sexta-feira, 18 de julho de 2008

José Guilherme de Araújo Jorge, o poeta que o Acre esqueceu

Por Isaac Melo

O literato inglês Samuel Johnson dizia que a glória máxima de um povo provém de seus escritores. Não precisamos ir longe para constatar isso, basta lembrar-se de Machado de Assis, Castro Alves, Drummond, Guimarães Rosa, Euclides da Cunha, Clarice Lispector, e inúmeros outros não menos importantes. Na literatura amazônico-acreana despontam também grandes nomes, tais como Craveiro Costa, Miguel Ferrante, José Potyguara, Djalma Batista, Jorge Kalume, Leandro Tocantins, etc., e finalmente J. G. de Araújo Jorge, que se não figura como o mais importante, é sem dúvida a maior expressão poética da literatura acreana desde os seus primórdios.Mas toda a glória que este poeta de multidões de leitores conquistou durante muito tempo no Brasil, é quase que oculta ao povo de sua terra.

Até sair do Acre, nunca havia ouvido pronunciar sequer na escola ou nos meios de comunicação o nome de J. G. de Araújo Jorge. Foi apenas quando cheguei ao Paraná que tive o meu primeiro contato com a sua poesia. Ali, li e comprei pela primeira vez um livro do Príncipe dos Poetas acreanos. José Guilherme de Araújo Jorge é um ilustre filho de Tarauacá, nascido no dia 20 de maio de 1914. Filho de Salvador Augusto de Araújo Jorge e Zilda Tinoco de Araújo Jorge, descendentes de tradicionais famílias do estado de Alagoas, composta por homens de grandes destaques, formado por médicos, escritores, políticos e grandes oradores. JG viveu em Tarauacá até os 7 anos de idade. Seu pai Salvador Augusto de Araújo Jorge, foi Juiz Municipal na Comarca de Tarauacá, em 1912. Transferindo-se para Rio Branco, em 1923 foi chefe de polícia. Em Rio Branco JG fez o curso primário no Grupo Escolar 7 de setembro.

O curso secundário e superior JG cursou no Rio de Janeiro nos Colégios Anglo-Americano, Pedro II, e finalmente, na então Faculdade Nacional de Direito da Universidade do Brasil.Sua vida estudantil foi marcada principalmente pela atuação no meio literário. Foi desde menino versado às letras e à oratória. Aos doze anos já estava escrevendo os seus primeiros poemas. No Colégio Pedro II, um dos mais renomados do país na época (autarquia Federal) e de grande tradição até hoje, despontou como um grande líder estudantil e lançou seu nome na literatura. Ali ele foi Presidente e fundador da Academia de Letras e eleito Príncipe dos Poetas do Pedro II, sendo saudado na ocasião, por nada mais nada menos que Coelho Neto, um dos mais importantes prosadores do Brasil. Foi ainda também fundador e o primeiro presidente da Academia de Letras da Faculdade de Direito, que tinha como patrono Afrânio Peixoto.

Ainda como estudante participou de caravanas universitárias ao Chile, Argentina, Uruguai, Portugal (onde recebeu o título de "Estudante honorário"), França, Espanha, Bélgica, Holanda e Alemanha, onde realizou um curso de extensão. Como professor do Pedro II, lecionou História e Literatura.Poesia e política na vida de Araújo Jorge são como duas faces de uma mesma moeda. Devido as suas posições políticas antifascistas, democráticas e socialistas, sofreu inúmeras perseguições e fora preso inúmeras vezes, principalmente no período do "Estado Novo" (Era Vargas), enquanto estudante, e da ditadura de 64, enquanto poeta e político. Foi candidato a vereador e a deputado estadual e federal no antigo Distrito Federal (posteriormente estado da Guanabara), hoje estado do Rio de Janeiro. Sendo eleito deputado federal em 1970, pela Guanabara, reelegendo-se para o terceiro mandato, em 1978.

Politicamente muito ativo JG foi um dentre tantos outros poetas que enfrentou a ditadura, como ele mesmo afirmava: "Quando a crítica metia o rabo entre as pernas com medo da ditadura, e os poetas, como caramujos de jardim enclausuravam-se em hermetismos artificiais, lancei livros que o DIP apreendeu, participei de comícios dissolvidos a bala...". Assim era JG um poeta da praça, um poeta que pregava a liberdade e lutava para que ela não fosse apenas uma quimera, mas uma realidade.JG foi colaborador e diretor de inúmeros jornais, além de manter durante vários anos programas literários, transmitidos principalmente por emissoras de rádio, como nas Rádios Eldorado, Tupi e Nacional do Rio de Janeiro, dentre outras. Tudo isso lhe rendeu o título de Poeta do Povo e da Mocidade. Sua poesia se destaca tanto pela sua mensagem social quanto política e lírica, impregnada de grande romantismo moderno, que chega até ser dramático. E a maior prova disso é o seu livro "A SÓS...", que é a maior expressão romântica de sua poesia, de um profundo lirismo, que conquistou o coração de inúmeros leitoras e leitores.

É por isso que JG fez tanto sucesso entre os jovens, ele tinha o dom de tocar-lhes o coração, por meio de sua poesia permeada de paixão e romantismo.Produziu muito e com qualidade. Possui 36 obras publicadas dos mais variados gêneros desde poesias, coletâneas, prosas até trovas. Somando todas as suas obras publicadas, ultrapassam a tiragem de dois milhões de exemplares. Todos os que viveram nesse período, são unânimes em afirmar que JG foi o poeta mais lido no Brasil, e conseqüentemente um dos mais combatidos também. Não é à toa que não vemos seu nome figurar em nenhuma antologia poética atual, e nem nós acreanos nos damos conta da importância desse nosso brilhante conterrâneo.Ele nunca esqueceu sua terra, sua gente, o chão que o pariu e o nutriu durante os primeiros anos de sua vida. Segundo me disse Olga Percário, uma das responsáveis por manter o site que conserva e divulga a poesia de JG, ele sempre alardeava dizendo com muito orgulho "Sou Acreano" e dedicou lindos poemas à nossa terra natal. Como afirma Camilo Castelo Branco, a poesia não tem presente: ou é esperança ou é saudade. Para JG eram as duas coisas.

Nutria um grande desejo de esperança de uma vida melhor para o seu povo, ao mesmo tempo em que era tocado pelas reminiscências de sua infância no Acre.Sua poesia é marcada por um grande humanismo e pela crítica social, onde o homem exerce papel central. Dizia ele: "a liberdade do futuro será a do homem sem medo da vida, dispondo da educação, da saúde, da terra, dos meios de trabalho, como de ar ou de sol, em igualdade de condições". Diante disso percebemos o quanto a mensagem de JG é atual, e o quanto soa para nós hoje como um apelo para repensarmos nossas maneiras de ser e agir, diante de uma sociedade cada vez mais desigual, e porque não dizer, desumana.Assim foi José Guilherme de Araújo Jorge, um poeta romântico, um utópico, um político, um homem que buscou na própria vida e na realidade que o cerca a inspiração para a sua poesia, e que deixou uma lacuna no meio literário que demorará a ser preenchido. JG morreu no Rio de Janeiro, terra que abraçou com imenso amor, no dia 27 de Janeiro de 1987.Creio que JG mereça um estudo mais aprofundado de sua obra, o que até o momento não foi feito, pois ela tem muito a nos dizer ainda.

Fica o desafio para a nova geração, em especial a acreana. Pois o Acre tem uma dívida para com este poeta, e se faz mister colocá-lo no devido lugar, que é, à galeria dos grandes homens do Estado, que ajudaram a construir e solidificar a nossa história com a própria vida seja com o sangue ou com a pena. É de estranhar que tanto em Tarauacá sua terra natal, quanto em Rio Branco, não há nada que registre o nome do Poeta do Povo e da Mocidade, nem ruas, escolas... Mas já valeria a pena se conhecesse pelo menos a sua obra. Não sei se esse fato se dá por ignorância ou por conivência. Uma coisa é certa ou JG é um poeta que o Acre esqueceu ou ainda não conheceu...Eis o desafio!


Fonte: ://www.google.com/notebook/public/11191268862387917317/BDQGASgoQwcqJuqQj?hl=pt-BR

http://www.jgaraujo.com.br/index.html



(Obs do Autor.: Para este artigo utilizei como base de fontes três obras de J. G. de Araújo Jorge: A Sós, O Poder da flor e O Poeta na Praça.) Clique aqui para conhecer o site do poeta JG de Araújo Jorge.

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