sábado, 1 de março de 2008

Acre - história super resumida

FONTE: www.revan.com.br/catalogo/0216a.htm O termo acre (ou a'quiri) designa, inicialmente, um rio da região acreana e parece derivar do vocábulo tupi a'kir ü, isto é, rio verde. Ele surge grafado pela primeira vez, ao que tudo indica, em uma correspondência enviada da foz do rio Purus pelo viajante João Gabriel Carvalho de Melo, em 1878. E foi justamente por essa época que o Acre começaria a despertar o interesse dos brasileiros. Com efeito, a não ser por uma ou outra incursão realizada no século XVIII, notadamente após a fundação da capitania do Mato Grosso, em 1751, a cobiça pela região só se verificou realmente no século XIX. A história registra que as primeiras correntes migratórias se dirigem para os vales do Purus e do Tamauacá, no rastro da descoberta da borracha. Da descoberta pelos europeus, pois os índios já conheciam a borracha desde tempos imemorais. Como observou o naturalista brasileiro Alexandre Rodrigues Ferreira, na sua memória sobre os índios campeba, estes ensinaram "às demais nações e igualmente às do Pará a fabricar a célebre goma, ou resina elástica, chamada vulgarmente leite de seringa..." Não por acaso, alguém definiu a borracha como "ouro negro e vida da Amazônia" por essa época. A presença de sertanistas brasileiros na região - que, conforme estipulavam os tratados de Madri (1750) e Santo Ildefonso (1777), integrava a Bolívia atual - implicou a elaboração de um outro acordo, entre o Brasil e a Bolívia, desta feita, em 1867. Pelo Tratado de Ayacucho, a fronteira entre os dois países seria fixada pela confluência dos rios Beni-Mamoré, no rumo do Leste - uma linha de demarcação ainda pouco definida. Diga-se de passagem, os únicos habitantes conhecidos da área, até então, eram os índios yananadí, katukína, kaxináwa e ipurinã. Quase que simultaneamente, ocorre a grande seca de 1877/79 no Nordeste, o que provoca a fuga sucessiva de nordestinos, principalmente cearenses, para o Acre, em busca de terras para plantar. "A seca expulsa-os e congrega-os", como notou o pesquisador Rui Facó. Já em 1890, por exemplo, logo após a nova seca de 1888-1889, portanto, extensas faixas do território acreano são ocupadas por imigrantes brasileiros, numa burla flagrante das normas fronteiriças estabelecidas pelo Tratado de Ayacucho. "A incorporação do Acre começou pela conquista mansa dos seringueiros", sentenciou certa vez o historiador Ernâni Silva Bruno. O grande alvo das disputas seria, indubitavelmente, as seringueiras: o beneficiamento do látex recolhido nas florestas amazônicas tem um papel fundamental na marcha da industrialização mundial no alvorecer do século XX. Em função disso, a Bolívia firma uma série de posições em defesa de sua soberania. As quais incluem, de uma parte, a criação, em 1898, de uma sede para arrecadação de impostos: Puerto Alonso. De outra - e esse parece ter sido o grande equívoco boliviano - a cessão da área do Acre atual a um grupo norte-americano, encarregado de sua colonização e da própria exploração da borracha, em troca de auxílio militar e econômico ao país. Era o chamado Bolivian Syndicate of New York, formado em 1901, e que representava, na realidade, uma forma de protesto contra a criação do Estado Independente do Acre, proclamado em 1899 pelo aventureiro espanhol Luiz Galvez, um ex-funcionário do consulado boliviano em Belém do Pará, financiado por grupo de seringalistas e pelo próprio governo do Amazonas (e inspirador do romance Galvez, o imperador do Acre do escritor amazonense Márcio Souza). Mas o conflito não se limita ao questionamento, pela Bolívia, da aventura amazônica de Galvez, ou de qualquer outro (como o atesta as manobras impetradas, em 1899, pelo advogado José de Carvalho). Também o Brasil, na função de Estado, envolve-se diretamente na disputa, questionando abertamente a presença estrangeira na região. No plano estritamente político, o Congresso brasileiro propõe a ruptura de relações comerciais com a Bolívia, ocorrendo a suspensão das navegações entre os dois países. No plano militar, o gaúcho José Plácido de Castro (1873-1908), um agrimensor estabelecido há alguns anos na região, arregimenta, já em 1902, alguns grupos de seringueiros decididos e toma Xapuri. Em 1903, esses grupos, com apoio logístico do Estado brasileiro, ocupam Puerto Alonso e proclamam, uma vez mais, o Estado Independente do Acre, obrigando as forças bolivianas à capitulação. Só que agora o conflito é mais sério, já que o controle da situação pertence ao Estado brasileiro e não a um aventureiro qualquer. Na avaliação de um abalizado economista, "o regime de ocupação oficial boliviano, pelo maior rigor na tributação e por atos administrativos que importavam em negar legitimidade à propriedade dos seringais preexistentes" esteve na base do levante de Plácido de Castro. Seja como for, o governo brasileiro toma duas decisões. A primeira delas implica a abertura de um canal de negociação com o Bolivian Syndicate (que de boliviano não tem sequer o nome), oferecendo a essa organização de financistas norte-americanos e ingleses uma indenização de 110 mil libras esterlinas pela anulação do contrato com a Bolívia. Uma vez aceita essa proposta, o Brasil elabora a segunda etapa de seu plano, isto é, resolve estabelecer relações com o governo boliviano com base no Tratado de Petrópolis, firmado em 1903 entre as duas partes. Por esse texto, o Brasil adquire a região de exatos 142.800 quilômetros quadrados por dois milhões de libras, comprometendo-se ainda a edificar a estrada de ferro Madeira-Mamoré (o que possibilitaria escoar os artigos bolivianos pelo Atlântico), além de ceder terras no Mato Grosso e no Amazonas à Bolívia. O Brasil ficou com a posse definitiva da área, muito embora tenha havido alguma resistência na Bolívia à assinatura do Tratado. "Efetuamos a nossa primeira aquisição territorial desde que somos nação independente" - exultaria depois Rio Branco, Ministro das Relações Exteriores e negociador brasileiro. Pouco tempo depois, o Brasil contornaria o descontentamento peruano com os rumos dados à questão acreana, através do estabelecimento de um tratado em 1909. O Peru deixava de lado uma antiga reivindicação de soberania sobre o Acre e partes do Estado do Amazonas. A questão fronteiriça brasileira ficava assim definitivamente equacionada, bem ou mal. Segundo a antropóloga Berta Ribeiro, os índios do vale do rio Acre "foram compulsoriamente engajados na extração do caucho e da seringa e os que se recusavam ao trabalho escravo eram massacrados". Afinal, eram eles os detentores das técnicas de obtenção de caucho - e isso lhes custaria caro. De toda forma, desde 1907, pelo menos, a borracha, centro da crise com a Bolívia entre o final do século XIX e o início do século XX, permanece como o principal produto de exportação do Acre, que se tornara o primeiro Território Federal do Brasil três anos antes. A atividade extrativa na região - e aí se inclui igualmente a castanha do Brasil, mais conhecida como castanha-do-pará - encontra-se, entretanto, em franco declínio: os baixos preços obtidos pela borracha e o próprio esgotamento de um grande número de seringais levam muitos empresários locais à bancarrota. Ao baixo nível técnico da produção (existem apenas cinco beneficiadoras de borracha na região no final da década de 1890), vem-se acrescentar ainda a falta de incentivos fiscais aos pequenos e médios produtores. A crise é aguçada, também, pela substituição dos seringais nativos pelas pastagens, substituição essa promovida por empresários de outras partes do país, notadamente do Sul. Somente a produção de frutos locais vem conhecendo algum desenvolvimento. A estrutura agrária, caracterizada pela crescente concentração da terra, foi a principal responsável pela marginalização do homem do campo e pelos numerosos conflitos que sacodem a região. O assassinato do seringalista Chico Mendes, em 1988, exprime justamente esse estado de coisas. Há verdadeiras aberrações na região: conforme dados do Incra, uma única pessoa possuía no início da década de 1990, dois milhões de hectares no Acre, o equivalente a 13% de sua superfície. Este, sim, um verdadeiro estado independente. Ora, isso só se torna possível devido à ausência quase total do aparelho do Estado em grande parte do território acreano, o que facilita a grilagem de áreas públicas e a falsificação de títulos de propriedade. Como o Acre possui um dos solos mais férteis do país, fica a impressão de que os conflitos não têm mais fim. De positivo, no tocante à questão fundiária, o Acre tem a registrar uma das áreas menos depredadas pela ação do homem (menos de 7% de sua área total foi alterada pelo homem, contra uma média nacional de mais de 33%). Mas a ecologia humana deixa a desejar: às vésperas do novo milênio, o Acre ainda mantém cerca de 80% de sua população sem acesso a redes de esgoto e 70% não dispõem sequer de água encanada em seus lares. Constituem sérios entraves ao crescimento econômico do Acre os problemas de comunicação, o reduzido potencial energético e a falta de unidade econômica e administrativa - reflexos da precariedade dos transportes terrestres. Talvez por isso, a grande prioridade administrativa do Estado do Acre no limiar do século XXI seja justamente a conclusão da BR-317, ligando Rio Branco ao Peru e de uma outra rodovia, intermunicipal, a BR-364, entrelaçando Rio Branco e Cruzeiro do Sul. Parece haver hoje um consenso no estado a respeito da premência dessas obras. LOCALIZAÇÃO GEOGRÁFICA - O Acre possui 153.697 quilômetros quadrados de superfície. Localizado na região Norte, o estado limita-se com o Amazonas (ao norte), com Rondônia (a leste), Bolívia (leste e sul) e Peru (sul e oeste). Principais municípios: Rio Branco (capital), Cruzeiro do Sul e Tarauaca. ACERVO CULTURAL: Museu da Borracha, Av. Ceará, 1.177, Rio Branco; Universidade Federal do Acre, Av. Presidente Getúlio Vargas, 654, Rio Branco. BIBLIOGRAFIA BASTOS, Abguar. A conquista acreana (ensaio socioeconômico da fixação do nordestino no vale acreano). Rio de Janeiro, 1960. CALIXTO, Valdir de Oliveira. Acre: uma história em construção. Rio Branco, 1985. CASSIANO, Ricardo. O Tratado de Petrópolis. Rio de Janeiro, 1954. COSTA, João Craveiro. A conquista do deserto ocidental; subsídios para a história do Acre. São Paulo, CEN, 1940. LIMA, C. de A. Plácido de Castro. Rio de Janeiro, Civ. Brasileira, 1960. TOCANTINS, Leandro de. Formação histórica do Acre. Rio de Janeiro, Conquista, 1961. . Estado do Acre: geografia, história e sociedade. Rio de Janeiro, Philobiblion; Rio Branco, Assessoria de Comunicação, 1984, ilus.

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