quarta-feira, 16 de maio de 2012

CARNEIRO, Eduardo de Araújo. Inserção das mulheres na Polícia Militar do Acre: 20 anos de história. Jornal O Rio Branco, 09 mar. 2005.


Tivesse Plácido de Castro mais mulheres como essa, seria impossível vencer os Acreanos”
(Coronel boliviano Rosendo Rojas, referindo-se a Angelina Gonçalves, considerada heroína da Revolução Acreana).
        


O grande desafio da mulher acreana na década de 1980 foi ingressar na Polícia Militar do Acre. A corporação era o lugar mais masculinizado do Estado, a profissão policial era a mais viril de todas e a cultura militar era fundamentalmente machista-patriarcal. Ser policial militar feminina era sinônimo de discriminação. 

Os muitos obstáculos não foram suficientes para impedir que cinco valorosas jovens se apresentassem no Centro de Formação de Praças da PMAC (CFAP) no dia 7 de outubro de 1985, para o início do curso de Sargentos. As alunas-sargentos Francisca Margarete, Maria Aniceta, Débora, Ozenir e Luíza foram submetidas a treinamentos forçados e a um regime disciplinar rigoroso, em nada diferentes dos realizados com os homens. O “preço” pago pelo pioneirismo na caserna foi muito alto.

As policiais militares foram empregadas na corporação, a princípio, em atividades bem limitadas: no trato com crianças, idosos e mulheres, e no serviço administrativo. Acreditava-se que a condição biológica da mulher era um impedimento ao pleno exercício da profissão militar, marcada pelo uso da força física. Alvo de subestimação, as mulheres provaram aos seus pares, com o passar do tempo, que eram capazes de realizar as mais diversas tarefas, inclusive as consideradas “operações especiais”. 

A admissão feminina nos quadros da corporação fez parte de um conjunto de mudanças sofridas pelas Polícias Militares em todo o Brasil com o fim da Ditadura. A sociedade exigia um novo modelo de policiamento urbano, mais adequado à democracia e aos princípios dos Direitos Humanos. A presença das mulheres assumia uma missão saneadora, tornando o serviço policial mais humano e sociável.

A primeira grande vitória das policiais acreanas foi a legalização da  Companhia de Polícia Militar Feminina (CIA PM FEM) ocorrida em março de 1990, com efeito retroativo a contar de 05 de dezembro de 1986 (Decreto n° 150, 28/03/90). Com a Companhia, as mulheres passaram a ser comandadas diretamente por mulheres, possibilitando a conquista de novos “espaços” na instituição, como por exemplo, o serviço de rádio-patrulha. A primeira comandante da CIA FEM foi a então Sargento Margarete. Que subiu ao posto de 1º Tenente em novembro de 1991, após a conclusão do curso na Brigada Militar do Rio Grande do Sul, tornando-se a primeira mulher Oficial da PMAC.

A segundo vitória das aguerridas mulheres aconteceu em 1996, quando no dia internacional na mulher, 8 de março, foi inaugurado o Quartel da Companhia Feminina, local onde hoje funciona o Pelotão de Cavalaria, próximo ao Batalhão Motorizado. O Quartel foi fruto do empenho pessoal da Comandante da CIA FEM da época, a então TEN PM Lúcia, e das 130 policiais femininas que compunham os quadros da Companhia. Juntas, organizaram rifas, bingos e donativos a fim de angariarem fundos para a construção.

O quartel foi construído em razão dos quadros de oficias e praças da PMAC serem separados em gênero masculino e feminino. A obra veio cumprir um antigo desejo das  policiais femininas: terem um local exclusivo para mulheres, em que pudessem decorá-lo e administrá-lo sem a cautela masculina.

A maior discriminação sofrida pelas policiais femininas, sem dúvida, foi a divisão dos quadros da Polícia Militar em gênero masculino e feminino. Essa divisão imprimia uma assimetria nos ritmos de progressão hierárquica, além de impedir o acesso das mulheres aos mais elevados postos do oficialato (major, tenente-coronel e coronel). A separação, condicionava as mulheres à categoria de praças da PM, “eternizando” a subordinação da mulher ao homem. As poucas que conseguissem chegar ao oficialato, não passariam da patente de capitão.


Treinadas para serem fortes e corajosas em situações adversas, as policiais militares não se intimidaram frente a discriminação sofrida. Não se falava em outra coisa a não ser na unificação dos quadros da PMAC. Corporações de outros  Estados eram tomados como exemplo de luta pela unificação dos Quadros, como o caso da Polícia Militar do Amazonas que já em 1982, concedia oportunidades iguais de progressão hierárquica entre homens e mulheres. 

Muitas resistências foram feitas até que o projeto de unificação fosse à Assembléia Legislativa. Chegando lá, por motivos “inexplicáveis”, o projeto ficou engavetado por quase dois anos. Até que foi aprovado em julho de 1998 (Lei 1267 de 29/06/98), com a condição de que as oficiais femininas existentes na época perdessem a antiguidade sobre os seus pares masculinos.

A aprovação da Lei na Assembléia Legislativa demonstrou o espírito de união entre as mulheres na corporação, constituindo na maior vitória até então. Após a lei, a Companhia Feminina foi extinta, o Quartel da Companhia passou a pertencer ao Pelotão de Cavalaria e as policiais militares femininas foram transferidas para os mais diversos setores da PMAC.  Em 2000, houve o primeiro curso de formação de soldados unificado.  Em 2005, através de muita articulação, as policiais militares conquistam o direito de se aposentarem cinco anos mais cedo que os homens.  

Atualmente, a Polícia Militar do Acre possui em seus quadros cerca de 210 policiais feminina na ativa (obs: dados de 2005), o que representa um percentual de 8,5% do efetivo total. Estima-se que 70% delas estão desempenhando atividades consideradas de caráter ostensivo; 4,2% das policiais  estão lotadas na Companhia de Operações Especiais (COE); apenas 0,9% são oficiais superiores. As cinco oficiais mulheres pertencentes à PMAC são: TC PM Margarete, MJ PM Lúcia, CAP PM Aniceta, CAP PM Socorro, TEN PM Ozenir e TEN PM Débora; das quais, quatro delas foram aluna-sargento em 1985.   (obs: patentes referentes à 2005)

Vinte e um anos anos se passaram desde o primeiro concurso para admissão de mulheres na Polícia Militar do Acre. O caminho “pedregoso” percorrido pelas policiais femininas inclui muitas vitórias, no entanto, a conquista ainda não está consolidada.  Apenas 2,8% das policiais femininas chegaram ao oficialato, uma média muito abaixo da nacional que é de 10% (Pesquisa realizada pela CESeC/SENASP publicada no Boletim de Segurança e Cidadania em abril de 2004). Além do mais, ainda não se têm mulheres no posto de coronel, o mais alto da corporação. Entretanto, para essas corajosas mulheres, nenhum obstáculo constituí-se intransponível, tais questões são apenas um detalhe que o tempo se encarregará de sanar, lutas maiores já foram vencidas. Viva as Policiais Militares Femininas!!!
  

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