo a Tribuna “era difícil apontar qual governador menos roubou” e ainda, “as verbas que o governo federal enviava para o Acre nunca chegavam lá”. O Acre era para o Diário de Noticias, um outro jornal carioca, retratado como “um Marrocos mal disfarçado”, talvez para fazer alusão ao aspecto colonizador e tendo no Acre uma situação semelhante[19] com a existência de governos intermitentes, quase rotativos e, vindos de fora.
Em editorial, o jornal O Juruá concordava com a tese da inconveniência do Acre ser elevado a Estado, pois segundo sua avaliação não haviam ainda condições para alcançar tal objetivo se não fosse modificada a forma de administração territorial. De acordo com o artigo, o Acre deveria ser dividido[20] em dois governos regionais devido as suas peculiaridades geográficas: Bacia do Juruá–Tarauacá e Bacia do Acre– Purús. Administrativamente os juruaenses requeriam uma atenção maior, sentiam-se diminuídos em relação ao Vale do Acre–Purús, região mais beneficiada devido facilidade de acesso e por ser a sede do governo territorial.
Preconizavam que ao se bipartir administrativamente o Acre, cada Departamento teria dois municípios com seus respectivos prefeitos e Câmara de vereadores, e o Território passaria a ter representantes nas duas casas do Congresso Nacional. Defendiam que todos os cargos administrativos fossem preenchidos a critério do Ministério da Justiça, com pessoas residentes há pelo menos dois anos no Acre e, após decorridos dois anos da implementação desse sistema, os Departamentos se tornariam Estados federados da República brasileira (Barros, 1981). Como se percebe, não houve interesse nenhum da União de atender tal proposta. Em Cruzeiro do Sul, um sujeito chamado Aluísio de Carvalho e alcunhado de Lulu Parola[21], fez em forma de versos nas páginas de O Cruzeiro do Sul[22] uma crítica ao intento da autonomia. Dizia o seguinte, o verso Cantando e Rindo:
“Não sei como é que vão reorganizar O Território do Acre tão falado Há vontade autônomo o tornar? Querem fazê-lo Estado? Dar-lhe assento na câmara e no senado Por si mesmo, fazer-se governar? Se é isso: oh! Território celebrado, Que presente de grego vão te dar! Não queiras não! Prefere essa tutela em que estás, da união!”[23] Soberania hoje é muito melhor passar sem ela. Sim! Que mal sabes tu, Acre inocente Quanto custa hoje em dia Viver qualquer Estado.... independente!” No tom hilário e gozador do autor destes versos, percebe-se que a discussão autonomista era também vista com ressalvas, principalmente pelas obrigações constitucionais que ela trazia embutida, caso acontecesse. Mas, uma questão que sempre vinha à tona para os autonomistas cruzeirenses era optar entre Estado ou Território, e como promover a integração entre os dois vales distintos que eram separados por dificuldades geográficas imensuráveis. Por isso, no Alto Juruá sempre vingou e veio à tona a possibilidade de separação em relação ao restante do Acre. Esta propalada e necessária integração não era uma novidade naquela época de acontecimento insurretos que explicitei anteriormente.
Euclides da Cunha (1998), quando empreendeu viagem de reconhecimento à região acreana em 1906, ressaltava este aspecto limitante entre as duas regiões. Como engenheiro que era, propõe a construção de uma estrada de ferro, chamada Transacreana[24], que ligaria os Vales do Juruá e do Acre-Purús entre si. Serviria no seu entender como uma via auxiliar aos rios da Amazônia Ocidental, cortando-os de forma transversal e reduzindo a viagem entre Cruzeiro do Sul e Rio Branco para apenas um dia. Já que pelo deslocamento fluvial, era necessário um mês de navegação para ir de Tarauacá à Rio Branco, percorrendo quase sete mil quilômetros de águas. Era preciso para isso encampar uma verdadeira odisséia, descendo o rio Tarauacá até entrar no rio Juruá, depois sair no Solimões baixá-lo até encontrar as águas do Purús em viagem até a foz do rio Acre e subir para Rio Branco (Tocantins, 1998).
Era a natureza imprimindo seu ritmo e suas dificuldades aos homens[25]. Sem cair em determinismos geográficos, sou tentado a concordar que o tempo nestas paragens se exacerba e adquire contornos próprios, a geografia se apresenta adversa ao homem em todo instante. O tempo geográfico braudeliano parece ser vivido cotidianamente. Os rios sinuosos eram e ainda são as medidas de distâncias das viagens que ligam locais isolados pela floresta, onde para os “intrusos impertinentes” de Euclides da Cunha, a forma mais usual de percorrer a distância entre dois pontos não é seguindo uma reta, mas através das curvas dos rios. 2.2 – Os embates em torno do Projeto autonomista de Guiomard Santos. A luta pela integração e emancipação acreana, se origina nos primeiros anos do século XX, depois se implementa dispersa e fragmentada em movimentos isolados nos Departamentos do território. Só tardiamente parece interessar aos representantes do Acre na Câmara Federal. É somente no final de 1950 que o ex-governador Guiomard Santos, num tino de oportunismo político, adota para si a bandeira da elevação do Acre a Estado e tenta capitalizar o êxito desta empreitada a seu favor no campo político local.
É dele a autoria do Projeto de Lei n°2654/57, que originou a “emancipação política” do Acre. Este Projeto foi apresentado em 1957, tendo sido aprovado e sancionado em 15 de junho 1962 por força do Decreto n° 4070/62, após discussões acaloradas no Acre e no Congresso Nacional. Mas a gênese deste Projeto pode ser encontrada em um discurso proferido pelo então deputado federal Guiomard Santos, no dia 17 de novembro de 1953, em alusão ao cinqüentenário do Tratado de Petrópolis[26]. Isto demonstra que na maioria das vezes, uma mudança para se realizar necessita produzir no imaginário coletivo algo que encontra no passado as bases de sua coerência ou justificativa. Assim, se meio século antes o Acre se tornara brasileiro, agora precisava deixar o estatuto de Território e se igualar às demais unidades federativas.
Nesse discurso, recheado com apartes de apoio, o ex-governador defende a criação de um Território Federal Independente. Território porque, segundo ele, não podia o Acre abrir mão das verbas federais que lhes sustentavam. Independente, porque deveria ter os mesmos direitos políticos que os outros Estados da União. No plano político, isto daria ao Acre o direito de eleger seu governador e dispor de uma Assembléia Legislativa, três senadores e sete deputados federais no Congresso Nacional, todos escolhidos de forma direta pelos acreanos.
Mais tarde, ao apresentar seu Projeto de Lei, Guiomard Santos passa a defender a idéia de um Estado federado à nação brasileira e afirma em defesa de seu intento, que o Território não possibilita um caminho para a democracia e sim, “conduz a fórmulas totalitárias” e que o fato do governador não depender do povo, “tudo estimula a prepotência e a arbitrariedade”[27]. É em cima de um discurso prometendo novos horizontes para o Acre, que Guiomard Santos consegue arrebatar na mesma intensidade apoiadores e críticos ao seu Projeto.
Dentre os críticos, alguns correligionários seus como João Mariano — ligado a Associação Rural e dono do jornal O Juruá —, residente em Cruzeiro do Sul e que através de algumas cartas enviadas[28] ao próprio Guiomard Santos explica o porquê de sua oposição ao Projeto. Para João Mariano, Guiomard Santos deveria insistir na saída mais sensata para aquele momento: elevar a região do Acre-Purús a Estado e que o Juruá em separado formasse um outro Território. Para sustentar sua opinião, afirma textualmente: “seria oportuno que se fizesse o Território do Juruá, uma vez que nossa condição não nos permite continuar unificados a Rio Branco, nem como Estado, nem como Território”.
Em Cruzeiro do Sul esta concepção também foi adotada pela Associação Comercial do Juruá, Associação dos Seringalistas, Centro Operário e Associação Rural, que criam em 1957 o Comitê Pró Território do Juruá para rivalizar com o Comitê Pró Autonomia do Acre, este último ligado à defesa do Projeto de Guiomard Santos. Os juruaenses inclusive, mandam uma carta ao presidente da República e outra ao relator do Projeto na Comissão de Constituição e Justiça, deputado Tarso Dutra. Ambas as cartas[29], com o mesmo teor e, intituladas “Memorial das classes conservadoras do Juruá Federal”, estavam assinadas pelos presidentes[30] das organizações classistas e patronais acima citadas, onde estes expressavam suas preocupações com a possível autonomia acreana e dos problemas advindos dela.
Os comerciantes e seringalistas, tanto do vale do Acre quanto do Juruá tinham um receio em comum, que fazia sua grande maioria ser contra ou ver com certa desconfiança a possibilidade do Acre ser elevado a categoria de Estado. Este receio era em relação a um possível aumento dos impostos sobre as mercadorias que comercializavam e sobre a industria extrativa da borracha. Em um evento ocorrido em Rio Branco, patrocinado através da Associações Comercial e Associação dos Seringalistas, que reuniu os dois grandes opositores políticos — Guiomard Santos e Oscar Passos, — isto fica patente quando os dois grupos patronais manifestam suas preocupações diante de ambos deputados.
O próprio presidente da Associação Comercial, Abrahim Isper Júnior, ao abrir a solenidade ressaltava que
“o grande medo são os impostos que fatalmente surgirão com a transformação do nosso Território em Estado. Medo também da burocracia, de uma máquina estatal que trará para aqui Alfândega, Ministério do Trabalho, Delegacia do Imposto de Renda, Capitania dos Portos, Instituto de Previdência Social, Sindicatos e quanta coisa mais que das vezes dificulta, embaraça e por demais aperreia os homens que querem liberdade de trabalho, liberdade de ação”[31]. Como fica evidente nesta fala, o maior temor para a maioria dos comerciantes e seringalistas era que o Estado traria novos ordenamentos fiscais e jurídicos através de órgãos reguladores e burocráticos. Isto iria alterar de sobremaneira toda estrutura na qual se assentavam os procedimentos comerciais e as relações de trabalho não formalizadas em contrato. Além da diminuição da suas margem de lucros, bem como a possibilidade de uma fiscalização sobre suas atividades econômicas, que durante longo tempo permaneceram ao largo de qualquer injunção estatal de caráter regulatório. Liberdade era ficar livre de qualquer ingerência do poder público que pudesse “prejudicar” seus negócios.
Quando a palavra é passada ao deputado Guiomard Santos, ele afirma categoricamente: “tenho a coragem de defender de público o imposto. Há quem queira passar por cima do assunto”. Era indubitavelmente uma alfinetada indireta ao deputado Oscar Passos, seu “inimigo” fidalgal, que se encontrava presente. E complementa tentando acalmar os “intranqüilos” homens de negócios: “não vou enganar o povo dizendo que não haverá imposto. Haverá, mas certamente pequeno e não será para já, mas para quando for possível, para quando se puder taxar” e de forma direta se dirige a platéia dos “homens de bem” e representantes das “classes conservadoras”, continuando o seu discurso nos seguintes termos:
“afirmo aos seringalistas: quem vai pagar o imposto não é o seringalista acreano, e sim quem consome, quem compra a borracha.(...) Não creio, seringalistas e comerciantes, que numa hora em que o Acre deseja ser progressista, deseja avançar, que vossas senhorias, por medo, por carrancismo[32], não queiram colaborar com o Estado do Acre. Não quero acreditar que nenhum acreano, em sã consciência, diga ‘não pago, porque só quero viver para minha família’, quando devia dizer: ‘pago, com prazer, porque posso pagar, porque estou ganhando mais e, por conseguinte, devo um tributo também ao povo e à coletividade’”[33] O discurso de Guiomard Santos deixa claro que na sua visão, a permanência do estatuto do Território, bem como aqueles que se colocavam contra seu Projeto, estavam presos e situados a um passado superado. Era agora momento de uma nova etapa para o Acre, de novos horizontes, um caminho rumo ao “progresso” e para isso, era necessário a negação da velha ordem que claudicava. Guiomard Santos parece apelar para um fraternalismo e um espírito público dos comerciantes, em torno do seu Projeto, que talvez nem ele acreditasse ser possível angariar.
Oscar Passos por sua vez, utilizava como justificativa em sua oposição ao Projeto de Guiomard Santos, o subterfúgio de que o Acre não tinha recursos econômicos para caminhar em direção a uma autonomia nos moldes que seu opositor desejava. Com isso, ele procurava granjear para si o apoio dos seringalistas e comerciantes acreanos, que nas suas palavras “desde muito há essa mania de perseguir esses homens sem os quais o Acre não seria nada”[34]. Mas ressalvava que não era um opositor da autonomia acreana e sim, contra a proposta de Guiomard Santos. Na sua contradita, dizia ele em tom indagativo: “que vantagem advirá da imediata autonomia do Acre? Positivamente nenhuma. Vantagens terão os mandões atuais, que tudo farão para se manter no poder e sugar mais e mais a anemia (sic) da economia acreana”. Nestas duas falas percebe-se que embora ambos façam a defesa dos seus pontos de vista, também procuram deixar margem para relativizar os pontos mais polêmicos. Há uma certa dubiedade para não desagradar pôr completo os ânimos inquietos de uma platéia tão especial.
Excetuando a oposição mais ferrenha dos membros do Partido Autonomista do Juruá - PAJ, na verdade, a elevação do Acre a Estado era algo que todos concordavam. Mas esta era obstaculizada por interesses pessoais e de grupos: os comerciantes e seringalistas devido o medo de sentirem no próprio bolso uma sensível avaria nos seus lucros e uma mudança em torno das relações de trabalho que se encontravam baseadas em um certo tradicionalismo[35]; a turma do PTB liderada por Oscar Passos, porque se opor ao PSD e a Guiomard Santos significava acima de tudo sobrevivência política e a manutenção de uma aura de confronto perante parte da população. Assim, as oposições estavam pautadas em interesses imediatistas e pragmáticos, jamais ideológicos.
Para ilustrar, de antemão, destaco quase na integra, um artigo do deputado Guiomard Santos que considero bastante relevante. Importante acima de tudo pelos aspectos, abordados pelo seu autor, a respeito de como ele via o Acre nas suas diversas variantes, principalmente em relação a hegemonia plena do poder público. Afirma ele em seu texto intitulado o Estado Socialista do Acre, que
“o governo é tudo; é infelizmente, o dono de tudo. Eis, pois, um pequeno Estado socialista. A telha, o cimento, os caminhões são do governo. Todos os estabelecimentos de instrução são do governo. Todos os trabalhadores da cidade ganham pelo governo. Quem não trabalha nas obras do governo, é funcionário do governo, que detém assim, todos os empregos, quase sem exceção. Acrescentemos o avião, a Guarda Territorial, os médicos, os dentistas, os agrônomos, os mecânicos, os choferes, os eletricistas, os carpinteiros, os pedreiros, os pintores, os encanadores, etc. tudo está engrenado ou depende do governo. Relevando um pouco o tom hiperbólico do seu texto, de certa maneira, era isso o que acontecia. Existia no Território do Acre um poder público que abarcava quase todas as dimensões da existência social, constituído-se em uma seara privilegiada para a manutenção de interesses restritos a grupos reduzidos de pessoas, que amealhavam todas as vantagens e prerrogativas que este modelo possibilitava. É substancial aqui aludir, de modo paralelo e comparativamente, à uma passagem em que Marx (1997) comenta algo similar sobre o mesmo fato, acerca da nação francesa em meados do século XIX.
Diz ele que lá “o poder executivo controla um exército de funcionários e portanto mantém uma imensa massa de interesses e de existências na mais absoluta dependência, onde o Estado, enfeixa, controla, regula, superintende e tutela a sociedade civil desde suas mais amplas manifestações de vida” (idem, p. 66). Sem cair em anacronismos, era isso que ocorria no Acre comentado por Guiomard Santos em seu artigo.
Ao fazer esta constatação tardia, talvez Guiomard Santos não quisesse destruir esse modelo que o beneficiava politicamente, mas reduzi-lo à esfera do essencial, de uma pretensa res publica palidamente liberal, sem destruir estruturalmente a galinha dos ovos de ouro que era a máquina executiva estatal. Liberar o poder público do fardo de ter que se ater com tudo e todos.
Parecia querer que o Estado passasse a se preocupar com as suas funções básicas enquanto tal, porque
“o povo está de fato convencido que o governo é para guardar, cuidar, limpar, curar, dar, melhorar, resolver ou salvar tudo! E sozinho! Uma letra protestada, uma desavença entre amigos, alguém que ficou sem casa, um pobre que não encontra comida, uma tábua que faltou na construção particular, uma viagem imprevista por motivo de saúde, enfim até uma carta que desgostou o seu destinatário, qualquer coisa assim pode originar consultas a sua excelência o mais atribulado dos governadores, o governador designado da União no Território Federal do Acre. Mas como já foi ressaltado, era assim que os governadores territoriais comandavam o poder local. Exorbitavam nas suas funções ao agirem através de uma rede variada de compromissos que assumiam diante de seus apadrinhados. Por isso o executivo parecia, para todos, ser apto a resolver os interesses mais comezinhos, ser capaz de delegar, mandar, manter e concentrar para si as ações mais elementares de regulamentação do cotidiano. Essa capacidade exacerbada de atos do chefe executivo era oriunda do modelo de governo territorial implantado décadas antes: um poder executivo forte, sem o elemento legislativo presente e um sistema judiciário deficiente, geralmente atrelado ao primeiro.
Expressado ainda no fato do chefe executivo ser uma escolha do presidente da República e que só a ele prestava conta dos seus atos. A sua lealdade era mais significativa com os interesses da União do que com os governados e com a unidade federativa. Junto a isso, os órgãos federais instalados no Acre Territorial foram desde o início transformados em agências de empregos, de locus para a troca de favores políticos e econômicos. Tudo bem articulado, contando com o beneplácito do governo federal e das oligarquias locais.
Depois de já ter sido governador e ocupando uma cadeira no parlamento federal, Guiomard Santos reconhece tardiamente que o modelo implantado em 1921 era de um
“Estado árbitro, o Estado intervencionista, coordenando e burocratizando a sociedade, a economia, as finanças e a vida material do Território. Sistema patriarcal com suas pequenas vantagens e as suas grandes desvantagens de carregar o peso monstruoso de todos os interesses particulares e particularistas. Do lado de fora restam apenas uma dúzia de seringalistas – comerciantes e a massa de seringueiros párias.
Estes são compradores forçados de seus patrões, assim como os patrões se acham algemados aos bancos e as casas aviadoras. Do panorama acima deduzem-se os malefícios de semelhante estado de coisas. Todas as pessoas que vieram para o Acre, desde o seringueiro aos governadores e magistrados traziam a idéia de voltarem aos seus estados no mais curto espaço de tempo”[36]. O emprego público era a vocação de todos e o Estado o elemento que possibilitava essa realização. Este discurso contém um elemento central, que o explica parcialmente: a partir da decadência do modelo extrativista, grupos hegemônicos da economia acreana, tanto empresários seringalistas quanto os grandes comerciantes urbanos, inclinam-se em influir diretamente na máquina estatal.
Passam a ver este espaço como um locus privilegiado para manutenção dos seus negócios e imprimem um direcionamento que passou a visar o poder político como garantidor de interesses particularistas. Isso nos leva a concordar, que no Acre ocorreu também o caso clássico em que “a partir da decadência econômica de seus empreendimentos, a elite local inclina-se por substituir as externalidades econômicas por externalidades políticas” (Souza, 1999, p. 68). Ao se adotar essa prática, ficava explícito que o importante era continuar expressando a distinção e o poder, seja no âmbito privado ou público; que no caso acreano, não estava claro onde terminava um e começava o outro. Antes, a máquina pública estava em um patamar secundarizado em relação ao modelo econômico, depois gradativamente passa a ser o inverso que interessa: os próceres do modelo econômico, baseado no comércio capenga e no extrativismo decadente, passam a ver no Estado uma arena crucial que daria possibilidade de sobrevivência de seus negócios, poder e status.
O concreto é que a organização do aparato público e do aparelho de Estado, não era universalista nos seus procedimentos, nem meritocrático na arregimentação dos servidores. Por não existir concurso público, predominava o esquema de conexões políticas em detrimento à competência, o Título e o saber. Era um modelo acima de tudo com fortes cores clientelistas, baseado no compadrio e nos interesses das oligarquias — internas e externas — que o comandavam.
2.3 - Guiomard Santos versus Oscar Passos: apogeu do poder personalista e do clientelismo político. Durante cerca de duas décadas (40/60), estes dois personagens que militavam em campos partidários opostos, irão monopolizar a vida política acreana. Tanto Oscar Passos como Guiomard Santos, foram primeiramente governadores nomeados do Território do Acre, depois passaram a dedicar-se ao parlamento federal e se tornaram-se as principais lideranças de seus partidos — respectivamente PTB e PSD —, sendo que, em torno de ambos tudo e todos gravitavam. Enquanto estiveram em cena, procuraram monopolizar as indicações dos principais cargos federais, inclusive influenciando na escolha dos governadores indicados para o Acre neste período.
Personalizaram em suas pessoas as vantagens do poder, mantendo sobre controle os seus apadrinhados subalternos, todos inseridos em uma rede de relações fisiológicas e clientelistas, explicitadas nos recursos estatais. Para Edson Nunes (1997), em um estudo singular sobre esta temática, o clientelismo é um processo de troca de favores que impregna as instituições formais do Estado, através de uma burocracia que opera este sistema de trocas e que suplanta o sistema partidário, colocando-o em posição secundária (idem, p. 33). No Acre, esses homens estavam acima dos partidos e estes, a serviço de seus intentos políticos, que se confundiam ao ponto de não se separar os interesses públicos dos privados.
Em períodos eleitorais, as disputas eleitorais entre Guiomard Santos e Oscar Passos eram sempre acirradas e com acusações de ambas as partes dando o tom. Em 1954, quando ocorreram a eleições para a escolha dos dois únicos representantes acreanos para a Câmara Federal, eles lançam-se candidatos pelos seus respectivos partidos. Oscar Passos (PTB) concorre em uma chapa tríplice, que era complementada por Ruy Lino (PTB) e Adalberto Sena (UDN). Guiomard Santos, do PSD, encabeça a chapa Coligação Democrática Acreana, tendo ainda como candidatos — apenas para lhe “puxar votos” — Manoel Fontenele de Castro (PSP) e frei Peregrino Carneiro (PDC), o primeiro tenente-coronel e o outro ligado a Igreja Católica. Aliança nada inusitada em se tratando da política brasileira.
Em um dos panfletos de propaganda da chapa, publicado no jornal O Rebate, estava estampado: “o comunismo lutará e empregará todas as forças para impedir a nossa eleição. Eleitor acreano, pensa na tua família, no futuro dos teus filhos, na tranquilidade do teu lar, votando nos candidatos que acima de tudo obedecem o lema: Deus e família"[37].
Em um outro panfleto, estampado no mesmo jornal e na mesma data, lia-se: “empunhando em uma mão a arma branca do voto e na outra a cruz de cristo, haveremos de expurgar de uma vez por todas a horda vermelha”[38]. Estes slogans visavam minar a candidatura de Oscar Passos, ligado a PTB, partido cujo o epíteto à época era de ter em seus quadros partidários do “credo comunista”, um bom elemento naquele período para tentar colocar adversários em descrédito. Oscar Passos era acusado ainda de ser favorável ao divórcio, tese combatida principalmente por grupos conservadores e pela Igreja Católica através do jornal “Mensageiro cristão”. Com as eleições finalizadas, mais uma vez estavam eleitos Guiomard Santos e Oscar Passos[39].
Mas os acordos entre os dois grupos políticos[40] também eram comuns, principalmente quando era para conformar certos arranjos políticos que beneficiavam um e outro. Em 1953, o PSD e o PTB pactuam um acordo amplo que visava a nomeação do novo governador que substituiria João Kubitschek, que pedira exoneração do cargo.
O próprio presidente do PTB acreano, Wagner Eleutério, em entrevista[41] confirmou de forma detalhada as bases dessa combinação, que estava estruturada da seguinte maneira: o PSD indicaria o governador[42] e teria ainda ao seu dispor os Departamentos de Obras e Viação, Educação e Cultura, Produção, Chefia do Gabinete e as prefeituras de Cruzeiro do Sul, Tarauacá e Brasiléia.
Com a partilha acertada em comum acordo, coube ao PTB a Secretaria Geral, os Departamentos de Saúde, Administração, Geografia e Estatística e ainda, as prefeituras de Rio Branco, Feijó, Xapuri e Sena Madureira. Era a explicitação do chamado “Estado de compromisso” originado no Brasil a partir do período Vargas, caracterizado pelo fato de nenhum ator ou facção política ter uma supremacia clara sobre os outros e não poder sobreviver isoladamente e sem dispor da corretagem estatal (Nunes, 1997, p. 26). Desta forma, constituía-se um círculo fechado e restrito, que embora marcado por contradições internas, se mantinha no poder através de acordos e compromissos.
Após aparar as arestas e feito os acertos locais, era a vez de Guiomard Santos e Oscar Passos usarem de suas influências e bom trânsito junto ao MJNI para a concretização daquilo que beneficiava além de ambos, os dois maiores grupos políticos do Acre que estavam sob seus domínios. O próprio Guiomard Santos comentou de forma clara este conluio político ao dizer que “fez-se apenas um esquema inter-partidário visando os cargos em comissão”[43]. Afirmava ainda de maneira incisiva que o esquema “não envolve compromissos eleitorais futuros (...) mas reforça muito a autoridade dos partidos e o nobre gesto do governador (indicado por eles!) em conceder aos partidos de expressão eleitoral no Território, o direito natural de pleitearem os altos posto políticos, está sendo mal interpretado pelos saudosistas”[44]. Eis a admissão de um poder centralizado nas mãos de grupos restritos, que vêem com uma “naturalidade orgânica” o enfeixamento e a partilha do poder sob seus domínios. Com isto, estes acordos pragmáticos e momentâneos, procuram colocar à margem outras forças políticas, que ficam impossibilitadas de emergirem diante de tal quadro.
Por sua vez, Oscar Passos corrobora o que Guiomard Santos dissera e coloca a questão da seguinte forma: “não há nada de indecoroso e humilhante no acordo para governador (...) esses acordos incluem, obrigatoriamente, cláusulas de distribuição equitativa de postos de governo, para evitar o que se passava anteriormente, quando um só partido monopolizava todos os cargos”[45]. Formava-se assim um rede ampla de “corretagem política”[46] que se espraiava por toda máquina governamental e prefeituras dos municípios acreanos, pautada na distribuição de cargos entre partidários do PTB e PSD.
É evidente que além dos cargos de comissão no primeiro escalão, haviam também acertos para cargos do segundo escalão, bem como os cargos nas prefeituras. Era a cristalização da utilização da máquina pública “com bastante eficácia nas disputas eleitorais do mercado político para garantir a continuidade dos detentores do poder” (Schwartzman, 1982, p. 67).
“Governo” e “oposição” eram termos sem grandes significados de conteúdos que indicassem e demarcassem campos claros de ação política ou consistência ideológica, o que importava antes de tudo era o “controle das agências governamentais para o exercício do clientelismo” (idem, p. 136), que ocorria uniformemente em todo o Território. Sem sombra de dúvida, o que existia era uma teia ampla de acomodações políticas e compromissos que eram essenciais existirem para conformar grupos e sujeitos hierárquicos e diferenciados, que não conseguiam subsistir fora desta ordem de coisas que era vista como “natural” e necessária. 2.4 – As últimas cenas do regime territorial e a transição para Estado. Com o modelo territorial em vias de extinção e as turbulências e tensões políticas que aconteciam no país, agravadas mais ainda pela renúncia do presidente Jânio Quadros no segundo semestre de 1961, o quadro político local também sofre alterações no seu tabuleiro. Logo que recebe a notícia relatando o cenário político nacional, o governador Altino Machado, junto com seu secretário imediato, que exercia também o papel de vice-governador, “solidariamente” renunciam e o presidente interino, Ranieri Mazzili indica, também interinamente, Oswaldo Pinheiro de Lima para o cargo de governador do Acre.
Ao se acomodarem momentaneamente as turbulências nacionais, no Acre a pauta volta ser novamente a procura para uma definição da questão da autonomista. Após aprovação do Projeto no Congresso Nacional e assinatura de João Goulart, novo presidente que assumia a vaga do renunciante, o Decreto que elevou o Acre a Estado determinava que as eleições para governador e cargos legislativos deveriam ocorrer em um prazo de três meses. Ficava aos deputados estaduais eleitos e empossados, a função de Constituintes e o governador tomaria posse somente no dia da promulgação da nova Constituição Estadual. Caso a Constituição não fosse promulgada quatro meses após a posse dos deputados, o Acre passaria a fazer uso da Constituição do Estado do Amazonas até a aprovação da sua carta magna.
Nesse período de transição, era governador do Acre o agrônomo e Delegado da União Ruy da Silveira Lino, que além de ser o primeiro governante nascido no Acre, assumiu o poder em 29/10/61 quando ainda predominava o regime territorial e deixou-o em 06/07/62, — quando o Acre já tinha sido elevado à categoria de Estado, — por força e necessidade de desincompatibilização para candidatar-se a deputado federal. Com isto, o último governante nomeado para o período de transição foi Aníbal Miranda, que assume durante sete meses até a posse do primeiro governador eleito[47].
Esta decantada autonomia, requerida durante décadas, foi um parto difícil e implementada após longos embates entre grupos privilegiados, internos e externos. Foi acima de tudo uma transição passiva e controlada pelas mesmas pessoas que se beneficiavam no regime anterior, foi uma mudança de cunho conjuntural e permeada por exclusões. Organizada e conduzida de forma descendente e que trouxe consigo as entranhas do modelo territorial, baseado em práticas autoritárias e personalistas. Uma mudança com continuísmos, vícios e sem rupturas, características que sempre predominaram na política brasileira, no Acre não foi diferente.
Este longo e duradouro parto autonomista, embora necessário, ocorreu de cima para baixo, sem participação ou clamor popular e dirigido por grupos políticos internos, que viam na autonomia o deslocamento e a definição do poder para a esfera local. Deve-se pensar que junto a isto, houve vontade do governo federal em mudar o estatuto acreano. Também não parecia ser mais interessante à União manter e administrar os problemas acarretados pelas demandas acreanas, Território cujo modelo econômico já não justificava mais a tutoria exercida durante mais de meio século. Foi dada ao Acre uma alforria semelhante àquela concedida aos escravos em 1888: paradoxalmente ser “livre” para se submeter às novas amarras, tirando o peso da responsabilidade do seu então tutor, o Estado nacional.
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[1]Examinado o conjunto da lista que compunha estas 78 assinaturas, existem nada menos 49 militares de altas patentes, 42 seringalistas, 38 comerciantes, 01 capitalista, 03 advogados, 01 tabelião, 01 agrimensor e 02 industriais. O número evidentemente excede as 78 assinaturas e se explica devido ao fato de muitos se auto-intitularem como pertencentes a mais de uma categoria profissional e/ou social. Folha Official, p. 04, abril de 1910. (este jornal era o órgão oficial da prefeitura do Alto Acre).
[2]A Junta Governativa foi formada pelos coronéis Francisco Freire de Carvalho, João Bussons e Mâncio Lima. Tinha como suplentes o major Francisco Borges de Aquino, coronel Alfredo Teles de Menezes e o major Glicério de Vasconcellos Pessoa (Cf. Craveiro Costa, 1974, cap. 18).
[3]Craveiro Costa (1974, p. 170).
[4]No dia 14 de junho de 1910 o jornal carioca A Gazeta de Notícias publica as reivindicações dos autonomistas do Juruá: “entre essas medidas há notícias da prohibição da saída de borracha até a confirmação da autonomia; creação de vários cargos judiciários; organização de um novo corpo de segurança; (...) imposição para que o imposto de 20% sobre a exportação da borracha seja reduzido a 15%, cobrado na alfândega de Manáos e Pará e, pela União até o praso de 05 annos; creação de uma câmara de deputados com 20 membros (...).
[5]“A vida do Acre era a borracha. Em torno dela gravitavam todos os interesses, todos os labores, todas as ambições”. Craveiro Costa (1974, p. 185).
[6]O sistema de aviamento era toda uma cadeia de relações que envolvia a produção de borracha na Amazônia. Genericamente era baseado numa pirâmide de relações e compromissos que envolvia de forma descendente grandes empresas européias que importavam a borracha amazônica, as casas comercias e exportadoras de Belém e Manaus, que supriam os seringais com as mercadorias, o seringalista e por último, o seringueiro, imprescindível para a extração do látex e quem menos se beneficiava dele.
[7]Formado em engenharia, Gentil Tristão Norberto veio para o Acre em 1900, fazendo parte da famosa “expedição Floriano Peixoto”, patrocinado pelo governo do Amazonas para dar combate aos bolivianos.
[8]A Gazeta do Purús, 1981.
[9]A primeira reunião ocorreu no Cine Éden e tinha como participantes os membros do PRAF e do PEA. A Capital, nº 16, p. 01, 27/11/21.
[10]Folha do Acre, nº 565, p.01, 27/03/27.
[11]Ex-governador interino, vide em Apêndices.
[12]“Comitê pró-autonomia”. Folha do Acre, n° 642, 12/07/28.
[13]“Governo do Território do Acre”, (1930, pp. 126/134).
[14]Apud Bezerra (1992, p. 197).
[15]O parágrafo terceiro, deste mesmo artigo, denominava constitucionalmente a figura do governador do Território de “Delegado da União”.
[16]“Pede a Associação Comercial do Acre”. O Acre, n° 1118, p.01, 26/04/53.
[17]O Liberal, datado de 24/12/60. Era um semanário irregular auto-intitulado “um jornal em defesa dos interesses populares” e que fazia oposição a Guiomard Santos. Foch Jardim era militante da UDN e por “coincidência” Jânio Quadros assumiria a presidência da República alguns dias depois.
[18]O Juruá foi fundado no ano de 1953 em Cruzeiro do Sul. Seu proprietário era João Mariano da Silva. Na Tribuna da Imprensa a matéria foi publicada dia 10/04/61 e n’ O Juruá dia 28/06/61, n° 116, pp. 01/03/04.
[19]Diário de Noticias, 28/03/56.
[20]Esta proposta tardia soava como café requentado. Em 24 de maio de 1927, o coronel Mâncio Lima, então Intendente de Cruzeiro do Sul (1927/1934), envia telegramas ao Senado e à Câmara Federal, pedindo a divisão do Acre em duas administrações (Alto Tarauacá e Alto Juruá/Alto Acre e Alto Purús).
[21] Parola vem do verbo parolar e significa sujeito falastrão, tagarela.
[22]Órgão oficial do Departamento do Alto Juruá, criado na administração do marechal Gregório Thaumaturgo de Azevedo. Circulou entre os anos de 1906 e 1918.
[23]In Barros (1982, p. 72). O autor do livro não faz referência à data de publicação no jornal O Cruzeiro do Sul, certamente ocorreu após a revolta do Juruá, provavelmente entre os anos 1912 e 1915.
[24]Pelos cálculos de Euclides da Cunha a estrada teria 29.040.000m² (726 mil metros de extensão com 40 metros de largura) com um custo aproximado de 1:1:452.000$000. Cunha (1998, p. 133).
[25]Para Euclides da Cunha, o homem amazônida “é um intruso impertinente. Chegou sem ser esperado e querido – quando a natureza ainda estava arrumando o seu luxuoso e vasto salão” (idem, p. 66).
[26]Bezerra {(coord.) 1993, p. 50}.
[27]O Jornal, 10/02/57.
[28]Datada de 03/03/57, apud Bezerra, 1992, p. 77.
[29]Datadas de 30/04/57, apud Bezerra, 1992, pp. 148/150.
[30]Manoel Borges de Paiva - Centro Operário; Raimundo Quirino Nobre – Associação Comercial; Moacir Rodrigues – Associação Comercial e João Mariano – Associação Rural.
[31] Este debate aconteceu no ano de 1957, não sabemos precisar o dia. Apud Bezerra (1992, pp. 290/291).
[32]Apego ao passado.
[33]Idem, ibidem, pp. 313/320.
[34]Idem, ibidem, p. 344.
[35]O uso deste termo remete a Weber (1998). Para ele, a dominação tradicional ocorre quando a legitimidade repousa nos poderes senhoriais em virtude de regras tradicionais não inclusas em estatutos universalizantes, impessoais e abstratos. Neste caso, não existe a figura do “funcionário”, mas do “servidor” (idem, p. 148).
[36]“O Estado socialista do Acre”. O Rebate, n° 1011, pp. 02/04. 18/05/52.
[37]O Rebate, nº117, p. 01.
[38]Idem.
[39]Pela chapa de Guiomard Santos, este obteve 4.178 votos, frei Peregrino 1.185 e o coronel Fontenele 1.755. Já Oscar Passos teve 3.998 votos, Adalberto Sena 1.174 e Ruy Lino 234. Votaram ao todo 12. 551 eleitores. O Juruá, ano 02, n° 35, p. 03, 01/01/55.
[40]Em âmbito nacional também ocorriam acordos semelhantes entre esses partidos. Nunes (1997) ao analisar o governo de Juscelino Kubitschek neste mesmo período afirma que: “João Goulart (vice-presidente) controlava a política trabalhista através do Ministério do Trabalho e de uma rede corporativista que unia sindicatos, institutos de previdência social. O PSD controlava outras redes clientelistas na administração, através de ministérios como Viação e Obras Públicas, Justiça, Agricultura e Fazenda” (p. 109).
[41]“Acordo amplo”. O Acre, nº 1119. P. 01, 03/05/53.
[42]O PSD indicou o nome do major Adolfo Barbosa Leite, como segunda opção tinha o do coronel Manoel Fontenele de Castro. Getúlio Vargas acabou indicando Abel Pinheiro para o cargo (vide em Apêndices, Tabela V). No entanto, isto não redundou em nenhum empecilho para o acordo previamente estabelecido.
[43]“Exploração em torno do acordo político no Acre”. O Acre, nº 1134, p. 01. 06/09/53.
[44] Ibidem. Os grifos são meus.
[45] “Desmascaramento”. O Acre, nº 1135, p. 04. 13/09/53.
[46]Termo cunhado por Nunes (1997).
[47]Confira nos Apêndices a Tabela V.