terça-feira, 15 de maio de 2007

Arca specialis arcanus, planus aetherius - O plano de Binho Marques

Enfim, depois de quatro meses de governo e mais três de transição entre florestania e mais florestania, o Governador Binho Marques resolveu parir um Plano pra chamar de seu. Dirão até que foi elaborado com a participação de milhares de pessoas e tal, mas foi feito por dois ou três, se muito. O título é uma afirmação quase poética, bem ao gosto dos ambientalistas do Paço (o restaurante) - Acre Estado da Florestania na Amazônia Brasileira. Lindo! Bem serviria para um episódio da série Harry Porter.

Fantasia por fantasia, essa é nossa, é ou não é?

Já fica aí explícito o desejo de manter o slogan e a política do governo anterior. Teremos, portanto, mais do mesmo.

Como não sou expert no assunto, pedi àquele PhD amigo meu pra fazer uma análise e dizer o que achou do Plano Binho. Com a desculpa de que anda muito ocupado (sabe como são esses caras da academia, né?), ele me mandou algumas impressões prometendo que depois fará uma análise completa do plano. Vejamos o que pensa o meu amigo PhD:

1. O Plano é viciado. Parece uma miragem. Não estabelece ponto de partida nem de chegada.

Um verdadeiro plano estratégico não pode se permitir ignorar o ponto de partida. É preciso diagnosticar honestamente os setores sobre os quais pretende intervir. É rigorosamente necessário que a realidade atual seja revelada com números e indicadores.

Um exemplo. Quando se refere aos programas de inclusão social com impacto na economia e elege a superação da pobreza como alvo de um programa específico, deveria dizer quantos pobres existem. Mas não diz. Por que não diz?

Não diz porque significaria revelar a verdadeira face do Acre florestanista. O PT tem verdadeiro horror aos números oficiais. Então, preferiram criar um Plano que sai do nada.

O Plano também não diz aonde vai chegar. Sem metas estabelecidas, sem números que possam ser perseguidos ou sinalizados, o plano deixa de ser objetivo e transforma-se como declara no início, numa utopia. Se alguém perguntar ao Governo quantos empregos surgirão nos próximos 4 anos, ninguém saberá responder. Dirá que não sabe, mas o Acre será "O melhor lugar para se viver na Amazônia". Eis a utopia. Vá lá que seja mencionada, mas não dispensa ponto de chegada.

Seguindo o exemplo anterior, se poderia perguntar: por que não diz quantos pobres existirão ao final de 4 anos?

Não diz porque não sabem e, além disso, é arriscado. Da última vez que falaram em metas (quarenta mil empregos) o resultado não foi nada bom.

Portanto, o Plano é um barco que não tem porto de saída nem de chegada. Fará uma viagem sem rumo.

2. O Plano é uma abstração. Não pode ser medido. Assim, ninguém jamais poderá dizer se foi ou não bem sucedido.

Como é que se faz 71 promessas (os projetos específicos) e não se anuncia nenhum indicador? Só pode ser para não ser aferido.

Outro exemplo. O Plano promete no item 2 - Programa de Saneamento Ambiental, dois programas específicos. Mas não diz quantas famílias serão alcançadas. Nem quantos quilômetros de rede, nem quantos bairros ou cidades, nem volume de esgoto tratado, nem habitações... enfim, não diz nada. Como é que ao final vamos saber se foi bem sucedido?

Não me venham dizer que o Plano é estratégico e como tal seria impróprio apontar metas. Se quase todos os 71 projetos possuem estimativa de custo, metas financeiras, por que não tem uma estimativa de metas com algum indicador mensurável?

3. O Plano é confuso. Contém erros primários.

Na ânsia de apontar 13 e não 14, ou 15, ou 10 programas "estruturantes", os autores misturaram alhos com bugalhos. Até criação de galinha caipira virou estruturante na concepção da florestania. Tudo isso para chegar ao número cabalístico 13. Petismo doentio e burro.

4. O Plano é ambientalmente omisso e incoerente.

Mesmo na parte em que se julgam craques, os homens, mulheres e outras espécies do governo deixaram traços de inconsistência. A omissão mais grave foi a não inclusão da exploração de petróleo no Acre.

Sem opinar no mérito da proposta, pode-se afirmar que não há nada no horizonte acreano que seja mais importante do que a perspectiva de prospecção e exploração de petróleo em nosso território. Ainda mais, se tratando de áreas de conservação, seringais etc. Ignorar isso remete a algumas indagações. O Governo é contra? Não cogita a hipótese? O Senador Tião Viana está fazendo um governo paralelo?

Incoerente é a abertura de uma estrada ligando a cidade de Cruzeiro do Sul a Pucallpa no Peru (está no mapa estratégico embora não conste como projeto). Esta estrada obrigatoriamente cruzará o Parque Nacional da Serra do Divisor na parte brasileira e uma região altamente complexa no lado peruano. Que florestania é essa que omite a exploração de petróleo mas inclui esta rodovia?

5. Fontes de financiamento - chute pra cima ou uma explosão do endividamento.

Como sabemos, dinheiro não nasce em árvores, embora elas tenham grande valor. Então, de onde saíram esses números tão meticulosamente destinados? Notemos que para as galinhas caipiras vão exatamente de R$ 918.793,00. Se são assim, tão específicos e exatos, esses números não deveriam ter volume conhecido por fonte financiadora? É, mas não tem.

No último quadro, está previsto que o Plano tem um custo de 2,37 bilhões de reais distribuídos não se sabe como entre Orçamento Federal, Governo do Estado, BID, Banco Mundial, BNDES, Caixa Econômica, Setor Privado e outros parceiros (sic). Quanto de cada um, não foi dito.

A não ser que repentinamente o Governo Federal e o Congresso Nacional resolvam descobrir que investir no Acre é comprar uma vaga no paraíso, o Binho está querendo espetar essa conta no aumento da dívida que já está lambendo a casa do bilhão. O acreano, que este ano de 2007 pagará cerca de 130 milhões de reais entre principal e juros, pode ir preparando o lombo.

6. A reforma administrativa e do modelo de gestão sumiram do cenário.

Foi dito solenemente outro dia pelo Governo que o Acre só precisa mesmo é de melhorar a gestão. O Governador, sendo um gestor altamente especializado, tanto que ganhou a eleição dizendo isso, detectou o problema e, certamente iria remodelar facilmente a estrutura etc.

Pelo jeito, esqueceu rápido. O problema não era de gestão. Ou então ele viu que não dá pra melhorar a gestão. Ou, por último, lhe disseram pra não se meter nisso. Certo é que o Plano estratégico simplesmente não diz uma palavra sobre gestão.

A reforma administrativa e gerencial do Estado simplesmente sumiu, embora de fato resida ali grande parte do desperdício de recursos, da morosidade e falta de qualidade no serviço público.

Perdeu o Governo a oportunidade de propor, por exemplo, uma governança eletrônica avançada e democrática.

Depois que li essa contribuição do meu amigo PhD, liguei pra agradecer e fazer uma perguntinha básica. Ô professor fulano, quais as chances desse plano dar certo?

Ele, taxativo. ZERO. A sorte do Binho é que no Acre de hoje o governador não precisa se explicar. A democracia foi interditada, qualquer debate é controlado. No fim, bastam umas camisetas, umas bandeiras, um combustível e uma grana e o barco sem rumo continua navegando.

É isso aí. Vou esperar a análise mais detalhada que o meu amigo PhD prometeu. Até lá, fico saboreando os elogios que o Plano Binho vai receber da mídia (tão livre) e do empresariado (tão independente). Heehehehehe.

Raimundo Elizeu publicado no blog www.opodrepoder.blogs.sapo.pt

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