Monika Grossmann - Engenheira agrônoma e pesquisadora associada do Núcleo de Altos Estudos
Amazônicos (NAEA) da Universidade Federal do Pará (UFPa). Área de
pesquisa: pesquisa-desenvolvimento no nível municipal.
A problemática
Nos último 25 anos, o estado do Acre sofreu uma queda drástica da participação do setor primário no PIB, devido à crise do extrativismo da borracha e da castanha-do-Brasil, forçando muitas famílias de seringueiros e agricultores a sair das suas colocações1, procurando melhores condições de vida, sobretudo na capital do estado. Os grandes projetos agropecuários contribuíram para a expulsão dos seringueiros, agravando ainda mais o quadro geral. Por outro lado, a expansão industrial ocorrida mostrou-se incapaz de impedir a formação de “cinturões de pobreza” nos centros urbanos locais, com destaque para o Rio Branco2. A cidade abriga atualmente mais de 50% da população de todo o estado. 77% de seus habitantes são migrantes da zona rural. A concepção do pólo agroflorestal O Pólo Municipal de Produção Agroflorestal no município de Rio Branco (AC) foi concebido pelo prefeito Jorge Viana, quando ele ainda trabalhava como técnico na Fundação de Tecnologia do Estado do Acre (FUNTAC), e pelo secretário municipal de Agricultura à época, Antônio Monteiro Neto.
O Pólo agroflorestal é uma proposta para possibilitar a volta de famílias de ex-seringueiros e ex-agricultores ao campo e, ao mesmo tempo, para criar uma alternativa para o abastecimento da cidade com alimentos, em torno de 80% originários dos estados circunvizinhos e do Centro-Sul do país. Além disso, a implantação de um sistema agroflorestal (árvores frutíferas, culturas perenes, culturas anuais, hortaliças e criação de pequenos animais) em todos os lotes que medem de 3,5 até 5 ha por família possibilita a recuperação de áreas degradadas e a utilização racional de recursos naturais, resultando num desenvolvimento sustentável nos aspectos tanto econômico-sociais quanto ecológicos.
Segundo os dois idealizadores, o pólo agroflorestal é uma proposta para reforma agrária municipalizada, que visa a atingir os seguintes objetivos, além do mencionados3: Incentivar, através de efeitos demonstrativos, o deslocamento de populações urbanas (originárias do campo) para áreas de produção agrícola; Criar as condições adequadas para fixação do homem no campo; Combater os bolsões de miséria na área urbana; criar uma nova proposta de assentamento agrícola, baseado não na propriedade da terra, mas na valorização de seu uso e na produção; Melhorar a qualidade de vida e a renda das populações carentes; Gerar novas oportunidades de emprego e renda na zona rural; Implantar um sistema eficaz e eficiente de escoamento e comercialização da produção; Promover a organização e a autonomia dos pequenos produtores rurais participantes do projeto.
Os passos de implantação O planejamento foi feito numa ação conjunta da Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento com as Secretarias de Planejamento e do Bem-Estar Social. A seleção das famílias é o passo mais importante de todo o programa, que define o sucesso do projeto de assentamento. Afinal, famílias que nem se conheciam antes nem possuíam laços de parentesco entraram num projeto que exige trabalho de mutirão e uma organização forte para poder gerenciar os equipamentos e instalações comunitárias.
Depois de feito um zoneamento da cidade, uma equipe constituída por técnicos das Secretarias de Agricultura, Planejamento e Bem-Estar procurou, nos bairros mais pobres, as famílias que moravam em condições precárias (por exemplo, barrancos, áreas de deslizamento, invasões) e oriundas do meio rural, para assentá-las em lotes na periferia da cidade. Com isso, se invertia o processo comum, em que as famílias carentes tinham de procurar a prefeitura para obter ajuda.
Para capacitar as famílias selecionadas em gerenciamento, produção e comercialização, a prefeitura proporcionou intercâmbios técnicos com o Projeto Reca4 e outros projetos com experiências na área de associativismo e cooperativismo. Antes de assentar as famílias no primeiro pólo agroflorestal, a prefeitura comprou uma fazenda de 111 ha e outra de 99 ha, totalizando uma área de 210 ha para assentar um total de 53 famílias. Em seguida, foram feitos o levantamento topográfico, o loteamento da área em parcelas com 3,5 a 5 ha e a abertura dos ramais. Depois, a prefeitura implantou o sistema viário, de eletrificação e de telefonia rural. Quando a instalação de infra-estrutura foi concluída, começou a distribuição dos lotes às famílias, com a assinatura do Termo de Concessão de Uso do Solo.
A construção de moradias das famílias, da sede administrativa do projeto e dos galpões para beneficiamento e armazenagem foi feita em mutirão. A prefeitura forneceu somente o material de construção e prestou assistência técnica. Além disso, a prefeitura responsabilizou-se também pelo preparo de solo e distribuiu para cada família um kit do agricultor, contendo ferramentas, sementes, mudas e animais. No futuro, esses serviços serão realizados na base de troca: os agricultores têm de devolver o valor desses investimentos em equivalente de produção.
Um passo importante é a implantação de um sistema eficaz e eficiente de escoamento e comercialização da produção, que tem de ser administrado pelos próprios produtores. No caso do pólo agroflorestal, a comercialização está sob a coordenação da Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento. Não se deve esquecer de desenvolver uma estratégia de marketing para a venda dos produtos, dando destaque à sua origem e qualidade. As famílias fornecem ao mercado local e aos demais programas da prefeitura, como o da merenda escolar, verduras, frutos e produtos animais.
Gerenciamento do pólo agroflorestal A Secretaria de Agricultura está dando o máximo de apoio na área de assessoria às famílias assentadas. Num pólo agroflorestal com 50 famílias atuam dois técnicos agrícolas. A secretaria empregou também uma veterinária, que está prestando assistência a todos os pólos existentes. Na experiência feira em Rio Branco, um passo importante foi a criação da Associação dos Produtores do Pólo Agroflorestal e o início de um processo de transferência de responsabilidade para a associação, quanto à administração das máquinas e de instalações como a cozinha semi-industrial, que foi criada com a finalidade de processar os alimentos produzidos para a merenda escolar.
O processo de incluir ONGs e órgãos de extensão rural e de pesquisa na assessoria do pólo agroflorestal é muito importante não somente para distribuir o trabalho, mas também, para diminuir a responsabilidade da prefeitura quanto ao sucesso do programa. Aconselha-se também, a criação de um conselho gestor, que no caso do pólo agroflorestal no Acre foi composto pelas organizações locais, como EMBRAPA, EMATER, PESACRE, UFAC, FETACRE, SINPASA, e pela Secretaria de Agricultura. Financiamento
Até hoje foram assentadas, pela Secretaria de Agricultura, mais de 200 famílias em cinco pólos agroflorestais. O custo de assentamento é de R$ 7.735,00 por família, totalizando R$ 410 mil para o primeiro pólo agroflorestal, que foi implantado em 19935. No caso desse pólo agroflorestal, financiaram esses custos, além da prefeitura, o Ministério do Meio Ambiente e a Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM). O dinheiro foi aplicado na aquisição de terra, de um caminhão de 6 ton., de um trator de 65cv com implementos, de um veículo utilitário (Kombi), de uma beneficiadora de arroz, de um engenho de cana (completo) e de uma casa de farinha (completa), e na implantação de 6,36km de rede elétrica. Além disso, em média foram gastos R$ 2.300,00 por família assentada e por ano, com despesas de custeio, tais como combustível, salários e outros.
A terra é cedida à família, que não pode vendê-la. Além de fornecer material para construção da moradia, a prefeitura entra com o kit do agricultor, que custa R$ 240,00, contendo várias ferramentas de trabalho.
A partir do terceiro ano de assentamento, as famílias começaram a mostrar um padrão de vida melhor, se comparado com a situação em que elas viviam antes, na periferia da cidade. Segundo um levantamento feito para uma tese de mestrado6, as famílias recebem mensalmente entre dois e três salários mínimos. As famílias sustentam-se com a venda de carvão até o momento em que começam os ingressos através da produção agrícola. Com a venda da produção agrícola, elas conseguem adquirir bens como televisão, aparelho de som, vídeo e móveis mais sofisticados. Porém, é necessário alertar as famílias para investirem não somente em utensílios de casa, mas também na agricultura, para poderem manter, futuramente, o nível de vida.
A independência das famílias das subvenções da prefeitura está prevista a partir do quarto ano, no máximo no quinto ou sexto ano. Isso depende muito do desenvolvimento das árvores frutíferas, que, em média, entram em produção a partir do quarto ano. Até agosto de 1996, o pólo agroflorestal dependia ainda do apoio financeiro da prefeitura. É necessário acompanhar a evolução deste projeto, especialmente em relação a uma situação política diferente, no ano de 1997, quando outro grupo político assumiu a prefeitura.
Referências bibliográficas
Campos Índio & Costa, Francisco de Assis.O estado do Acre: crise estrutural e limites do preservacionismo. Belém, Naes, 1993. (Paper do Naea, 11.)
Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento. Pólo agroflorestal: a nossa proposta de reforma agrária. Rio Branco, Assessoria de Comunicação, 1995.
Slinger, Vanessa. Resultados preliminares de uma tese de mestrado feita no Pólo Agroflorestal Geraldo Mesquita. Universidade da Flórida, 1996. mimeog.
Referências bibliográficas
Campos Índio & Costa, Francisco de Assis.O estado do Acre: crise estrutural e limites do preservacionismo. Belém, Naes, 1993. (Paper do Naea, 11.)
Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento. Pólo agroflorestal: a nossa proposta de reforma agrária. Rio Branco, Assessoria de Comunicação, 1995.
Slinger, Vanessa. Resultados preliminares de uma tese de mestrado feita no Pólo Agroflorestal Geraldo Mesquita. Universidade da Flórida, 1996. mimeog.
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